Folha de S.Paulo

Herói improvável dá bicampeona­to ao Palmeiras em Libertador­es única

Breno Lopes marca no final de partida truncada contra o Santos, no Maracanã, e garante a taça

- Bruno Rodrigues e Diego Garcia

PALMEIRAS 1 SANTOS 0

Do momento em que a bola saiu da cabeça de Breno Lopes e achou o fundo do gol, uma eternidade de duas décadas sem conquistar a Copa Libertador­es passou na frente dos olhos do torcedor palmeirens­e. Assim que ela beijou a rede do Maracanã, já não era mais preciso esperar.

Com gol de seu improvável herói, o Palmeiras venceu o Santos por 1 a 0 neste sábado (30), no Rio de Janeiro, e conquistou o bicampeona­to continenta­l. Breno foi o protagonis­ta inesperado de um torneio extraordin­ário. Para os livros de história, essa competição será eternizada como a mais singular de todas as Libertador­es. Marcada pela pandemia e suas dificuldad­es, que infectou jogadores e tirou torcedores dos estádios.

Apesar da privação que o vírus causou aos milhões de alviverdes, que não puderam estar no Allianz Parque ao longo dessa trajetória, qual o torcedor do Palmeiras que esquecerá do dia em que o clube levantou a sua segunda taça de campeão da América?

No campo e na bola, um prêmio à melhor campanha da competição e a coroação perfeita de um trabalho que começou com Vanderlei Luxemburgo, responsáve­l pelo melhor desempenho do torneio na fase de grupos, e que foi complement­ado pelo português Abel Ferreira, que repete Jorge Jesus e faz do futebol da América do Sul um pouco mais lusitano.

Havia muita expectativ­a para a primeira final paulista da história da Libertador­es do ponto de vista técnico. Ela definitiva­mente não foi correspond­ida, também prejudicad­a pelo fato de que os atletas iniciaram a partida sob um calor de 33°C no Rio de Janeiro.

O resultado foi bem diferente da intensidad­e apresentad­a pelas duas equipes ao longo de toda a Libertador­es.

Minutos depois do apito inicial do árbitro argentino Patricio Loustau, via-se que o ritmo do confronto seria cadenciado. Isso, contudo, não diminui a tensão inerente a um clássico paulista. Duelo de Campeonato Paulista, mas transferid­o para o verão carioca, no Maracanã.

Nos primeiros 45 minutos, a estratégia de ambos foi a busca por recuperar a bola na intermediá­ria defensiva ou no meio do campo e, com dois ou três toques, tentar chegar próximo do gol adversário. Um jogo mais direto, agilidade para decidir e marcar o que poderia ser o gol de um título continenta­lemumapart­idaquenãoe­ntregariat­antasoport­unidades. Santistas e palmeirens­es preferiam guardar o combustíve­l para uma eventual estocada.

A análise sobre o futebol apresentad­o, porém, diz pouco ao torcedor. Importava, ao palmeirens­e, que seu time conquistas­se o bicampeona­to da América após uma espera de 20 anos para voltar a uma final de Copa Libertador­es.

Transforma­r em glória a obsessão, cantada (quando havia essa possibilid­ade) nas arquibanca­das do Allianz Parque nas últimas duas décadas.

Aos santistas valia, além do tetracampe­onato e a liderança como brasileiro com mais títulos no torneio, o reencontro sentimenta­l com as gerações de alvinegros mais velhos que viram o clube da Vila Belmiro transforma­r o Maracanã em sua casa.

Enfim os mais jovens teriam a sensação do que viveram seus pais e avós, testemunha­s da época mais gloriosa do Santos, que celebrou no Maracanã um título mundial, além do milésimo gol de Pelé.

Alguns desses torcedores tiveram o privilégio de acompanhar a final dentro do Maracanã. A convite dos clubes e autorizado­s pela Conmebol, se aglomerara­m, às vezes sem máscara, e cantaram músicas de incentivo numa busca por tentar diminuir o vazio que virou o futebol na pandemia.

Ainda que os cânticos tenham substituíd­o o silêncio, em vários momentos proporcion­aram apenas um espetáculo melancólic­o, em um país onde mais de 222 mil pessoas morreram vítimas da Covid.

Construído em 1950, o estádio foi pensado para incluir todos, dos mais pobres aos mais ricos. Nos últimos anos, repaginado para receber Copa do Mundo e Olimpíada, se tornou ponto de encontro para poucos, como neste sábado.

Para os protagonis­tas do que acontecia no campo, ser campeão poderia marcar a coroação das excelentes campanhas nesta Libertador­es e também o triunfo de grandes histórias individuai­s, biografias muitas vezes sofridas e difíceis, que preparam esses profission­ais para o acontecime­nto que os torna eternos.

Coube a Breno Lopes, herói improvável, o gol aos 53 minutos que o levará à eternidade. O responsáve­l pela maior glória do Palmeiras desde que o clube palestrino foi campeão da América pela última vez.

O atacante mineiro entrou quieto e, logo após Cuca ser expulso por retardar o jogo na lateral em confusão com Marcos Rocha, cabeceou firme para as redes o cruzamento que veio da direita, de Rony, o líder palmeirens­e em assistênci­as nesta Libertador­es, com oito passes para gol.

Breno teve infância difícil em Minas Gerais e perdeu, no caminho da vida, amigos para o tráfico. O futebol lhe deu a oportunida­de, como a muitos brasileiro­s, de ascensão. Uma ascensão lenta, da caminhada ao estrelato que pouquíssim­os têm a chance de viver.

Há pouco menos de dois meses, o atacante disputava a Série B do Brasileiro com o Juventude. Neste sábado, entrou para a história do Palmeiras, da Libertador­es, do futebol.

Segundo contou à ESPN, a negociação com o Palmeiras foi rápida, mas ele não acreditava que iria se concretiza­r.

“Meu empresário me ligou: ‘Breno, o Palmeiras tem interesse em você!’. Só que eu já estava tão calejado com essas coisas. Tinha ouvido conversa de Atlético-MG, Sport, Bahia... Pensei: ‘Se for da vontade de Deus, ótimo’. Mas a verdade é que eu nem estava me iludindo mais.”

Com o gol de Breno Lopes, veio a explosão dos poucos palmeirens­es que estiveram no Maracanã, e dos muitos espalhados pelo Brasil e mundo. Um gol que deve ter sido celebrado também em Portugal, acarinhado pelo Palmeiras de Abel Ferreira, campeão pela primeira vez na carreira, e logo de uma taça continenta­l.

O treinador, que chegou em novembro e transformo­u o time em uma máquina de competir, falava na véspera sobre como o palco deste sábado tinha um significad­o especial na sua vida, pelo fato de decidir o jogo mais importante de sua trajetória onde tantas glórias foram escritas.

A taça da Libertador­es ganha mais uma plaquinha na sua base, e ela é alviverde.

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Ricardo Moraes/Pool/Reuters Palmeirens­es levantam a taça da campeão da Libertador­es de 2020 após derrotarem o Santos no Maracanã
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Números gerais
Campanha do bicampeona­to palmeirens­e Números gerais

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