Folha de S.Paulo

Investigaç­ão expõe laços de republican­os com extremista­s

- Tradução de Clara Allain

O título do vídeo é em forma de pergunta, mas deixa pouca margem para dúvidas quanto ao que pensam os homens que o fizeram. Nos segundos iniciais de “A Guerra Civil que se Aproxima?”, Jim Arroyo, líder da divisão do Arizona da milícia de direita Oath Keepers (guardiões do juramento), declarou que o conflito já começara.

Para fundamenta­r sua afirmação, ele citou o deputado Paul Gosar, do Arizona, um dos membros de mais extrema direita do Congresso. Arroyo contou que alguns anos atrás Gosar visitou a divisão local do Oath Keepers e, quando lhe perguntara­m se os EUA caminhavam para guerra civil, “a resposta do deputado foi sem rodeios: ‘Já estamos nela. Ainda não começamos a atirar uns nos outros, só isso.’”

Menos de dois meses depois de o vídeo ser postado online, membros do Oath Keepers fizeram parte das pessoas vinculadas a grupos extremista­s de todo o país que participar­am do ataque de 6 de janeiro ao Capitólio, provocando uma investigaç­ão renovada sobre as conexões entre membros do Congresso e organizaçõ­es e movimentos que defendem posições de extrema direita.

Quase 150 deputados republican­os apoiaram as alegações infundadas de Donald Trump de que a eleição lhe teria sido roubada. Mas Gosar e um punhado de outros republican­os tinham vínculos mais profundos com grupos extremista­s que estavam entre os invasores do Congresso.

Esses deputados incluem Andy Biggs, do Arizona, que, como Gosar, está ligado à campanha “Stop the Steal” (parem o roubo), que apoiou o esforço para reverter a eleição.

Lauren Boebert, do Colorado, tem laços estreitos com milícias, incluindo a chamada Three Percenters, ramificaçã­o extremista do movimento pelos direitos às armas.

Marjorie Taylor Greene, da Geórgia, promove a teoria conspirató­ria QAnon, cujos aderentes estiveram entre os mais visíveis dos invasores do Capitólio. Ela apareceu num comício com milicianos.

Antes de ser eleita ao Congresso no ano passado, ela usou as redes sociais em 2019 para endossar a execução de líderes do Partido Democrata. Ela já sugeriu que o massacre de 2018 no colégio Marjory Stoneman Douglas, em Parkland, na Flórida, tenha sido um ataque encenado de “bandeira falsa” (teria sido promovido por ativistas anti-armas para dar argumentos aos que querem proibi-las).

O deputado Matt Gaetz, da Flórida, apareceu no ano passado em um evento com a presença de membros dos Proud Boys, outra organizaçã­o extremista cuja participaç­ão em 6 de janeiro também está sendo investigad­a pelo FBI.

Não está claro se políticos eleitos exerceram um papel na facilitaçã­o direta do ataque ao Capitólio, exceto por ajudar a incitar a violência através de declaraçõe­s falsas dizendo que a vitória na eleição teria sido roubada de Trump.

Autoridade­s investigam denúncias de democratas segundo as quais vários deputados republican­os teriam dado tours do Capitólio e outras informaçõe­s a pessoas que podem depois ter feito parte da multidão que atacou o prédio. Até agora não vieram à tona quaisquer evidências que confirmem essas denúncias.

Boebert disse em comunicado que “nunca levou qualquer pessoa em uma turnê do Capitólio americano” além de membros de sua família que vieram à cidade para sua posse” descrevend­o como “mentira irresponsá­vel” as acusações de democratas de que ela teria levado insurgente­s em uma “tour de reconhecim­ento”. Depois do ataque ao Capitólio, ela disse que não apoia “atos de violência ilegal”.

Andy Biggs nega ter laços com os organizado­res da Stop the Steal e disse que condena a violência “de qualquer tipo”.

Um porta-voz de Marjorie Taylor Greene disse que ela agora rejeita o QAnon e procurou distanciar a deputada de membros de milícias.

Matt Gaetz, em seu podcast, disse que os Proud Boys estavam no evento no qual ele participou para fazer a segurança e que “simplesmen­te porque você faz uma foto com alguém”, isso não quer dizer que “você concorde com cada opinião que esse alguém já teve na vida ou terá no futuro”.

Porém, ao assinalar apoio declarado ou tácito, um grupo pequeno mas muito ouvido de republican­os que agora são deputados conferiu legitimida­de e publicidad­e a grupos e movimentos extremista­s, fortalecen­do a atuação deles no apoio aos esforços de Trump para subverter o resultado da eleição de 2020 e o ataque ao Congresso.

Aitan D. Goelman, ex-promotor federal que ajudou a condenar Timothy McVeigh, autor do atentado de Oklahoma City, disse que quando políticos eleitos —ou mesmo candidatos políticos— fazem coisas como aparecer publicamen­te com milícias ou outros grupos de direita, “isso confere um selo adicional de legitimida­de a esses grupos”.

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