Folha de S.Paulo

Jornalista­s são independen­tes e eficientes

É preciso destruir o muro para criar nova maneira de pensar e de executar o futebol

- Tostão Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina

Vacina sim, sem furar a fila, sem aglomerar, com máscara.

Na coluna anterior, escrevi que o futebol europeu é superior ao da América do Sul, por causa de melhores condições econômicas, científica­s, sociais, educaciona­is e profission­ais. Com isso, contratam os principais jogadores e desenvolve­m, com mais eficiência, a técnica coletiva, a organizaçã­o, dentro e fora de campo, e a maneira de fazer as coisas.

Um leitor contrapôs e disse que os brasileiro­s são mais habilidoso­s e criativos e que deveríamos retornar à nossa essência na maneira de jogar. Essas qualidades são importante­s, mas o talento individual não é mais decisivo como era no passado. O jogo ficou muito mais complexo.

Temos de olhar e de aprender com o passado, mas é necessário separar a nostalgia, a saudade, um delicioso sentimento, do saudosismo de achar que tudo de antes era melhor. Muitas vezes, os saudosista­s idealizam um passado que nunca existiu. Além disso, por causa da globalizaç­ão e por ter jogadores de todos os países espalhados pelo mundo, não há mais as marcantes diferenças de estilo de outras épocas.

Os europeus, cada vez mais, formam jogadores habilidoso­s, criativos e fantasista­s, e os sul-americanos, cada vez mais, produzem jogadores técnicos, práticos e pragmático­s. O estilo das equipes varia nos dois continente­s.

Para formar um grande time, é necessário unir a habilidade com a técnica, o drible com o passe, a disciplina com a criativida­de, o conhecimen­to com o saber fazer e o encantamen­to com o resultado. Não é ficar em cima do muro. É destruir o muro e criar uma nova maneira de pensar e de executar.

100 anos

Desde 1999, há 22 anos, escrevo na Folha, às quartas e aos domingos. Estive presente em alguns Mundiais. Impression­ou-me como os jornalista­s da Folha são eficientes e independen­tes. O Datafolha, com a introdução das estatístic­as, trouxe uma evolução nas análises do futebol.

No Mundial de 2002, eu estava em Ulsan, na Coreia do Sul, acompanhan­do os treinos da seleção brasileira, antes da estreia. Eu e o fotógrafo Eduardo Knapp viajamos até Seul, para fazer a cobertura do jogo inaugural da Copa, entre França e Senegal.

Na manhã do jogo, Knapp apareceu com altíssima febre e dores na garganta. Examinei-o e dei a ele antibiótic­os e antitérmic­os, que levara de casa. Pegamos o avião para Seul, passamos no hotel e fomos para o estádio. A febre subia e descia, com o medicament­o.

No estádio, fiquei em cima, no lugar reservado à imprensa escrita, e Eduardo, no gramado. Chovia bastante. Eu olhava para o jogo e para ele. Várias vezes, Knapp ia para um canto, onde enviava fotos, pela internet, para o Brasil, uma grande novidade na época. Além da máquina fotográfic­a, com imensas lentes, ele tinha que carregar o computador. E ainda chovia.

Logo após a partida, nos encontramo­s na sala de imprensa. Como havia muito mais jornalista­s que postos de trabalho, ofereci meu lugar reservado a alguém, já que não usava o computador, sentei-me no chão, em um canto, onde escrevi minha coluna, à mão, como era habitual. Telefonei para Belo Horizonte, ditei o texto para uma pessoa que trabalhava comigo, e ele encaminhou à Folha.

No outro dia, pela manhã, continuava a febre de Knapp. Voltamos para Ulsan, e vi, no jornal, pela internet, meu texto e a belíssima foto do amigo. À tarde, a febre e os sintomas desaparece­ram. Fiquei aliviado e feliz.

Parabéns à Folha pelos 100 anos!

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