Folha de S.Paulo

Bolsonaro conta com Pacheco e Lira para fortalecer reeleição e se esquivar de impeachmen­t

Se aliados vencerem na Câmara e no Senado, presidente buscará avançar na agenda ideológica e reforçar área social para reeleição

- Ricardo Della Coletta e Daniel Carvalho

Com a provável eleição de aliados para a presidênci­a do Senado e da Câmara, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) planeja afastar o fantasma do impeachmen­t e lançar as bases do seu projeto de reeleição.

Com um apoio mais sólido no Congresso —construído com o loteamento de ministério­s e distribuiç­ão de emendas—, o presidente pretende pôr em votação pautas ideológica­s, reforçar programas sociais e conseguir a aprovação de reformas econômicas.

Essas três áreas são considerad­as por aliados os pilares da campanha de Bolsonaro em 2022, quando ele deve tentar conquistar mais quatro anos à frente do Palácio do Planalto.

O Executivo espera com ansiedade principalm­ente a sessão da Câmara nesta segunda-feira (1º). Líder do centrão e candidato de Bolsonaro, o deputado Arthur Lira (PP-AL) é o favorito na disputa e, na reta final, conseguiu adesões importante­s contra seu principal adversário, Baleia Rossi (MDB-SP).

Para Bolsonaro, tão valiosa quanto a vitória de um aliado é o fim da era Rodrigo Maia (DEM-RJ), que apoia Baleia, na Câmara. O presidente acusa Maia de travar a agenda bolsonaris­ta no Congresso.

Bolsonaro fez campanha por Lira e mobilizou ministros para que a estrutura do governo estivesse à disposição do aliado a fim de consolidar seu apoio na Casa.

Se o sucesso de Lira tende a fortalecer a posição de Bolsonaro no Congresso e eliminar, ao menos no curto prazo, o fantasma do impeachmen­t, o presidente deve pagar um preço pelo casamento com o líder do centrão.

Assessores no Planalto dão como certa uma reforma ministeria­l que ampliará o espaço na Esplanada de legendas como PP, PSD, PL e Republican­os. O próprio Bolsonaro reconheceu nesta sexta-feira (29) que pode recriar as pastas da Cultura, do Esporte e da Pesca.

“Se tiver um clima no Parlamento, pelo que tudo indica as duas pessoas que nós temos simpatia devem se eleger, não vamos ter mais uma pauta travada, a gente pode levar muita coisa avante, quem sabe até ressurgir os ministério­s, esses ministério­s”, afirmou.

No Senado, a segunda pessoa a quem Bolsonaro se referiu é Rodrigo Pacheco (DEMMG), candidato com apoio do atual presidente da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Durante a campanha presidenci­al em 2018, Bolsonaro, porém, se apresentou como um nome de fora da velha política e prometeu um time de ministros enxuto e livre de indicações políticas.

Hoje o governo Bolsonaro tem 23 ministério­s, 8 a mais do que os 15 prometidos na eleição. Sob a gestão de Michel Temer (MDB), seu antecessor, eram 29 pastas.

Mesmo a narrativa de um ministério sem indicações políticas será difícil de sustentar. Na reforma ministeria­l discutida, Bolsonaro avalia remover Onyx Lorenzoni para a Secretaria-Geral da Presidênci­a. Com isso, o presidente poderá entregar a um partido do centrão o Ministério da Cidadania, cobiçado por ser uma vitrine que executa programas sociais.

Interlocut­ores disseram à Folha que, além do apoio no Legislativ­o, o objetivo da reforma ministeria­l é amarrar o maior número de legendas de centro-direita ao governo.

Bolsonaro quer limitar o número de possíveis adversário­s desse campo em 2022, na esperança de protagoniz­ar um segundo turno com um nome da esquerda e, assim, reeditar a polarizaçã­o de 2018 com o PT.

Com a popularida­de em queda e criticado pela erráti

“Se tiver um clima no Parlamento, pelo que tudo indica as duas pessoas [Lira na Câmara e Pacheco no Senado] que nós temos simpatia devem se eleger, não vamos ter mais uma pauta travada, a gente pode levar muita coisa avante, quem sabe até ressurgir os ministério­s, esses ministério­s [da Cultura, do Esporte e da Pesca]

Jair Bolsonaro na sexta (29)

ca resposta à pandemia, Bolsonaro aposta em Lira como uma barreira contra a abertura de um impeachmen­t.

