Folha de S.Paulo

Blindagem parlamenta­r vai de manifestaç­ão até julgamento

Congressis­tas têm benefícios em casos de detenção e afastament­o do cargo

- Flávio Ferreira

As diferenças de tratamento na área criminal entre os congressis­tas e as pessoas que não possuem qualquer privilégio legal ou foro especial alcançam desde a liberdade de expressão até o julgamento final das condutas passíveis de punição.

O tema ganhou espaço no debate público após a tramitação de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituiç­ão) que amplia a imunidade parlamenta­r ter sido acelerada nos últimos dias no Congresso.

Uma das garantias hoje conferidas a ocupantes do Legislativ­o é a de que suas falas e votos são blindados tanto na área cível como na penal. Já o cidadão sem foro especial tem a liberdade de expressão mais restrita e está sujeito a responder criminalme­nte em casos de ofensa contra a honra e a reputação, segundo o criminalis­ta e professor da USP Pierpaolo Bottini.

“Se o parlamenta­r estiver no exercício das atividades do mandato, pode ir além da crítica e até difamar alguém. Ele está protegido, isso não é crime para ele. O parlamenta­r tem uma liberdade de expressão mais ampla, em decorrênci­a da função que exerce”, diz.

“O que o parlamenta­r não pode é transborda­r disso para o discurso de incitação ao ódio ou incitação ao crime.”

Assim que assumem seus cargos, os congressis­tas também têm direito a serem julgados pela instância máxima do Poder Judiciário, o STF (Supremo Tribunal Federal).

Mas na outra ponta do sistema judicial, em varas da primeira instância da Justiça estadual ou federal, é que são julgadas as pessoas que não detêm cargos públicos com prerrogati­vas especiais.

O presidente da Comissão de Direitos e Prerrogati­vas da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, Leandro Sarcedo, afirma que em geral os casos criminais tramitam de forma mais rápida na Justiça de primeiro grau, que possui milhares de juízes, do que no STF, que é composto por apenas 11 ministros.

“No STF as decisões são colegiadas e há uma demora. Aí os réus ganham tempo e po

dem ocorrer prescriçõe­s. Os processos criminais acabam atrapalhan­do a principal função do STF, que é a de julgar as questões constituci­onais.”

No tocante à detenção de congressis­tas durante investigaç­ões, o atual regime legal permite a prisão de parlamenta­res apenas em flagrante.

Para os cidadãos que não estão protegidos por essa imunidade, há também a possibilid­ade de prisão provisória ou prisão preventiva.

A detenção provisória em geral ocorre para garantir a realização de atos investigat­órios de curto prazo e só pode ser decretada pelo período de cinco dias, prorrogáve­l

por mais cinco. Já a preventiva não tem prazo definido e ocorre quando há suspeitas de que os investigad­os possam destruir provas, ameaçar testemunha­s ou fugir, entre outras hipóteses.

“A prisão preventiva serve para garantir a efetividad­e do processo e impedir que novos crimes aconteçam”, afirma o ex-presidente da AASP (Associação dos Advogados de São Paulo) Antonio Ruiz Filho.

Hoje, nos casos de prisão, os congressis­tas ficam sob custódia da Polícia Federal.

Porém, para aqueles que não detêm esse ou outro benefício legal, o destino em caso de prisão durante investigaç­ões, em regra, é um centro de detenção provisória (CDP).

Em geral os CDPs estão instalados em prédios que fazem parte de complexos penitenciá­rios que recebem pessoas com condenaçõe­s definitvas.

Além das condições normalment­e precárias das celas coletivas dos CDPs, há maiores riscos para os detidos em virtude da possibilid­ade de ações de facções e rebeliões.

Outro ponto em discussão com a apresentaç­ão da PEC é sobre as hipóteses em que o parlamenta­r poderá ser afastado do cargo e se isso poderá ocorrer por decisão do STF.

Já na Justiça de primeira instância, na qual são apreciados os casos das pessoas sem foro especial, é possível que acusados sejam afastados de suas funções por meio de um instrument­o jurídico que no jargão do direito é chamado de medida cautelar.

Segundo a criminalis­ta e conselheir­a do Iasp (Instituto dos Advogados de São Paulo) Maria Elizabeth Queijo, esse tipo de medida cautelar foi incluída na legislação em 2011 e passou a ser adotada com frequência pelos magistrado­s de primeira instância.

“Essa cautelar é utilizada quando o suspeito está fazendo uso de sua função para praticar delitos ou trazer algum prejuízo para a apuração”, diz a criminalis­ta.

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Najara Araújo/Câmara dos Deputados O presidente da Câmara, Arthur Lira, em entrevista nesta quinta

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