Alvos de massacre foram denunciados por fotos com armas
Citados eram acusados de associação ao tráfico, e não de homicídio e outros crimes descritos pela polícia do Rio
A operação policial que resultou em massacre na favela do Jacarezinho, na zona norte do Rio, na quinta (6), teve como alvos 21 réus sob acusação de associação ao tráfico, crime que tem pena de 3 a 10 anos de reclusão.
Eles foram denunciados com base em fotografias nas quais aparecem armados, publicadas em redes sociais.
A denúncia que motivou os mandados de prisão a serem cumpridos na ação não traz as acusações citadas pelo delegado Felipe Cury.
Responsável por descrever a investigação à imprensa, ele disse que se constataram crimes graves ligados ao tráfico, como homicídios, aliciamento de menores e sequestros de trens.
Mesmo antes da apuração da matança, o diretor de Departamento de Homicídios, Roberto Cardoso, afirmou que não houve execuções.
Na manhã de ontem, 16 corpos ainda não haviam sido periciados, segundo a OAB. Mais 3 civis morreram no hospital, elevando o total de vítimas a 28, das quais 1 agente.
rio de janeiro A ação nesta quinta-feira (6) na favela do Jacarezinho (zona norte), no Rio, teve como alvos 21 réus sob acusação de associação ao tráfico. A denúncia contra eles tem como base fotos publicadas em redes sociais em que aparecem armados.
Foi a operação mais letal da história do Rio de Janeiro, com 28 mortos. Apenas três eram alvos dos mandados de prisão expedido pela Justiça.
Os 21 citados na denúncia são réus por associação ao tráfico, crime cuja a pena varia de 3 a 10 anos de reclusão.
A denúncia que motivou os mandados de prisão a serem cumpridos na operação não menciona os crimes apontados pelo delegado Felipe Cury, diretor do Departamento Geral de Polícia Especializada, responsável por descrever a investigação à imprensa.
Em entrevista coletiva na quinta-feira, ele afirmou que a apuração mostrou crimes graves “conexos ao tráfico de drogas” como homicídios, aliciamento de menores, sequestros de composições da Supervia e roubos.
“A investigação não é o tráfico por si só. Há uma série de crimes conexos ao tráfico de drogas que precisam ser investigados. Investigamos o tráfico, mas no trabalho de inteligência descobrimos uma série de crimes que os traficantes realizam”, disse Cury.
O processo indicado pela Polícia Civil ao Ministério Público do Rio de Janeiro como objetivo da operação não descreve nenhuma das práticas descritas pelo delegado. Procurado para explicar a divergência, o órgão não respondeu até a conclusão desta edição.
As 36 páginas da denúncia apresentam fotos de 21 homens publicadas em redes sociais, com suas identificações completas.
Um é descrito como “vapor”, membro de baixo escalão do tráfico responsável pela distribuição e venda de drogas, e os 20 demais são apontados como “soldados”, como são denominados os integrantes das facções que fazem a vigilância das áreas em que o tráfico atua e fazem o primeiro enfrentamento à polícia.
Fotos de 4 dos 20 apontados como “soldados” do tráfico que constam na denúncia não apresentam qualquer armamento com eles. As contas nas redes sociais desses acusados estão suspensas, fechadas ou não existem mais. Um quinto acusado tem uma foto com um “emoticon” na frente, que impede a identificação total de seu rosto.
Os mandados de prisão expedidos a partir desta denúncia foram os objetivos relatados pela Polícia Civil ao Ministério Público para justificar a realização da operação no Jacarezinho, que terminou o dia com 25 mortes —um agente e 24 pessoas apontadas como criminosos pela polícia.
A justificativa apresentada à Promotoria é uma das exigências impostas pelo STF (Supremo Tribunal Federal) para a realização de operações policiais durante a pandemia.
De acordo com a polícia, três dos alvos da operação foram presos e outros três, mortos —esses têm idade que variam de 22 a 29 anos.
A denúncia contra os 21 acusados foi aceita no dia 28 de abril —data na qual o processo se tornou público— e os mandados de prisão expedidos. Uma das justificativas para a necessidade de prisão, segundo o MP-RJ, eram anotações nas folhas de antecedentes criminais dos acusados —documento não disponível para consulta até o momento.
Em nota, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro afirmou que a decisão que tornou os 21 acusados réus não determina a realização de operação policial para o cumprimento dos mandados de prisão.
“Na decisão, não há qualquer ordem ou autorização para realização de operação policial na comunidade”, afirma o Tribunal de Justiça.
O MP-RJ diz que foi informado às 9h de quinta sobre a realização da operação, indicando como justificativa o cumprimento dos mandados de prisão indicados no processo.
“A Polícia Civil apontou a extrema violência imposta por tal organização como um elemento ensejador da urgência e excepcionalidade para realização da operação, elencando a ‘prática reiterada do tráfico de drogas, inclusive com homicídios, constantes violações aos direitos fundamentais de crianças e adolescentes e demais moradores’. Indicou, por fim, a existência de informação de inteligência sobre local de guarda de armas de fogo e drogas”, diz a Promotoria, em nota.
O advogado Daniel Sarmento, um dos responsáveis pela ação no Supremo sobre as operações, afirmou que o MP-RJ tem feito uma execução burocrática do supervisionamento das operações policiais determinado pelo STF.
“O acompanhamento da medida cautelar do STF que fala em comunicação ao MPRJ vem sendo tratado de forma burocrática. Não se averigua efetivamente se aquelas operações deveriam ou não ocorrer”, afirmou o advogado.
“A medida cautelar poupou cerca de cem vidas por mês. A partir de outubro, isso passa a ser sistematicamente descumprido, porque a polícia percebeu que não havia controle. Esse é um caso extremo, mas temos uma violação sistemática. Não é pontual”, declarou Sarmento.
O Ministério Públcio afirmou que está atuando desde o momento em que tomou conhecimento da operação.
“Desde o conhecimento das primeiras notícias referentes à operação, o MP-RJ vem adotando todas as medidas para verificação das circunstâncias em que ocorreram as mortes. Ainda ontem, o MP-RJ se dirigiu à comunidade do Jacarezinho, por meio de três promotores de Justiça e três estruturas próprias distintas: o Grupo Temático Temporário (GTT) – Operações Policiais (ADPF 635-STF), a Coordenadoria-Geral de Segurança Pública e a Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI/MPRJ)”, afirmou a Promotoria, em nota.