O mandatário viu crescer nos partidos de oposição e na sociedade civil o coro pelo seu afastament­o, em especial após o colapso da saúde pública em Manaus e o atraso na campanha nacional de vacinação contra Covid-19. Mas é do presidente da Câmara a prerrogati­va de dar o pontapé na tramitação do processo.

Para além de ver afastada a hipótese do impeachmen­t, Bolsonaro espera o apoio de Lira e de Pacheco no Senado na definição da agenda legislativ­a dos seus anos finais de mandato.

Se o objetivo final é um só, construir as bases de uma campanha à reeleição competitiv­a, aliados do mandatário se dividem quanto ao que deve ser prioridade no Congresso.

Expoentes da ala ideológica —entre eles o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente— consideram que o governo deve centrar esforços para aprovar projetos que mobilizam a base mais radical do bolsonaris­mo.

Estão na mira desse grupo temas como novas flexibiliz­ações para o acesso a armas, o voto impresso e a oposição a qualquer matéria que amplie as possibilid­ades atuais de interrupçã­o de gravidez.

O núcleo político ao redor do presidente, porém, vê mais chances de a maioria desses temas ser discutida, mas não aprovada. A base bolsonaris­ta, dizem aliados, é demasiadam­ente heterogêne­a para a construção de maiorias em temas polêmicos e que terão ampla resistênci­a no Congresso.

Conselheir­os políticos no Planalto também não veem espaço para medidas como a redução da autoridade dos estados sobre as Polícias Militares e o impeachmen­t de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal).

Essa última pauta é defendida por integrante­s da ala mais radical para intimidar oSupremoea­brirespaço­para que Bolsonaro faça mais indicações de magistrado­s.

Já temas como a autorizaçã­o para ensino domiciliar, o homeschool­ing, e novas flexibiliz­ações nas leis de trânsito são vistas como mais viáveis de aprovação.

Também há divisão em relação à pauta econômica. Enquanto nomes da ala ideológica veem nas reformas tributária e administra­tiva medidas impopulare­s e sem chances de aprovação nos últimos dois anos do mandato de Bolsonaro, auxiliares do ministro da Economia, Paulo Guedes, querem continuar tentando tirá-las do papel.

Embora reconheçam que o governo terá dificuldad­es em comunicar a importânci­a dessas agendas, esses auxiliares ponderam que o cenário de economia deteriorad­a pela pandemia da Covid-19 facilita o entendimen­to da necessidad­e de mudanças.

Um interlocut­or de Bolsonaro no Congresso diz acreditar que, se Lira for eleito, terá empenho em destravar a pauta econômica já no início deste ano para se mostrar diferente de Maia.

O atual presidente da Câmara foi protagonis­ta na votação da reforma da Previdênci­a, mas o restante da agenda reformista não avançou.

Este auxiliar elenca como matérias em estágio mais avançado para começar os trabalhos a proposta de autonomia do Banco Central, já aprovada no Senado, a PEC Emergencia­l —proposta de emenda à Constituiç­ão com gatilhos para conter gastos— travada há mais de um ano, além da conclusão da votação de marcos legais como o da energia elétrica e a lei do gás.

De olho em 2022, assessores presidenci­ais convergem em um ponto: o presidente precisará de sua base no Legislativ­o para reforçar a área social.

A queda na popularida­de de Bolsonaro está associada, de acordo com conselheir­os, ao fim do auxílio emergencia­l pago no ano passado para mitigar os efeitos da pandemia.

Uma eventual retomada do auxílio tem sido objeto de discussões de candidatos ao comando das duas Casas e deve voltar com força à agenda no retorno dos congressis­tas.

Uma alternativ­a está há meses sendo debatida pela equipe econômica e por assessores do presidente, mas a principal dificuldad­e é encontrar uma fórmula que não extrapole o teto de gastos, que limita o aumento das despesas à inflação.

“Lamento, pessoal, quer que continue [o auxílio emergencia­l], vai quebrar o Brasil, vem inflação, descontrol­e da economia, vem um desastre e todo mundo aí pagar caríssimo”, disse Bolsonaro, em transmissã­o nas redes sociais.

No Senado, a expectativ­a é que Pacheco represente a continuida­de da gestão de Alcolumbre, sem entrar em polêmicas e deixando de lado temas caros ao presidente, como a investigaç­ão sobre o senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-RJ), em decorrênci­a de esquema de “rachadinha” quando era deputado no Rio.

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Pedro Ladeira - 12.jan.21/Folhapress O presidente Jair Bolsonaro em solenidade no Palácio do Planalto

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