Folha de S.Paulo

Valentões

- Marcos Lisboa Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005). Escreve aos domingos

O governo tem se valido de instrument­os da ditadura militar para investigar quem o desabona na imprensa. Já houve ao menos três pedidos de inquéritos por parte do Ministério da Justiça com base na Lei de Segurança Nacional.

Em um caso, o jornalista escreveu quetorciap­el amor tedop residente, diagnostic­ado coma Covid-19. Em outro, o motivo foi uma charge com Bolsonaro e a cruz vermelha dos hospitais adornada com pontas pretas, que a transforma­va numa suástica.

No terceiro, um advogado comentou o impacto das declaraçõe­s do presidente contra o isolamento. Ele citou o estudo de Ajzenman, Cavalcanti e Da Mata (2020) que documenta o menor distanciam­ento social e maior contaminaç­ão nas cidades em que a maioria apoiou Bolsonaro.

O advogado argumentou que, juridicame­nte, não se podia falar em genocídio, mas o termo seria válido politicame­nte. Foi suficiente para que a Polícia Federal o intimasse. Ele teria difamado o presidente.

Pode-se discordar dos críticos e suas frases de efeito, contudo ou sodo aparelho de Esta dopara intimidara divergênci­a revela a natureza autoritári­a do Planalto. Ondes e escondemos liberais deste governo?

Nos Estados Unidos, a primeira emenda à Constituiç­ão veda leis que restrinjam a liberdade de expressão. A livre troca de ideias permite o contraditó­rio, que desafia as crenças estabeleci­das. Melhor proteger as controvérs­ias dos cidadãos, mesmo que descabidas, do que a opressão discricion­ária do príncipe de plantão.

Cabe ressaltar que, nos EUA, o mesmo não vale para servidores públicos, cujo discurso tem limites em razão do cargo, sobretudo se põe em risco a saúde da população. Será que o ministro da Saúde no Brasil pode recomendar drogas sem eficácia comprovada para tratar o novo coronavíru­s?

À parte o uso do poder policial para constrange­r opiniões, deplorável numa democracia, as ações oficiais sugerem algo mais prosaico. Na ausência de planos para cuidar da saúde e da economia, o Planalto opta pelas bravatas.

Parte da imprensa cai no jogo do bate-boca do governo, ques evale de inimigos inventados para justificar sua inoperânci­a. Deve-se ignoraras pirraças, anão ser quando os valentões abusam da força bruta. Melhor fazer perguntas detalhadas sobre a gestão pública, que revelamo fracas soda atual administra­ção.

Dois exemplos. Por que o governo não comprou vacinas dos demais produtores no ano passado, como fizeram outros países? Qual o cronograma da prometida agenda de privatizaç­ões e abertura comercial?

Fica a dúvida: como o atual ministro da Justiça reagiria caso um deputado defendesse matar o presidente da República, como fez Jair Bolsonaro em 1999?

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