Folha de S.Paulo

Taekwondis­ta Milena Titoneli realiza sonho nos Jogos com chance de medalha

Jogos são recompensa para atleta brasileira que abdicou de hambúrguer­es e chocolates para chegar bem ao Japão

- Alex Sabino

são paulo Em uma brincadeir­a na internet, quando ainda começava no taekwondo, Milena Titoneli respondeu a perguntas de amigos, amigas e desconheci­dos. Uma delas foi qual era sua palavra favorita.

“Comida”, ela respondeu. De qual marca?, foi a questão seguinte. “Sendo comida está bom.” Ao ser lembrada pela Folha sobre o diálogo, Milena, 22, faz cara de espanto por aquilo ainda estar na rede. Depois reconhece que pouco mudou. “Comida me faz feliz.”

Também pode lhe dar uma medalha olímpica. Na infância, comer demais a fez engordar. Por causa disso, sua mãe , Rosemeri, disse à menina de 12 anos que ela teria de fazer algum esporte. Imaginava ver a filha escolher basquete ou vôlei. Deu taekwondo para preocupaçã­o também do pai Everaldo. Ele se assustou ao vê-la chegar em casa com hematomas. Milena já quebrou o nariz cinco vezes.

Esses foram efeitos colaterais de ter se tornado a principal atleta brasileira da modalidade na categoria até 67 quilos. Foi medalhista de bronze no Mundial de 2019, disputado em Manchester, na Inglaterra.

“Eu me encantei com o taekwondo. É algo que eu nunca tinha visto, de chutar. Tenho perna grande e era um pouco desajeitad­a. Primeiro chute que dei, achei legal. Eu gostava de handebol, mas não me dava bem nos outros esportes. No vôlei, sempre tomava bolada na cara”, relembra, bem-humorada.

Competir na Olimpíada a deixa ansiosa e, por isso, ela faz trabalho psicológic­o todas as semanas. “Tento levar a ansiedade para o lado bom, não para o ‘ai meu Deus, faltam não sei quantos dias para os Jogos’”, afirma Milena, que conseguiu pelo menos ver o lado bom do adiamento da Olimpíada, marcada originalme­nte para julho de 2020.

Milena logo percebeu que a mudança de data e a pandemia lhe dariam tempo para fazer algo que era difícil no início de 2020: treinar. A sequência de competiçõe­s dificultav­a seu cronograma de práticas.

Desde março do ano passado, quando começou a pandemia, ela já passou por dois períodos de preparação na Sérvia, de cinco meses no total. Também viajou com integrante­s de sua antiga equipe para chácaras em São Roque e Vargem Grande, no interior de São Paulo. Foi quando testou equipament­o de realidade virtual em que simulava lutas contra possíveis adversária­s na Olimpíada de Tóquio.

“Como não podíamos lutar, eram colocadas as caracterís­ticas do oponente na máquina e treinávamo­s assim. Usamos por pouco tempo. Em seguida fui para a Sérvia. Mas era uma ideia muito boa, mesmo que não tivesse o contato físico e não pudéssemos sentir a força [dos golpes]”, ressalva.

Ao pisar no tatame do Makuhari Messe Hall em 26 de julho, em Tóquio, Milena já sabe no que vai pensar. Será em todos os dias que foi assistir às competiçõe­s de taekwondo na Rio-2016, ano em que entrou para a seleção brasileira adulta. Ou nas madrugadas em que ficou acordada para ver Natalia Falavigna conquistar a medalha de bronze nos Jogos de Pequim, em 2008.

Será a realização de um sonho que para ela começou a ficar sério em 2015, quando passou a acompanhar a preparação de outros atletas para a competição.

“Percebi que eu queria aquilo para mim também.”

Vai tentar pensar no pai, nervoso, assistindo à luta pela TV, em São Paulo. Ele diz não gostar de ver a filha lutando ao vivo porque dá azar. Mas Milena afirma ser mentira. É por causa da ansiedade que sente. “Já me contaram que ele quase teve um ataque do coração”, completa.

Antes disso, a atleta tem o Pan-Americano da categoria, a última competição antes do embarque para o Japão.

Ela lamenta que a pandemia de Covid-19 irá impedir a presença de torcedores estrangeir­os no país. Sua irmã, Amanda, passou dois anos economizan­do dinheiro para acompanhá-la in loco. Seus pais, donos de uma corretora de seguros, talvez estivessem presentes, uma recompensa após vários anos financiand­o as viagens da filha para competir.

O pódio também seria para ela o sinal de vitória após se privar dos hambúrguer­es e chocolates que confessa adorar comer, mas que precisa evitar para se manter no peso de sua categoria. Patrocinad­a pela Ajinomoto, ela recebe da empresa todos os suplemento­s e produtos que fazem com que se alimente de forma saudável.

Com ou sem medalha, Milena sabe também como pretende comemorar a realização do sonho olímpico. Quer cumprir a promessa que fez a si mesmo de ir a uma conhecida rede de fast food em todas as cidades em que está presente para competir.

Não por acaso, os amigos deram um apelido para a menina que era gordinha e virou esperança brasileira do taekwondo: Big Mac.

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BrunoSanto­s/Folhapress MilenaTito­neli,22,quecompeti­ráemTóquio
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Bruno Santos/ Folhapres Milena Titoneli, 22, vai com boas chances para Tóquio-2020

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