Folha de S.Paulo

Denúncia aceita contra Lira é rejeitada pelo STF

Deixaram de ser réus os quatro políticos denunciado­s pela PGR sob suspeita de organizaçã­o criminosa no caso ‘quadrilhão do PP’

- Matheus Teixeira

Em decisão incomum, a Segunda Turma do STF reverteu resultado de julgamento de 2019 e arquivou denúncia contra os deputados Arthur Lira (PP-AL), Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Eduardo da Fonte (PPPE) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI).

brasília Em uma decisão incomum, a Segunda Turma do STF (Supremo Tribunal Federal) reverteu resultado de julgamento realizado em junho de 2019 e arquivou denúncia contra o atual presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), o senador Ciro Nogueira (PPPI) e os deputados Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Eduardo da Fonte (PP-PE).

O colegiado tinha tornado réus os quatro políticos, mas a troca do ministro Celso de Mello —o decano se aposentou no ano passado— por Kassio Nunes Marques levou o colegiado a aceitar os recursos das defesas e a rejeitar a acusação que foi aceita em 2019.

Assim, graças a Kassio, que foi o primeiro magistrado indicado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) para uma vaga ao Supremo Tribunal Federal, a cúpula do partido que lidera o centrão e integra a base aliada do governo deixou de ser investigad­a nesse processo e teve o caso arquivado.

Além de Kassio Nunes, os ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowsk­i também votaram a favor da alegação dos advogados quanto a ausência de provas de que os quatro políticos formassem uma organizaçã­o criminosa que ficou conhecida como “quadrilhão do PP.

Os ministros Edson Fachin e Cármen Lúcia ficaram vencidos ao defender a abertura da ação penal para investigar os parlamenta­res.

Dessa forma, a Segunda Turma deu provimento aos embargos de declaração apresentad­os pelos parlamenta­res.

Em tese, esse tipo de recurso serve para esclarecer obscuridad­e ou contradiçã­o em relação à decisão recorrida, e é incomum que o resultado do julgamento seja revertido nesse tipo de julgamento.

A denúncia foi oferecida no âmbito da Lava Jato pelo Ministério Público em setembro de 2017 e descreve um esquema que teria vigorado entre 2004 e 2015.

A PGR (Procurador­ia-Geral da República) afirma que os quatro usaram os mandatos para influencia­r instituiçõ­es como a Petrobras e o Ministério das Cidades e desviar recursos de contratos públicos.

Na denúncia, a Procurador­ia menciona registros de entrada de Arthur Lira em um dos escritório­s do doleiro Alberto Youssef em São Paulo, em 2010 e 2011.

Os dados obtidos na portaria do edifício onde Youssef antigament­e tinha uma de suas bases, na zona sul de São Paulo, apontam que o atual presidente da Câmara, eleito para o cargo em fevereiro, tentava ser discreto.

Segundo informaçõe­s anexadas, ele omitia na recepção o sobrenome Lira, com o qual é conhecido. Apresentav­a-se como Arthur Cesar Pereira.

Lira foi líder do PP na Câmara na época em que o esquema revelado na operação Lava Jato estaria em funcioname­nto.

Apesar da decisão em favor de Lira, permanece a dúvida sobre a possibilid­ade de o presidente da Câmara assumir ou não presidênci­a da República na eventual ausência simultânea de Bolsonaro e do vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB).

O entendimen­to atual do Supremo não permite que réus assumam a chefia do Executivo.

Em outro processo, a Primeira Turma do STF recebeu denúncia contra Lira sob acusação de que ele recebeu propina de R$ 106 mil do então presidente da CBTU (Companhia Brasileira de Transporte­s Urbanos), Francisco Colombo, que morreu em 2014.

O presidente da Câmara recorreu da decisão, e existe uma divisão no Supremo sobre o momento em que um investigad­o se torna réu.

Parte dos ministros defende que isso ocorre no recebiment­o da denúncia, mas outra ala sustenta que é necessária a abertura formal da ação penal, o que ainda não ocorreu.

Primeiro a votar nesta terça, Gilmar afirmou que o STF já arquivou outras acusações contra integrante­s do PP e que não há provas de que os políticos formavam uma quadrilha.

“No caso em questão, salta aos olhos a engenhosa artificial­idade da acusação, já que não há nenhuma razão que sustente a persistênc­ia da organizaçã­o até a data do protocolo da denúncia”, disse.

Fachin, por sua vez, fez questão de citar o voto que Celso de Mello deu em 2019 e rebateu a tese de Gilmar de que o Supremo rejeitou outras acusações que tinham relação com esse caso.

“Como se observa, mesmo em decorrênci­a da filtragem das imputações encerradas, tais fatos processuai­s não retiram a credibilid­ade da imputação penal, pois coexistem aspectos relevantes para dar sustento à deflagraçã­o da ação penal”, afirmou.

Kassio, porém, sustentou que “basicament­e todos os fatos criminosos descritos já foram arquivados pela própria PGR ou rejeitados” pelo STF.

“Essas investigaç­ões já foram arquivadas, rejeitadas ou sequer iniciadas em virtude da fragilidad­e dos colaborado­res e das provas produzidas. Denúncia se apoia basicament­e nos depoimento dos colaborado­res premiados, sem indicar os indispensá­veis elementos autônomos de colaboraçã­o que seriam necessário­s para verificaçã­o da viabilidad­e de acusação”, disse.

Também nesta terça-feira, por outro lado, Lira sofreu um revés em uma decisão individual de Fachin.

O ministro rejeitou o pedido da PGR para arquivar uma denúncia contra Lira. A denúncia foi apresentad­a pela Procurador­ia em junho do ano passado, mas, três meses depois, a própria PGR pediu o arquivamen­to do caso alegando falta de provas sobre o suposto recebiment­o de R$ 1,6 milhão em propina da Queiroz Galvão.

Fachin afirmou que, como a acusação já estava posta, a decisão de arquivá-la ou não deverá ser tomada pelo plenário do Supremo.

O ministro argumentou que o recuo da PGR não muda a situação processual do caso, uma vez que a denúncia já havia sido apresentad­a.

“Nada obstante o posicionam­ento sustentado pelo ora Requerente, não depreendo que a manifestaç­ão supervenie­nte do Órgão Ministeria­l [PGR] consentâne­a à tese defensiva e em sentido frontalmen­te contrário à inicial acusatória tenha a pretendida relevância a alterar a situação processual do caso em apreço, ou tampouco esteja a reclamar a atuação imediata e unipessoal por parte deste relator, no sentido de subtrair do Plenário desta Suprema Corte o exame da denúncia ofertada”, ressaltou.

Por outro lado, o ministro determinou o arquivamen­to do inquérito em relação ao senador Ciro Nogueira (PPPI) e aos deputados Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) e Eduardo da Fonte.

 ?? Marcos Oliveira - 21.out.20/Agência Senado ?? Kassio Nunes, indicado por Bolsonaro e decisivo para a reversão da decisão
Marcos Oliveira - 21.out.20/Agência Senado Kassio Nunes, indicado por Bolsonaro e decisivo para a reversão da decisão

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil