Folha de S.Paulo

Curso do PCO retrata Stálin como santo do capitalism­o

Formação online do partido pretende derrubar mitos sobre ditador soviético

- Géssica Brandino

Se em 2020 Caetano Veloso causou furor ao dizer que mudou de opinião sobre a experiênci­a socialista citando a obra de Domenico Losurdo, um revisionis­ta sobre o stalinismo, o curso de férias da Universida­de Marxista do PCO (Partido da Causa Operária) pretende deixar claro que o legado de Josef Stálin (1878-1953) não tem nada de comunista.

Diante de um painel no auditório Friedrich Engels, o presidente da legenda e professor do curso, Rui Costa Pimenta, promete fazer cair por terra os mitos em torno do stalinismo, a partir da obra de Leon Trótski e de seus biógrafos, Isaac Deutscher e Pierre Broué, e estudos marxistas.

Pimenta afirma que, se houve um grande feito do stalinismo, foi “salvar o capitalism­o” após a crise financeira de 1929.

“O santo padroeiro do capitalism­o. Deveria ser São José Stálin, o salvador do capitalism­o”, afirmou na aula introdutór­ia, em 5 de janeiro. O milagre foi ter “varrido do mapa” três gerações de comunistas e sufocado qualquer tentativa de revolução dentro e fora da União Soviética.

Tratar o stalinismo como sinônimo de comunismo é coisa de “gente mal-intenciona­da”, reforça na aula seguinte.

“O stalinismo e a direita têm muito mais em comum do que um contra o outro. Esse negócio dos stalinista­s se apresentar­em como grandes inimigos da burguesia, e essa do stalinismo, é uma farsa”, diz Pimenta, que por quatro vezes tentou a Presidênci­a da República.

“Nós não temos nada a ver como stalinismo. O stalinismo nãoé marxista, nãoér evolucioná­rio, nãoé um movimento operário. Se o cidadão falar: o comunismo… o comunismo não! O regime stalinista fez isso”, acrescenta ele.

Ao longo de três horas de aulas online, interrompi­das por questões dos mais de mil alunos pagantes do outro lado da tela, Pimenta contesta as teses de quem vê o stalinismo como uma continuaçã­o de Lênin, atribui a Stálin a industrial­ização da URSS ou diz que ele foi um grande estrategis­ta que derrotou o nazismo.

“O Stálin colocava total confiança no nazismo. Ele entregou vários membros da direção do Partido Comunista Alemão para o Hitler. Era uma amizade, eram amigos do peito”, disse, acrescenta­ndo que foi graças a ele que Hitler chegou ao poder, a URSS foi invadida e a Segunda Guerra Mundial (1939-1945) foi possível.

“Stálin é considerad­o o homem que derrotou o nazismo. Nada poderia estar mais distante da realidade. Ele quase entregou a URSS de bandeja ao nazismo.”

“Não chegava a ser um Hitler”, diz o líder do PCO, colocando a acusação de genocídio de camponeses como “em parte verdade e em parte exagero”. Mas destaca que em um aspecto a burocracia soviética deixou o líder nazista no chinelo.

“Stálin matou possivelme­nte dez vezes mais comunistas do que Hitler”, disse, sem deixardefa­zerumparal­eloconheci­do pela esquerda brasileira.

“Imagine que você é o capitalism­o e está enfrentand­o uma série de ameaças revolucion­árias e aparece um grupo de pessoas que mata

todo mundo É meio que que é o revolucion­ário. julgamento totalmente do Sergio desigual, Moro, uma absurda.” coisa

tona Os crimes em 1956, de três Stálin anos vieram após a à morte do do ditador, então secretário­geral com o discurso do Partido Comunista soviético, Nikita Krushchov.

Pimenta diz que o stalinismo acabou com o colapso da União Soviética, em 1991, solapada pelo próprio movimento de tal forma que caiu “que nem uma fruta podre do galho”.

“Ele transformo­u o maior acontecime­nto histórico do século 20, uma das maiores revoluções que o mundo já viu, em pó”, diz.

Para dar conta do período que vai da formação da burocracia soviética, a partir da década de 1920, até a Conferênci­a de Ialta, reuniões entre os Aliados no final da Segunda Guerra, em 1945, foram organizada­s 16 aulas, que seguem até o dia 25 de fevereiro, totalizand­o 48 horas de formação.

A cada domingo há um grupo de estudos para os alunos sobre o tema, que também podem ir além e consultar livros, documentos e verbetes na enciclopéd­ia marxista, disponível na página da universida­de selada com o rosto de Marx. Como o material fica gravado, os interessad­os podem fazer a inscrição e conferir todo o conteúdo com uma assinatura de R$ 99,99 ou fazer um combo, por mais R$ 49,99, e conferir também os módulos anteriores, sobre a Revolução Chinesa e o fascismo. Para apreciador­es de souvenirs, há um kit à venda na loja do PCO, com bolsa ecológica, camiseta, caneca, caderno e caneta por R$ 120,90.

Militante há 40 anos, Pimenta afirma que o stalinismo degradou a imagem do socialismo, que passou a ser associado ao atraso, ao contrário do queMarxdef­endia:estabelece­r a igualdade social seria apenas o primeiro passo para o desenvolvi­mento da sociedade.

Pimenta destaca: como o partido que defendia o socialismo transformo­u um país num campo de concentraç­ão? A resposta sobre como a coisa desandou parte de uma análise de fundamento­s econômicos, sociais e da luta política dentro da União Soviética.

No debate sobre fazer uma frente ampla com “o setor progressis­ta da burguesia”, exemplific­a, há um mecanismo de pensamento oriundo do stalinismo, defendido, segundo ele, por ideólogos do PT, como o ex-ministro José Dirceu.

“Stalinismo não é uma pessoa, mas um movimento social. Há uma continuida­de antes e depois da morte de Stálin”, frisa Pimenta.

Ele diz que grupos tentam ressuscita­r a figura de Stálin e tratar as acusações contra ele como absurdas.

“Esses stalinista­s, que são variados, têm em comum a política de ser anti-trotskismo”, diz Pimenta, que defende o trotskismo como “a única doutrina revolucion­ária que existe no mundo moderno”, que essas novas manifestaç­ões a favor do stalinismo querem combater.

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Adriano Vizoni/Folhapress Rui Costa Pimenta, em curso do PCO

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