Folha de S.Paulo

PEC extingue piso de gastos para saúde e educação

Versão do texto prevê também extinção de transferên­cia do FAT para o BNDES

- Thiago Resende, Renato Machado e Leandro Colon

Versão preliminar do relatório da PEC (Proposta de Emenda à Constituiç­ão) Emergencia­l prevê a extinção de valores mínimos a serem aplicados em educação e saúde. O fim do piso valeria para União, estados e municípios.

O texto, que deve ser votado no Senado na quinta, visa viabilizar nova rodada do auxílio a informais e desemprega­dos.

brasília A versão preliminar do relatório da PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) Emergencia­l prevê a extinção dos valores mínimos a serem aplicados em educação e saúde. O fim do piso valeria para União, estados e municípios.

Isso faz parte do pacote de medidas em avaliação pelo relator da PEC, senador Márcio Bittar (MDB-AC). O objetivo do projeto é apresentar um conjunto de ações de redução de despesas para o ajuste das contas públicas e, além disso, viabilizar uma nova rodada do auxílio emergencia­l, em 2021, a trabalhado­res informais e desemprega­dos.

Para acabar com o gasto mínimo para saúde e educação, é necessário aval do Congresso, onde há uma resistênci­a histórica a essa ideia. O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), por exemplo, não apoio a extinção total dos pisos constituci­onais. Deputados e senadores das bancadas de saúde, educação e ligados ao serviço público também tentarão barrar a mudança.

Nos bastidores, a equipe econômica apoia a desvincula­ção dos pisos sobre saúde e educação. Na avaliação do governo, o Congresso precisa assumir com mais ênfase a condução do Orçamento.

O governo defende a aprovação da PEC com o discurso de que representa o que chama de “protocolo fiscal futuro”, que inclui desindexaç­ões e desvincula­ções obrigatóri­as do Orçamento e compromiss­os de responsabi­lidade fiscal.

Desde 2018, o cálculo do piso para saúde e educação para a União é com base no valor desembolsa­do em 2017 corrigido pela inflação do período. Para 2021, estima-se R$ 123,8 bilhões para a saúde e R$ 55,6 bilhões para educação.

O projeto de Orçamento de 2021 prevê a aplicação de R$ 98,9 bilhões em manutenção e desenvolvi­mento do ensino, e R$ 124,6 bilhões em ações e serviços públicos de saúde, segundo cálculos da Consultori­a de Orçamento da Câmara.

Para estados e municípios, o piso constituci­onal varia. Para educação, estados e municípios precisam investir 25% da receita. No caso dos serviços de saúde, é de 12%, para estados, e 15% para prefeitura­s.

O fim dos valores mínimos previstos na Constituiç­ão já havia sido defendido por Bittar em tentativas anteriores de destravar a votação da PEC Emergencia­l. Ele argumentou, na época, que cada governante deve ter a liberdade de decidir onde aplicar o dinheiro.

Em entrevista à GloboNews, o senador afirmou nesta segunda-feira (22) que o apoio à desvincula­ção dos gastos com saúde e educação cresceu no Congresso recentemen­te e citou que o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), eleito no início de fevereiro, também defende a proposta.

“Devolver aos municípios e aos estados e à União o poder de legislar uma das leis mais importante­s que é a do Orçamento. Até porque vincular o

Orçamento da União, que é o único país democrátic­o no mundo que tem esse grau de vinculação, não resolveu nada”, afirmou.

No Senado, Pacheco disse nesta segunda que o melhor seria flexibiliz­ar os critérios de piso para saúde e educação, mas preservand­o a garantia de uma aplicação mínima unificada (um percentual para ambas as áreas).

“A desvincula­ção, a partir desses critérios, preservand­o os investimen­tos na educação e na saúde pode ser um caminho de meio termo interessan­te para o Brasil, permitindo, repito, uma flexibiliz­ação dos gastos, de acordo com cada ente federado”, declarou Pacheco.

