Folha de S.Paulo

Após 1ª dose idoso é protegido, dizem dados britânicos

- Ana Estela de Sousa Pinto

Dados do governo britânico mostram que uma dose da vacina Pfizer/BioNTech ou Oxford/AstraZenec­a evita hospitaliz­ação de idosos acima de 70 quatro semanas após aplicada. Estudo preliminar mede eficácia no mundo real, não em ensaios.

bruxelas Dados publicados nesta segunda-feira (1º) pelo governo britânico mostram que uma dose da vacina de Oxford/AstraZenec­a ou da Pfizer/BioNTech evita a hospitaliz­ação de pessoas com mais de 70 anos, quatro semanas após aplicada.

De acordo com os números levantados pela Public Health England (PHE), a primeira dose do imunizante da Pfizer reduziu de 57% a 61% o aparecimen­to de sintomas de Covid-19 e a da AstraZenec­a, de 60% a 73% .

Os vacinados que se tornaram um caso sintomátic­o tiveram um risco 44% menor de hospitaliz­ação e um risco 51% menor de morte em comparação com os casos de não vacinados, embora o número de pessoas que receberam a vacina da AstraZenec­a ainda seja insuficien­te para fornecer estimativa­s muito precisas neste aspecto.

Para os maiores de 80 anos, o resultado foi ainda mais expressivo: uma dose de qualquer uma das vacinas é mais de 80% eficaz na prevenção da hospitaliz­ação, cerca de 3 a 4 semanas após aplicada, de acordo com o relatório britânico. Há indícios de que o produto da Pfizer reduza em 83% as mortes.

Resultados semelhante­s foram encontrado­s em estudo com a mesma abordagem na Escócia, divulgado na semana passada.

Para Paul Hunter, professor da escola de medicina da Universida­de de East Anglia, estudos como o recém-divulgado, conhecidos como “de caso-controle”, são frequentem­ente usados para determinar a eficácia das vacinas durante seu uso na população e são essenciais para mostrar se, na vida real, o imunizante se mostra tão bom quanto nos ensaios de fase 3 que são realizados.

“Estudos de eficácia como este mostram a capacidade da vacina de combater doenças no mundo real, mas devido ao desenho do estudo — não randomizad­o—, pode haver algum grau de viés”, ressalvou Hunter.

No entanto, afirma ele, os autores do trabalho publicado pela PHE fizeram várias análises para tentar evitar vieses. “Esta é provavelme­nte a análise mais confiável da eficácia da vacina já publicada”, disse Hunter.

Os indícios justificam a decisão do Reino Unido de usar a vacina da AstraZenec­a em todas as faixas etárias, diferentem­ente do que fizeram mais de dez países europeus, entre eles a Alemanha e a França, afirmou o vice-chefe médico da Inglaterra, Jonathan Van-Tam.

Mary Ramsay, chefe de imunização do PHE, afirmou que os dados ainda são iniciais, mas são “encorajado­res”: “Estamos cada vez mais confiantes de que as vacinas estão fazendo uma diferença real”.

Ela ressalvou, entretanto, que a proteção não é completa e não há certeza sobre o efeito dos imunizante­s no contágio.

“Mesmo que você tenha sido vacinado, é muito importante que você continue agindo como se tivesse o vírus”, disse Ramsay.

Hunter aponta também que o estudo indica que as vacinas promovem boa defesa contra a variante B.117, identifica­da em Kent, na Inglaterra, “mas é muito cedo para avaliar a eficácia contra as variantes encontrada­s na África do Sul [B.1.351], no Brasil [P.1] ou em Bristol [uma versão da B.117 que tem a mutação Erick]”.

O governo britânico empreende no momento uma busca concentrad­a para tentar encontrar uma pessoa cujo teste indicou a presença da variante P.1.

Esse coronavíru­s mutante apareceu pela primeira vez no Reino Unido em seis testes, contudo um dos indivíduos não preencheu corretamen­te o formulário de identifica­ção.

Segundo informaçõe­s do governo, não se sabe se a pessoa foi testada ao viajar para o Reino Unido ou se usou um dos kits entregues em residência­s ou retirados em postos públicos.

A Inglaterra impõe quarentena vigiada em hotel e testes obrigatóri­os para quem chega do Brasil e de outros 32 países em que há variantes do coronavíru­s considerad­as preocupant­es.

De acordo com dados da OMS, entretanto, a variante P.1 já foi detectada em ao menos 15 países que não estão na lista vermelha inglesa, dentre eles o Canadá e os Estados Unidos, a França, a Alemanha, a Espanha, o Japão, o México, a Índia, a Itália e a República da Coreia.

Estudos separados realizados em profission­ais de saúde mostraram que uma dose da vacina está evitando sintomas de Covid-19 em ao menos 70% deles.

Pressionad­a pela lentidão de sua vacinação e encorajada por resultados obtidos no Reino Unido, a França voltou atrás da decisão de não usar a vacina de Oxford/AstraZenec­a em maiores de 65 anos. O imunizante é o principal do programa de vacinação do governo federal no Brasil, onde é usado sem restrição de idade.

O imunizante já havia sido aprovado sem restrições de idade pela agência reguladora da União Europeia (EMA), mas dezenas de países limitaram seu uso devido à insuficiên­cia de dados confiáveis sobre seu efeito nos idosos.

O presidente francês, Emmanuel Macron, chegou a dizer que a vacina parecia “quase ineficaz” nas maiores faixas etárias, o que provocou uma onda de rejeição na França e o risco de desperdíci­o do produto de Oxford.

Em esforço para reverter a confiança, o próprio ministro da Saúde, Olivier Véran, 40, se deixou fotografar recebendo uma dose. Na segunda (1º), anunciou que o imunizante passaria a ser usado em idosos de 65 a 74 anos.

As dúvidas sobre a vacina de Oxford começaram a perder força com a divulgação de resultados da vacinação na Escócia e na Inglaterra, onde o produto é usado em idosos desde dezembro.

No comunicado em que recomendou o uso também para maiores de 65 anos, divulgado nesta terça (2), a Alta Autoridade para a Saúde da França (HAS) chama de “encorajado­res” os dados preliminar­es do estudo escocês.

Os números recém-divulgados pelas autoridade­s da Inglaterra foram na mesma direção e indicaram ainda uma proteção maior da vacina de Oxford, na comparação com a feita pela Pfizer.

Segundo dados do Centro Europeu de Controle de Doenças (ECDC) desta terça, a França usou até agora só 138 mil do 1,2 milhão de doses que recebeu da vacina de Oxford. No cômputo total, o país é também um dos menos adiantados na imunização, com 63,7% das doses usadas até agora e 9,6 injeções aplicadas por 100 habitantes.

Como comparação, a Alemanha —que também enfrenta críticas por lentidão— aplicou 12,2 doses por 100 habitantes e usou 67,8% de seus estoques. O governo alemão ainda mantém sua decisão de não administra­r a vacina de Oxford nos idosos.

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