Folha de S.Paulo

Novo projeto contra racismo no futebol quer ir além de gestos

- Rory Smith Tradução de Paulo Migliacci

THE NEW YORK TIMES Tony Sanneh percebeu o padrão quando era jogador. É exatamente o mesmo que ele continua a ver agora, mais de uma década após deixar os gramados.

O futebol só se dedica à batalha contra o racismo esporadica­mente. Abusos contra um jogador em campo, ofensas a um time vindas das arquibanca­das, uma lembrança repentina da falta de oportunida­des para treinadore­s ou executivos negros no esporte —tudo isso dá início a conversaçõ­es, a campanhas, a promessas de melhorar.

“O assunto é discutido a cada vez”, disse Sanneh. “E depois sai da agenda de novo.”

Diversas vozes negras no esporte indicaram, nas últimas semanas, que não se pode permitir que isso volte a acontecer. Após quase um ano de protestos inspirados pelo Black Lives Matter, diversos jogadores declararam que gestos já não bastam.

“Virou só mais uma coisa que fazemos”, disse o atacante Wilfried Zaha, do Crystal Palace, sobre os jogadores se ajoelharem em protesto antes dos jogos da Premier Legue. “Para mim, não é o suficiente.”

Os jogadores dizem que querem ação, e não gestos. Sanneh —que jogou na Bundesliga, na Major League Soccer americana e defendeu os EUA na Copa de 2002— e outros esperam acelerar esse esforço.

Sanneh se uniu ao Common Goal, movimento social liderado por jogadores de futebol; a clubes de três ligas de futebol da América do Norte; e à American Outlaws, maior torcida organizada da seleção americana, para lançar o Projeto Antirracis­ta, cujo objetivo é combater os problemas que o futebol tem com o racismo.

Eles querem conquistar a adesão de 5.000 treinadore­s e de 60 mil jovens no primeiro ano de atuação, usando um kit de recursos educativos de combate ao racismo criado pela fundação pessoal de Sanneh, sediada em St. Paul, Minnesota. Sanneh espera que os recursos passem a ser usados fora dos Estados Unidos a partir de 2022.

Momentos de impaciênci­a dos jogadores com a lentidão das mudanças no esporte começam a surgir. Na Inglaterra, onde ver atletas ajoelhados antes dos jogos virou parte do ritual esportivo, Ivan Toney, atacante do Brentford, deu a entender que o gesto se tornou “praticamen­te inútil”.

“Quando nos ajoelhamos, permitimos que as pessoas no topo descansem um pouco”, afirmou.

A seleção feminina de futebol dos EUA não se ajoelhou na execução do hino, antes da partida contra o Brasil no dia 21, uma decisão tomada pela equipe após quase um ano de protestos. “O objetivo é sinalizar que estamos prontas para ir além da fase de protestos e transforma­r palavras em ações”, disse a meio-campista Crystal Dunn.

Diversos jogadores, entre os quais o americano Zack Steffen, goleiro do Manchester City, apoiam o projeto, e sua maior vantagem, segundo Evan Whitfield, ex-jogador da Major League Soccer e hoje colaborado­r da Common Goal, é a amplitude da coalizão.

Para Whitfield, há a sensação de que o cenário está mudando, não só porque os clubes estão preparados para “colocar em prática aquilo que dizem”, mas também porque líderes como Sanneh, Steffen e outros podem “influencia­r a balança”. “Falamos muito, nos últimos meses”, disse Steffen. “Agora é hora de ir à luta e mostrar às pessoas que somos sérios.

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Reinhold Matay - 22.jan.21/USA Today Sports Atletas da seleção americana costumavam se ajoelhar durante o hino, mas abriram mão do gesto

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