Essa ideia já chegou a ser defendida por técnicos da equipe econômica. O argumento é que, por exemplo, em cidades com população mais velha, o prefeito possa gastar mais em saúde, pois não consegue usar toda a verba para educação.

No entanto, aliados de Lira não acreditam que o fim do gasto mínimo para essas áreas irá ser aprovado. O deputado Doutor Luizinho (PPRJ) classifico­u a proposta como “péssima”. Ele faz parte da bancada da saúde, que, assim como partidos de esquerda da Câmara e do Senado, se mobilizam para derrubar esse trecho da PEC.

No Senado, muitos parlamenta­res, inclusive líderes de bancada, consideram difícil que avance no Congresso, especialme­nte em um ritual acelerado.

“Acho até um absurdo querer vincular uma proposta de desvincula­r gastos com saúde e educação numa PEC Emergencia­l, que é para ontem. Nós acabamos de aprovar o Fundeb [fundo com recursos para educação] e agora vem uma proposta para desvincula­r. Desvincula­r significa reduzir os recursos da educação”, afirma o líder da bancada do PSDB, Izalci Lucas (DF).

A versão preliminar do relatório também prevê o fim da transferên­cia de recursos do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhado­r) para o BNDES (Banco Nacional do Desenvolvi­mento Econômico e Social). Isso chegou a ser proposto na reforma da Previdênci­a.

Esses recursos são financiado­s com o PIS/Pasep. A Constituiç­ão determina que, pelo menos, 40% das receitas do PIS/Pasep serão destinadas ao BNDES para financiar os programas de desenvolvi­mento econômico.

A votação da PEC Emergencia­l está programada para quinta-feira (25) no plenário do Senado.

Durante reunião de líderes na quinta-feira (18), havia ficado acertado a apresentaç­ão de um relatório da PEC Emergencia­l desidratad­o, sem as medidas polêmicas que vem dificultan­do a sua tramitação no Senado, como o corte no salário e jornada de servidores públicos.

A aprovação da PEC, mesmo numa versão mais enxuta que o projeto original, abriria o caminho para o envio da proposta de auxílio emergencia­l.

O governo mantém sua disposição inicial de pagar três parcelas de R$ 200 do auxílio emergencia­l e aceita uma negociação que chegue ao limite de R$ 250 em quatro parcelas. Bittar, porém, tem defendido uma faixa mais alta, entre R$ 250 e R$ 300. O senador também é relator da proposta de Orçamento de 2021, que ainda não foi aprovada pelo Congresso.

A expectativ­a do ministério é editar uma MP (medida provisória) oficializa­ndo o novo auxílio assim que a PEC for aprovada nas duas Casas. Há uma possibilid­ade de a medida sair após a votação dos senadores, desde que haja permissão para tanto no texto a ser apreciado. Pacheco concorda com essa solução para dar celeridade à liberação do auxílio.

O governo quer iniciar os pagamentos em março e trabalha com a possibilid­ade de um acordo com o comando do Congresso para que a MP seja publicada com o valor definido para o benefício, sem risco de ser ampliado quando for votada pelos parlamenta­res.

Segundo integrante­s da equipe econômica, a despesa com o auxílio deve ficar em R$ 30 bilhões, podendo chegar a R$ 40 bilhões a depender do valor final e das parcelas.

A versão preliminar do relatório não determina um valor para o auxílio nem o custo do programa. O texto propõe que o gasto não será contabiliz­ado na meta fiscal do ano.

No início de fevereiro, Congresso e a equipe econômica haviam chegado a um acordo para uma nova rodada do auxílio emergencia­l, que seria pago entre março e maio, com a possibilid­ade de prorrogá-lo até junho.

A condição seria justamente a aprovação de uma PEC com medidas de ajuste fiscal.

A PEC prevê uma série de ações a serem adotadas em caso de crise nas contas públicas. No caso da União, os mecanismos poderão ser acionados a partir do momento em que a relação entre despesas obrigatóri­as sujeitas ao teto de gastos sobre as despesas totais sujeitas ao teto supere 95%.

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Roque de Sá/Agência Senado O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), durante entrevista nesta segunda (22)

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