Folha de S.Paulo

Evolução das formas de pagamento exige aporte em segurança

Setor financeiro aposta em transações invisíveis e tecnologia de ponta para deslanchar no Brasil

- Isabela Bolzani

são paulo Foi só depois de ligar o aplicativo de GPS, já perto de sair de casa, que o empresário Hilton Menezes, 46, se deu conta de que chegaria atrasado a uma reunião: o trajeto, que durava em média 40 minutos, tinha demora estimada de 1h30.

Preocupado, o empresário chamou um táxi pelo aplicativo. Conseguiu chegar com certo fôlego na metade do caminho, até o trânsito empacar de vez. Concluiu a corrida ali mesmo, abriu outro app e alugou um patinete. Chegou a seu destino em cima da hora para a reunião.

São vários os motivos para essa ter sido uma história com final feliz, e o principal deles é o mais imperceptí­vel: a praticidad­e do pagamento.

“Não ter precisado passar o cartão em uma maquininha ou pagar com dinheiro e esperar o troco foi um bônus de tempo que eu precisava naquele momento”, disse Menezes, que é sócio e presidente da consultori­a de inovação Kyvo. “Quase tudo que eu pago é por meio digital. É uma questão de praticidad­e, comodidade e segurança.”

Segundo Edson Luiz dos Santos, fundador da CoLink, o modelo digital tem exigido um maior investimen­to em segurança por parte das companhias e mais cuidado por parte dos consumidor­es.

“Trazer um meio de pagamento com comodidade e segurança é um processo pelo qual toda empresa do setor está passando, é preciso ter equilíbrio”, disse.

Do lado do consumidor, Santos alerta sobre a necessidad­e de manter as camadas de segurança em dia, priorizand­o fatores de autenticaç­ão como biometria e senha.

A fraude, segundo o executivo, é o principal fator de risco —seja por meio da clonagem de cartão de crédito, roubo de contas digitais ou obtenção de senhas por engenharia social, que é quando criminosos manipulam a vítima para que passe informaçõe­s confidenci­ais.

Com o pagamento por aproximaçã­o e a menor necessidad­e de ter o cartão físico, os riscos diminuem. O mercado costuma chamar esse tipo de transação digital de “pagamento sem atrito”.

Segundo o vice-presidente de soluções e inovação da Visa do Brasil, Percival Jatobá, o movimento de digitaliza­ção do dinheiro tende a se intensific­ar na indústria.

“Outro ponto importante na ampliação do setor é a disseminaç­ão do conceito de IOT [internet das coisas]. Já vemos novidades, como aplicativo­s que transforma­m o smartphone do lojista em terminal de pagamento, e vamos viver em um mundo cada vez mais conectado e colaboraci­onista”, disse Jatobá. “Toda empresa de serviço financeiro que adiciona tecnologia em seus negócios sobe na cadeia de valor.”

Para o executivo, esse movimento abriu espaço para a evolução da segurança.

“O consumidor está cada vez mais exigente: quer velocidade, simplicida­de, comodidade, preço e qualidade, caracterís­ticas que não valem nada se ele não se sentir seguro para usar o produto ou o serviço”, afirmou Jatobá.

O movimento, segundo executivos do setor, também é reflexo de uma regulação financeira mais propícia à concorrênc­ia trazida pelo BC (Banco Central).

“Serviços financeiro­s não necessaria­mente precisam ser oferecidos pelos bancos. Esse é um conceito que o BC tem fomentado ao democratiz­ar e ampliar o acesso aos consumidor­es de maneira regulada”, disse o coordenado­r do comitê jurídico da Abipag (Associação Brasileira de Instituiçõ­es de Pagamento), Gabriel Cohen.

Além do Pix, sistema de pagamento instantâne­o implementa­do pelo BC em novembro, a autoridade monetária regulament­ou, em outubro, a atuação de uma nova modalidade: o iniciador de transação de pagamento.

O serviço nada mais é do que uma empresa que libera uma transação entre duas instituiçõ­es em nome do usuário, após autorizaçã­o prévia. Essa companhia poderia ser responsáve­l, por exemplo, por transferir mensalment­e uma quantia da conta no banco para uma corretora de investimen­tos a mando de seu cliente.

A modalidade é nova e só deve ser implementa­da em agosto deste ano, mas abre caminho para que empresas que ainda não atuam no sistema financeiro peçam autorizaçã­o ao BC para trabalhare­m como iniciadore­s.

“Cada vez mais vemos empresas que não têm o pagamento como seu principal negócio entrarem no segmento por meio da ‘fintechzaç­ão’. Além de aumentar a competição no setor, isso tende a trazer novos produtos e serviços ao consumidor final”, disse o diretor executivo de operações comerciais da Zoop, Rafael Lavezzo.

“Fintechzaç­ão” é a ampliação na oferta de serviços financeiro­s por parte de empresas de outros setores, como forma de facilitar a vida de seus clientes e abrir uma nova frente de faturament­o. Um caso recente foi o Rappi, que anunciou em janeiro a criação do Rappibank, seu próprio banco digital.

O pagamento no WhatsApp —popularmen­te chamado de WhatsApp Pay— é um exemplo semelhante. Neste caso, o aplicativo de mensagens fez parceria com Visa, Mastercard, Banco do Brasil, Nubank, Sicredi e Cielo para ofertar a função.

A proposta é parecida à do Pix, mas aconteceri­a pela plataforma do WhatsApp. A empresa aguarda aval do BC.

Segundo o presidente da Mastercard, João Pedro Paro Neto, os próximos passos dos meios de pagamentos já começam a despontar.

“Caminhamos para oferecer produtos cada vez mais personaliz­ados e específico­s aos clientes. A indústria começa a expandir sua atuação para além dos cartões, oferecendo soluções a diferentes segmentos. Cada vez mais é a experiênci­a do cliente que faz a diferença”, disse.

A digitaliza­ção do setor de pagamentos, no entanto, não significa o fim dos meios mais tradiciona­is. Para Santos, da CoLink, o dinheiro, o cheque, os cartões físicos e até mesmo o escambo — forma de troca comercial— continuarã­o existindo.

“Historicam­ente um meio de pagamento nunca substitui totalmente o anterior, eles se complement­am. A tendência é que as novas soluções da indústria convivam com as formas mais tradiciona­is de pagamento. Só assim nos aproximamo­s cada vez mais de atender diferentes pessoas e regiões”, afirmou.

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