Cala-boca público da CBF atrapalha o futebol nacional
Hernán Crespo fez seu primeiro jogo como treinador do São Paulo, na estreia do Campeonato Paulista, empate com o Botafogo-SP. Abel Ferreira disputou, em Porto Alegre, sua partida de número 35, em 115 dias na direção do Palmeiras. Dá um compromisso a cada três dias.
Crespo pretende misturar seu sistema com três zagueiros e mudar o time taticamente durante as partidas. Fazia isso no Defensa y Justicia, campeão da Copa SulAmericana. Do 3-5-2 de início, varia para 3-3-1-3, modelo em que jogou quando era dirigido por Marcelo Bielsa. Mas pode transformar num 4-4-2 no decorrer dos jogos. Isso requer treinamento.
Assim como Abel Ferreira já variou do seu usual sistema com dois volantes e três meias para jogar com linha de cinco defensores, contra o River Plate, na Argentina, ou com três atacantes, como na decisão contra o Grêmio, na noite deste domingo (28).
Não se muda o time taticamente de um jogo para outro sem treinar. E não se treina jogando a cada três dias.
Daí que a bronca pública do presidente da CBF, Rogério Caboclo, durante seu discurso do Prêmio Brasileirão, joga contra o desenvolvimento e a evolução do futebol do Brasil.
De que adianta trazer técnicos diferentes, com a ideia de fazer coisas novas, se virá um cala-boca público na primeira observação sobre disputarmos partidas demais no calendário brasileiro?
O Palmeiras fez, neste domingo à noite, sua partida de número 18 só em 2021. São 59 dias. Nesses dois meses, o Grêmio disputou 13 partidas, o São Paulo jogou 12 vezes, o Real Madrid disputou 11. e o Bayern, 14, porque viajou para o Mundial.
Há, sim, uma exceção: o Manchester City. O time de Guardiola lidera o Campeonato Inglês, jogou 17 vezes neste ano e ganhou todas.
Mas o City entrou em campo 54 vezes após a paralisação pela pandemia, desde 17 de junho. O Palmeiras disputou 63 partidas desde o retorno, em 22 de julho. Faz diferença nove jogos a mais em um mês a menos?
Há anos, os ingleses debatem por que têm o melhor campeonato do planeta, mas venceram apenas quatro Champions League neste século, contra nove dos espanhóis. Uma hipótese: joga-se muito na Inglaterra.
É uma faca de dois gumes. Há mais dinheiro de TV, menos tempo para treinar e mais cansaço na hora da decisão.
Rogério Caboclo não erra ao dizer que os clubes, em reuniões no início da pandemia, decidiram manter o calendário completo. Não abriram mão de nenhum contrato. Nisso, a decisão foi dos clubes, não da CBF... ou ao menos não da CBF sozinha.
Mas o debate proposto por Abel Ferreira faz todo o sentido. Não pode ser proibido apontar o dedo para o que pode ser melhor. Crespo trará novidades para o São Paulo, assim como Jorge Jesus trouxe para o Flamengo. Mas haverá altos e baixos. Se Jesus está por baixo no Benfica, por que Abel Ferreira não oscilaria no Palmeiras?
Os olhos estão voltados aos resultados do Palmeiras na decisão da Copa do Brasil e do São Paulo na tentativa de sair da fila no Paulista. Os técnicos estrangeiros estão aqui para ajudar. Não podem ser calados quando apontam o dedo para nossos erros.