Folha de S.Paulo

Eleições devem opor bolsonaris­mo raiz ao centrão

Em busca da reeleição, Bolsonaro deve ter palanques duplos e até triplos nos estados e disputa fratricida na base aliada do governo

- João Pedro Pitombo

“Em um partido pequeno e com filiação em cima da hora, o presidente terá menor capacidade de liderar uma frente nacional com ramificaçõ­es locais. O centrão não tem muita lealdade, ele que amarra o barco naquele porto que for o mais seguro Cláudio Couto cientista político

salvador A ampliação da base aliada do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) pode criar um cenário de palanques duplos e até triplos em seu apoio nos estados na eleição do próximo ano.

De um lado, o chamado bolsonaris­mo raiz —aquele que ascendeu junto com ele em 2018— briga para manter o seu protagonis­mo junto ao presidente e busca voos mais altos em 2022.

De outro, novos aliados de Bolsonaro, sobretudo do centrão, também miram governos estaduais.

O cenário de múltiplos palanques deve se consolidar em estados das regiões Norte e Sul do país, onde o presidente tem um eleitorado mais fiel, consolidan­do uma disputa fratricida dentro da base aliada.

Santa Catarina é um dos estados onde esta divisão aparece com maior clareza. A base bolsonaris­ta rachou após o afastament­o temporário do governador Carlos Moisés (PSL), eleito junto com Bolsonaro na onda conservado­ra de 2018, mas que respondeu a dois processos de impeachmen­t —se livrou de ambos.

A vice-governador­a Daniela Reinehr (sem partido) assumiu o governo provisório, rompeu com o governador e se aproximou de líderes do centrão como o senador Jorginho Mello (PL).

Pré-candidato ao Governo de Santa Catarina, Mello juntou-se à base aliada de Bolsonaro após a sua posse e ganhou os holofotes como um dos principais defensores do presidente na CPI da Covid.

Em alta no Planalto, o senador trouxe para perto de si um dos auxiliares mais próximos de Bolsonaro. O secretário nacional da Pesca, Jorge Seif, apelidado de 06 pela proximidad­e com o presidente, filou-se ao PL com planos de concorrer ao Senado.

Aliados de Carlos Moisés, que retornou ao cargo nesta sexta-feira (7) após ser absolvido no processo de impeachmen­t, dizem que ele se fortaleceu para disputa da reeleição. E dizem que o presidente deve apoiar a empreitada.

“É muito fácil a pessoa ir para o lado de um candidato que já é o presidente, como Bolsonaro é agora. Difícil é fazer o que a gente fez lá atrás. Apoiamos o presidente quando ninguém acreditava nele”, afirma Lucas Esmeraldin­o, secretário estadual de Articulaçã­o Nacional do governo Carlos Moisés.

Ele dispara contra Jorginho Mello, potencial adversário do governador, a quem classifica de fisiológic­o. “Ele apoiou Lula, Dilma e agora está com Bolsonaro. Ele está com que estiver no poder”.

Procurado, Mello não atendeu ao pedido de entrevista da Folha.

O cenário é parecido no Amazonas, outro estado onde o governador esteve nas cordas enfrentand­o um processo de impeachmen­t. Wilson Lima (PSC) deve buscar a reeleição em 2022 ancorado no presidente.

Lima chegou a ter embates com Bolsonaro no início da pandemia. Meses depois voltou a se alinhar com o presidente após enfrentar um pedido de impeachmen­t, que foi arquivado.

O governador não é o preferido da ala raiz do bolsonaris­mo, que impulsiona o exministro da Saúde Eduardo Pazuello (sem partido) como possível candidato a governador.

Principal nome ligado ao presidente no Amazonas, Coronel Menezes (sem partido) afirma que vai concorrer ao Senado. Ele não é aliado de Lima, mas não fecha as portas para o governador.

“Os dois primeiros anos do governador foram de aprendizad­o. Mas me parece que ele agora assumiu as rédeas do governo e está sinalizand­o uma aproximaçã­o com o presidente”, diz Menezes.

Dentre os partidos do centrão, o deputado federal Marcelo Ramos (PL) se movimenta para disputar o governo do Amazonas. Ele reuniu-se com o ex-presidente Lula (PT) em Brasília nesta quarta-feira (5).

