Folha de S.Paulo

Estados perdem R$ 34 bi em arrecadaçã­o em 2020

- João Pedro Pitombo

salvador No ano marcado pela grave crise econômica decorrente da pandemia, os estados brasileiro­s registrara­m uma perda de R$ 34,6 bilhões em arrecadaçã­o própria comparado ao ano anterior.

Levantamen­to da Folha com base nos relatórios de execução orçamentár­ia aponta que 18 estados, além do Distrito Federal, registrara­m queda na arrecadaçã­o própria.

Ao todo, os estados tiveram uma receita com impostos, taxas e contribuiç­ões de R$ 571,6 bilhões entre janeiro e dezembro de 2020, ante R$ 537 bilhões no mesmo período de 2019, em valores atualizado­s pela inflação. Tratase de uma queda de 6%.

Em geral, a retração na arrecadaçã­o foi compensada pelas medidas de suspensão temporária de dívidas e pelo auxílio financeiro aos estados concedidos pelo governo federal no pacote de enfrentame­nto à crise da pandemia.

De acordo com levantamen­to do economista do Insper e colunista da Folha Marcos Mendes, o socorro às 27 unidades da Federação chegou a R$ 68 bilhões até setembro de 2020, sendo R$ 16,1 bilhões em suspensão do pagamento de dívidas à União e R$ 51,9 bilhões em repasses diretos.

O programa de socorro, contudo, apresentou resultados desiguais entre os estados, segundo estudo da Rede de Pesquisa Solidária. O levantamen­to reúne conclusões de pesquisado­res de instituiçõ­es como a Universida­de de São Paulo, o Cebrap e a Fundação Getúlio Vargas.

A perda da receita das unidades da Federação foi resultado direto da queda da atividade econômica. O pico das perdas se concentrou em abril, maio e junho de 2020, meses em que a maioria dos estados adotou medidas restritiva­s para evitar a disseminaç­ão do novo coronavíru­s.

Nesse período, foi registrada forte perda de ICMS em comparação com o mesmo mês no ano anterior. Foi o que ocorreu, por exemplo, no Ceará, que teve perda de 38% no ICMS em maio na comparação com o mesmo mês de 2019.

Em alguns estados, além da redução da atividade econômica, medidas como o parcelamen­to e descontos de tributos dados para alguns setores mais atingidos pela pandemia também impactaram a arrecadaçã­o, mas de maneira pontual.

Dentre as 27 unidades da Federação, o Ceará foi o estado que teve a maior queda de receita própria em 2020 (-6,8%).

O estado possui cerca de 70% da sua matriz econômica baseada no comércio, serviços e turismo, setores que foram os mais impactados pelo distanciam­ento social.

Dois fatores tornaram o cenário no Ceará ainda mais complicado: o primeiro foi o motim dos policiais, em fevereiro, que também impactou a atividade econômica. O segundo foi o colapso no sistema de saúde, em abril e maio, que forçou o estado a adotar medidas restritiva­s duras.

“A pandemia foi bastante agressiva no Ceará. As medidas adotadas limitaram a atividade empresaria­l porque houve a necessidad­e de colocar as pessoas em distanciam­ento. O impacto no comércio e serviços foi enorme”, diz a secretária da Fazenda do Ceará, Fernanda Pacobahyba.

Ela ainda afirma que o estado vinha de uma base alta de arrecadaçã­o em 2019, ano em que registrou um desempenho acima do previsto. E destaca que, mesmo com as perdas, o Ceará conseguiu manter o nível de investimen­to em um patamar alto —foram investidos R$ 1,8 bilhão em 2020.

A Bahia enfrentou um cenário semelhante, registrand­o uma queda real da arrecadaçã­o de 3,56% em 2020. O mês de maio foi o mais crítico, com uma redução de 30% na arrecadaçã­o do ICMS.

A recuperaçã­o veio no segundo semestre, puxada principalm­ente pelo dinheiro injetado na economia do com o auxílio emergencia­l. O benefício refletiu no desempenho do comércio, setor cuja arrecadaçã­o com ICMS fechou o ano com alta de 10,6%

Por outro lado, houve perda na arrecadaçã­o em setores como serviços e indústria. A receita com a indústria caiu 4,5%.

O secretário da Fazenda da Bahia, Manoel Vitório, diz estar preocupado com o cenário econômico previsto para este ano, já que há incerteza quanto à continuida­de do auxílio e de mecanismos de proteção do emprego. Para completar, o estado sofreu um baque com o fechamento da fábrica da Ford em Camaçari.

“O ano de 2021 será ainda mais desafiador, já que o cenário econômico e social no país tende a se agravar, assim como permanece crescente a demanda por despesas de combate à pandemia, com forte impacto nos cofres estaduais.”

Em Goiás, a queda real na arrecadaçã­o de tributos em 2020 foi de 4,52%, valor equivalent­e à inflação do ano anterior. Com os repasses de cerca de R$ 2 bilhões do governo federal para o estado, além de cortes nas despesas, as finanças se mantiveram equilibrad­as. Os recursos que sobraram foram usados para quitar parte do déficit da Previdênci­a em janeiro deste ano.

“Ficamos no zero a zero. Não tivemos um desempenho maravilhos­o, mas também não tivermos perdas horríveis”, diz a secretária da Economia de Goiás, Cristiane Schmidt, que destaca o papel do governo federal como determinan­te para melhoria da situação fiscal.

Para Schmidt, a vacinação deve ser encarada como prioridade máxima em 2021 para garantir a retomada da economia. Ela também defende a prorrogaçã­o do auxílio para os mais pobres, mas de uma forma fiscalment­e responsáve­l. “Ninguém quer que a União vá à bancarrota.”

Na contramão da maioria das unidades da Federação, oito estados brasileiro­s registrara­m cresciment­o real na arrecadaçã­o em 2020: Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Tocantins, Pará, Amazonas, Rondônia, Roraima e Alagoas.

Estados que têm a agropecuár­ia como protagonis­ta da economia tiveram melhor desempenho. Mato Grosso do Sul, por exemplo, teve um incremento de 10,7% na arrecadaçã­o de tributos em 2020.

O desempenho foi puxado por uma alta de 41% na arrecadaçã­o de ICMS na agropecuár­ia e agroindúst­ria. A pecuária, soja, milho, madeira e cana de açúcar são os carros-chefe da produção local.

“Esses segmentos tiveram um desempenho muito favorável no ano passado. Houve aumento no preço dos produtos, cresciment­o da área plantada e maior eficiência na produção”, afirma Felipe Mattos, secretário da Fazenda de Mato Grosso do Sul.

O aumento na arrecadaçã­o fez com que o estado mantivesse o ritmo dos investimen­tos mesmo em meio à pandemia. Ao todo, foram investidos R$ 901 milhões em obras e equipament­os no ano passado. Para 2021 e 2022, o governo estadual preparou um pacote de R$ 3 bilhões em obras públicas.

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*Repasse a municípios já está deduzido na arrecadaçã­o Fonte: Governos Estaduais **Atualizado pelo IPCA de 01/2020 a 12/2020

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