Folha de S.Paulo

Para governo, pauta econômica terá impulso com mudança no Congresso

Intenção é concluir votação de projetos prioritári­os pendentes após eleições na Câmara e no Senado

- Thiago Resende e Danielle Brant

Num cenário em que os candidatos governista­s assumem o comando da Câmara e do Senado a partir de fevereiro, o governo espera que o alinhament­o entre eles ajudará a acelerar a agenda do ministro Paulo Guedes (Economia), inclusive agendas estruturai­s que demandam maior apoio no Congresso.

Alguns projetos prioritári­os para a pasta já passaram por uma das Casas, mas não tiveram a tramitação concluída. É o caso da autonomia do Banco Central, aprovada pelo Senado e que foi deixada de lado pelo atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

A nova lei do gás (mudanças de regras para baratear o gás natural) já passou pelos deputados, mas, como foi modificada pelos senadores, precisará de novo sinal verde da Câmara. No caso do texto para estimular a cabotagem (navegação entre portos nacionais), falta a análise do Senado.

O governo esperava encerrar 2020 sem essas pendências no Congresso. A falta de coordenaçã­o entre as Casas e os líderes do governo, porém, deixou as votações para este ano.

Uma boa relação dos presidente­s da Câmara e do Senado com o Palácio do Planalto gera expectativ­as de que a pauta econômica poderá avançar com menos atritos.

As reformas tributária e administra­tiva (que muda as regras do funcionali­smo público) estão na lista e vão demandar negociaçõe­s entre Executivo e Legislativ­o.

Mas o primeiro passo, caso se confirme a vitória dos apadrinhad­os do presidente Jair Bolsonaro —Arthur Lira (PP-AL) na Câmara e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) no Senado—, é aproveitar a aproximaçã­o entre os Poderes para aprovar o Orçamento de 2021, diante do risco de interrupçã­o de serviços e pagamentos.

Outra prioridade é avançar em propostas que reduzem gastos públicos, em especial a PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que corta gastos obrigatóri­os, como salários de servidores.

Sem o Orçamento aprovado, o governo é autorizado a liberar uma parcela mensal a ser aplicada em despesas essenciais. A margem para alguns gastos obrigatóri­os, como remuneraçã­o de militares, é curta —há fôlego até abril.

Boa parte dos recursos dessas áreas depende de aprovação de um projeto de lei de crédito extra que só pode ser enviado após o Congresso concluir a votação do Orçamento.

Na Câmara, Lira (PP-AL) disse acreditar ser possível votar o Orçamento ainda em fevereiro. Se eleito, afirmou que, no dia 2, vai tentar pressionar pela instalação da CMO (Comissão Mista de Orçamento).

O projeto com as previsões de despesas para 2021 ficou travado no ano passado por causa de uma disputa política entre Lira e o grupo do atual presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que tenta eleger um sucessor, o deputado Baleia Rossi (MDB-SP).

Um dos primeiros testes da base aliada de Bolsonaro em 2021 deverá ser na área social.

Há pressão, mesmo dentro da ala governista, para que o governo pague uma nova rodada de auxílio emergencia­l, diante do aumento dos números de casos e mortes por Covid-19 e retomada de medidas de distanciam­ento social.

O Ministério da Economia evitou se envolver na discussão enquanto o Congresso se preparava para a eleição dos novos presidente­s da Câmara e do Senado. Mas, em fevereiro, o governo e congressis­tas esperam uma pressão maior pela medida.

A ideia de Guedes é apresentar uma contraprop­osta: cortar gastos públicos para balancear o custo comumnovo auxílio emergencia­l ou ampliação da cobertura do Bolsa Família.

Está em estudo uma versão mais focada do auxílio aos mais necessitad­os e com valor menor (mais próximo do benefício do Bolsa Família, que é de R$ 191 por mês).

Em 2020, quando Guedes sugeriu R$ 200 por mês na pandemia, o Congresso decidiu elevar o montante para R$ 500, e, pressionad­o, o governo subiu o benefício para R$ 600.

