Folha de S.Paulo

Investigaç­ão que mira Judiciário inclui ex-Timbalada e joalheiro de famosos

Suspeita de lavagem de dinheiro envolve personalid­ades próximas do mundo jurídico na Bahia

- João Pedro Pitombo e José Marques

salvador e são paulo Na varanda de seu apartament­o, que fica em um dos bairros mais caros de Salvador, o joalheiro Carlos Rodeiro ergue o celular, liga a câmera e dá um giro de 360 graus para mostrar as pessoas ao seu redor: “Está bombando, está bombando, está bombando”.

Na festa, em um sábado de Carnaval, os convidados bebericava­m uísque ou espumante em torno de uma mesa de centro repleta de arte sacra ou na sacada com vista para a baía de Todos-os-Santos.

O regabofe se repete em praticamen­te todos os Carnavais, quando empresário­s, artistas, políticos, desembarga­dores e outras personalid­ades do mundo jurídico da Bahia vão ao encontro do joalheiro.

Com relação próxima com grande parcela do poder na Bahia, Rodeiro se tornou personagem da Operação Faroeste depois de ter sido alvo de mandados de busca e apreensão da Polícia Federal.

Principal operação do Ministério Público Federal contra venda de decisões judiciais, a Faroeste se ramifica em investigaç­ões que envolvem outros Poderes e ajudou a desmontar um suposto esquema de vendas de decisões por meio de advogados que operavam para interessad­os.

Com a primeira fase deflagrada há menos de um ano e meio, a operação teve origem em uma disputa de terras na divisa da Bahia com o Piauí e o Tocantins e se expandiu com a ajuda de delações premiadas.

Até fevereiro de 2021, oito desembarga­dores já haviam sido afastados do Tribunal de Justiça da Bahia por decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça), além de outros três juízes. Três desembarga­doras estão presas preventiva­mente, e uma quarta está em prisão domiciliar.

Carlos Rodeiro foi alvo de busca e apreensão sob suspeita de que suas joias eram um meio de lavar dinheiro do suposto esquema de venda de sentenças e também de que subornava autoridade­s.

Em seu celular, os investigad­ores encontrara­m diversas conversas com a então procurador­a-geral de Justiça do Ministério Público da Bahia,

Ediene Lousado.

Isso indicaria, na interpreta­ção do Ministério Público Federal, “que ela defenderia seus interesses e receberia joias e empréstimo­s, uma vez que, ante a magnitude do cargo ocupado, não se revela crível que a autoridade máxima do parquet faça assessoria jurídica pro bono para ele”.

Ediene, por exemplo, intermedio­u a relação de Carlos Rodeiro com o secretário da Fazenda da Bahia, Manoel Vitório. Ainda entregou, em uma viagem para Brasília, um colar de Rodeiro de presente para a então procurador­a-geral da República Raquel Dodge.

Para a investigaç­ão, uma “sistemátic­a que aparenta possível tentativa de cooptação da máxima autoridade do Ministério Público brasileiro, responsáve­l, em última instância, pelo desfecho da Operação Faroeste”.

“Raquel amou o presente! Depois te mando as fotos”, disse Lousado antes de enviar uma imagem com Dodge usando o colar. Depois, Lousado pede a Rodeiro que lhe faça uma transferên­cia bancária porque estava “precisando muito”.

“O áudio do gerente hj [hoje] me assustou. Meu limite já caiu, cartões atrasados e demais compromiss­os também. Td pq [tudo porque] não posso pegar empréstimo, sequer vender minhas férias ao banco posso, por causa do cargo e da licitação.”

Rodeiro, aponta o material apresentad­o pelos investigad­ores, pediu a Lousado que interviess­e em um processo ligado a um advogado investigad­o na operação.

Além do joalheiro, as investigaç­ões também miraram personagen­s do meio artístico baiano, incluindo Amanda Santiago, ex-vocalista da banda Timbalada.

A cantora é filha da desembarga­dora Maria do Socorro Barreto Santiago, que está presa desde 2019. Em dezembro, ela também foi alvo de busca e apreensão no âmbito da Operação Faroeste.

Amanda, segundo as investigaç­ões, é suspeita de ser receptora de recursos ilegais destinados à desembarga­dora, que é ex-presidente do Tribunal de Justiça da Bahia. O Ministério Público Federal diz que Socorro usava suas filhas “como vias de captação de vantagens indevidas, demonstran­do preocupaçã­o com a incorporaç­ão de bens em seu nome”.

Os investigad­ores usam, para provar isso, relatórios financeiro­s, trocas de mensagens em aplicativo­s de celular e informaçõe­s sobre ligações telefônica­s trocadas com outros suspeitos.

Segundo relatório do Coaf (órgão federal de inteligênc­ia financeira), Amanda Santiago teve movimentaç­ões suspeitas de aproximada­mente R$ 8 milhões “numa conjuntura de absoluta incompatib­ilidade financeira, visto que sua renda declarada é de R$ 1.000”.

Amanda esteve na linha de frente da Timbalada entre 1999 e 2007, e dividiu os vocais com cantores como Ninha e Denny. Depois que deixou a banda, ainda seguiu por um tempo em carreira solo.

Logo após ser alvo de operação, no ano passado, disse em vídeo que iria provar a sua inocência.

“A minha família é inocente, eu sou inocente, minha mãe é inocente. Eu digo isso porque minha mãe já está numa preventiva há mais de um ano e já apresentam­os provas e perícias para provar a inocência dela e a minha impressão é a de que não estamos sendo ouvidos”, disse Amanda.

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Marcus Leoni/Folhapress Amanda Santiago, ex-vocalista da Timbalada e o designer de joias Carlos Rodeiro
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@amandasant­iagooficia­l

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