No Pará, dois nomes se articulam para concorrer na base bolsonaris­ta contra o governador Helder Barbalho (MDB): o senador Zequinha Marinho (PSC) e o delegado da Polícia Federal Everaldo Eguchi (PSL).

Derrotado na disputa pela Prefeitura de Belém no ano

passado, Eguchi chegou ao segundo turno superando o candidato do governador, o deputado federal José Priante (MDB).

De olho na eleição do próximo ano, trocou o Patriota pelo PSL para entrar na disputa com uma estrutura mais robusta.

Eguchi afirma que a ideia é tentar evitar a fragmentaç­ão da base do presidente no estado: “Espero que toda oposição ao Barbalho esteja junta, se possível em uma grande coalização”, diz.

Em Rondônia, pode haver palanque triplo ou até quadruplo para o presidente. O governador Coronel Marcos Rocha (sem partido) disputará a reeleição amparado pelo bolsonaris­mo que o elegeu há três anos.

Rocha tem sido criticado por setores mais radicais do bolsonaris­mo por decretar medidas de restrição para conter a pandemia, mas tem recebido sinalizaçõ­es positivas do presidente.

Há cerca de um mês, foi recebido por Bolsonaro no Palácio do Planalto. Na sexta-feira (7), o presidente retribuiu a visita, indo ao estado inaugurar uma ponte entre os estados de Rondônia e Acre.

O governador aproveitou a visita para afagá-lo: “Sou fiel ao senhor como poucos”, disse Marcos Rocha em discurso, tendo na plateia um de seus potenciais adversário­s no próximo ano, o senador Marcos Rogério (DEM).

Membro da CPI da Covid, Rogério tem sido um dos anteparos do presidente na investigaç­ão conduzida pelo Senado e tenta se capitaliza­r junto a grupos bolsonaris­tas como candidato ao governo.

Além do governador e senador, o empresário e pecuarista Jaime Bagattoli (PSL) também se movimenta para disputar o governo, assim como o ex-governador Ivo Cassol (PP).

Este último, contudo, enfrenta pendências judiciais: foi condenado em 2018 por fraude em licitações e está inelegível.

Dentre os estados do Nordeste, Maranhão e Paraíba podem ter palanque duplo para Bolsonaro.

No primeiro, o deputado federal Josimar de Maranhãozi­nho (PL) se aproximou do presidente e diz ser pré-candidato ao governo.

Na ala raiz, contudo, o prefeito de São Pedro dos Crentes, Lahesio Bonfim (PSL), e a prefeita de Lago da Pedra, Maura Jorge (PSDB) também podem disputar o cargo como representa­ntes do bolsonaris­mo.

Na Paraíba, o ex-prefeito de Campina Grande Romero Rodrigues (PSD) desponta como pré-candidato aliado do presidente, mas pode ter pela frente uma coalizão bolsonaris­ta que sairá da união entre o delegado Wallber Virgolino (Patriota) e o radialista Nilvan Ferreira (MDB).

O cientista político Cláudio Couto, professor da FGV Eaesp (Escola de Administra­ção de Empresas de São Paulo, da Fundação Getulio Vargas), afirma que os palanques estaduais de Bolsonaro devem ser marcados pela fragmentaç­ão, repetindo o cenário da eleição municipal de 2020.

Sem um partido com estrutura sólida, diz Couto, o presidente terá dificuldad­e em construir uma coordenaçã­o nacional, impor alianças regionais e unir candidatos em um único palanque nos estados.

“Em 2020 foi um baratavoa. E acredito que isso deve se repetir no próximo ano. Em um partido pequeno e com filiação em cima da hora, o presidente terá menor capacidade de liderar uma frente nacional com ramificaçõ­es locais”, avalia.

As disputas entre bolsonaris­tas e centrão podem gerar faíscas em alguns estados, com partidos como PP e PL migrando para uma terceira via ou até mesmo para o campo lulista.

“O centrão não tem muita lealdade, ele que amarra o barco naquele porto que for o mais seguro”, diz Couto.

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Pedro Ladeira/Folhapress Presidente Jair Bolsonaro participa de passeio de moto com centenas de motociclis­tas em Brasília neste domingo (8); leia mais na pág. A6
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