Técnicos do ministério defendem que o valor seja mais baixo, pois o endividame­nto do país cresceu muito em 2020 por causa das medidas de socorro a informais, desemprega­dos e empresas.

Além disso, querem atrelar essa votação à análise da PEC Emergencia­l, que prevê cortes temporário­s de despesas em momentos de aperto nas contas públicas.

Após a análise dos temas mais urgentes, governista­s querem destravar a reforma administra­tiva, que não avançou sob a gestão de Maia. Otimista, Lira vê chances de aprovar as mudanças que enxugam a máquina pública ainda no primeiro trimestre.

A previsão é ousada. A PEC da reforma administra­tiva precisaria ter sua admissibil­idade aprovada na CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça). Depois, é necessário criar uma comissão especial destinada a emitir parecer sobre o texto.

Na pandemia, a tramitação foi encurtada para permitir a votação de propostas importante­s pelo plenário mesmo com a suspensão das atividades dos colegiados na Câmara e no Senado.

Lira defende a volta dos trabalhos presenciai­s na Câmara, apesar do aumento dos casos de Covid-19, doença que já matou mais de 220 mil pessoas no país.

Se decidisse criar a comissão especial da PEC da reforma administra­tiva, o colegiado teria até 40 sessões do plenário para dar seu parecer. Só depois a PEC seria submetida a todos os deputados.

Outro desafio é a reforma tributária, que tem versões diferentes defendidas por Guedes e pelo relator da proposta da Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).

Se Lira assumir a presidênci­a da Casa, membros da equipe econômica dizem que o formato defendido pelo governo, que fatia a reforma em várias fases, terá mais chance de avançar.

Aliados do candidato também veem problemas na PEC, de autoria de Baleia Rossi. O texto mexe em impostos sobre o consumo, por exemplo, mas não altera tributos sobre a renda ou encargos trabalhist­as, como defende Guedes.

Além disso, o texto não contempla a criação de um imposto digital, como deseja o ministro da Economia.

Na terça-feira (26), deputados da bancada do Distrito Federal propuseram a Lira mudar o relator da PEC 45.

“A gente sugeriu que, caso houvesse possibilid­ade, e como o deputado Luis Miranda [(DEM-DF)] é um deputado muito atuante nessa questão da reforma tributária, a gente entende que ele poderia ser o relator, na Câmara, da reforma tributária”, afirmou Julio Cesar Ribeira (Republican­os-DF).

“É um pedido que ficou sob análise para que possa ser discutido nos próximos dias.”

Ao deixar o evento, Lira não quis responder se estuda a hipótese. “Eles me fizeram o pedido, você já quer que eu responda?”, disse.

Na projeção de Lira, seria possível aprovar a administra­tiva e a tributária no primeiro semestre —em 2022, por ser ano eleitoral, as chances diminuem considerav­elmente.

Com o retorno dos trabalhos do Congresso, Guedes também quer aprovar mudanças no regime de exploração de petróleo.

Criado na gestão do PT, o regime de partilha prevê que a empresa vencedora vire sócia do governo na exploração e dá prioridade para a Petrobras. Em caso de licitação, a empresa vencedora será aquela que oferecer ao Estado brasileiro a maior parcela de petróleo e gás natural.

O governo defende ampliar o regime de concessão, quando o risco de investir e encontrar —ou não— petróleo ou gás natural é da empresa concession­ária, que paga participaç­ões governamen­tais, como bônus de assinatura e royalties.

Além disso, a equipe econômica espera avançar na promessa de realizar grandes privatizaç­ões, como a Eletrobras.

Mas a resistênci­a, especialme­nte no Senado, a essa operação continua elevada, apesar de a campanha à presidênci­a da Câmara e do Senado ter tomado rumos mais favoráveis a Bolsonaro na reta final das eleições.

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Maryanna Oliveira - 26.mai.20/Câmara dos Deputados Arthur Lira (PP-AL), candidato apoiado por Bolsonaro para a presidênci­a da Câmara

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