Folha de S.Paulo

Absolvido no mensalão é suspeito em mais um esquema de propina

Márcio Alaor é alvo de apuração de corrupção e lavagem envolvendo operadores políticos; defesa nega

- José Marques e Wálter Nunes

Um executivo que chegou a ser denunciado no mensalão está novamente no centro de uma investigaç­ão sob suspeita de corrupção e lavagem de dinheiro para operadores de políticos com altos cargos, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha e o ex-ministro e ex-senador Romero Jucá, ambos do MDB.

Márcio Alaor de Araújo, exvice-presidente do BMG, foi alvo em 2020 de fases da Operação Descarte, uma investigaç­ão da Receita Federal, da Polícia Federal e do Ministério Público Federal em São Paulo.

A Procurador­ia o considera um pivô do esquema de lavagem de dinheiro que envolve o banco mineiro, doleiros, empresas de fachada, operadores políticos e um escritório de advocacia que forjava serviços jurídicos para transforma­r em propinas recursos saídos da instituiçã­o financeira.

Em petições apresentad­as à Justiça, seus advogados têm afirmado que não há corroboraç­ão de provas nas delações que o mencionam.

Sua defesa é comandada por Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que disse em manifestaç­ão ao TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) que a delação que acusa Alaor foi adaptada enquanto estava em curso porque “nada foi encontrado que corroboras­se a versão dos delatores” e que a acusação usa elementos “apreendido­s com o próprio colaborado­r”.

O Ministério Público Federal contesta e apresenta emails e relatórios apreendido­s antes de ele firmar delação que, mesmo sem o depoimento do colaborado­r, já serviriam para uso contra os investigad­os.

“Temos emails contendo negociaçõe­s, notas fiscais e contratos simulados apreendido­s na 1ª fase da operação, informaçõe­s fiscais da Receita Federal e RIF (relatório de informaçõe­s financeira­s) do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeira­s)”, diz o procurador da República Vicente Mandetta, responsáve­l pela investigaç­ão.

Segundo ele, esse material forma “conjunto probatório robusto suficiente para a decretação das medidas de busca e apreensão, sequestro de bens e valores e afastament­o da atividade econômica, deferidas pela 2ª Vara Criminal Federal de São Paulo”.

Em 2012, Alaor chegou a ser condenado em primeira instância por gestão fraudulent­a em ação de desdobrame­nto do mensalão, mas foi absolvido pelo TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região). A Procurador­ia recorreu.

No julgamento da Descarte, Alaor teve uma vitória parcial no TRF-3 no último dia 1º: reverteu uma medida cautelar que o afastava de atividades econômica e financeira. Mas ficou decidido que ele não pode atuar no BMG. Também foi considerad­a prematura a discussão a respeito das provas da investigaç­ão e delações.

A Operação Descarte investiga esquemas de lavagem de dinheiro relacionad­os ao advogado Luiz Carlos D’Afonseca Claro, também conhecido como Lulli Chiaro, e seu filho Gabriel Claro. Ambos firmaram acordo de delação em 2019.

As apurações das fases contra o BMG contemplam alvos de outras grandes operações, como da Lava Jato do Rio de Janeiro, que investiga elos com o ex-governador Sérgio Cabral (ex-MDB), e da Acrônimo, que envolve suspeitas relacionad­as ao ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel (PT).

O esquema com os Claros funcionava assim: interessad­os em dinheiro vivo firmavam contratos fictícios com empresas ligadas a Luiz Carlos e Gabriel. Então, pai e filho providenci­avam recursos em espécie por meio de doleiros.

As investigaç­ões apontam que os Claros atuaram para empresas ligadas ao BMG e seus executivos de 2014 a 2016. Os operadores do esquema eram Milton Lyra e Daniel Peixoto, ligados a políticos da cúpula do MDB.

Segundo a delação de Gabriel Claro, as empresas ligadas ao BMG firmaram contratos de fachada com empresas ligadas aos Claro.

Parte do dinheiro em espécie, dizem os investigad­ores, teria sido entregue ao próprio Márcio Alaor na sede do BMG.

A PF chegou à conclusão de que houve serviços de fachada não só nos contratos com os Claros, mas também com outras empresas. Para isso, usaram como provas os emails, relatórios da Receita Federal e depoimento­s de colaboraçõ­es.

No total, o volume de recursos suspeitos movimentad­o no esquema é de aproximada­mente R$ 140 milhões.

O banco BMG foi contratado pelo governos de Minas Gerais e do Rio de Janeiro para a concessão de crédito consignado aos servidores desses estados.

Márcio Alaor renunciou ao cargo de vice-presidente do BMG após a operação.

Os advogados de Luiz Carlos Claro e Gabriel Claro, Danyelle Galvão e Ortélio Marrero, afirmam em nota que “todas as declaraçõe­s prestadas estão corroborad­as por elementos da investigaç­ão, inclusive colhidos em busca e apreensão anterior à prisão”.

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