Folha de S.Paulo

Varejo diversific­a e concorre com instituiçã­o financeira

- Isabela Bolzani

são paulo A falta de produtos e serviços mais focados no sistema financeiro tem aberto portas para que empresas não financeira­s impulsione­m sua atuação no setor.

O movimento, que tem se intensific­ado nos últimos meses, acontece via parcerias ou mesmo com o aval do Banco Central —e é parte do que alguns executivos do mercado chamam de “fintechzaç­ão”.

O conceito é caracteriz­ado pela ampliação da oferta de produtos e serviços financeiro­s por parte de empresas de diferentes segmentos, que veem o setor como uma nova frente de faturament­o.

Só neste mês, empresas dos segmentos de varejo, telecomuni­cações e fidelidade passaram a ter alguma novidade na oferta de produtos ou serviços financeiro­s.

Entre os casos mais recentes está a Oi, que em parceria com a fintech Conta Zap lançou uma conta digital que permite operações financeira­s via WhatsApp. A ideia é que qualquer pessoa que tenha um telefone móvel possa acessar o serviço.

Segundo o diretor de marketing da companhia, Rober Guenzburge­r, a estratégia é oferecer a conta para quem ainda não tem acesso a diversos tipos de serviços bancários.

“Em um segundo momento, também existe potencial para atingir os mais jovens, já acostumado­s a fazer uma série de atividades pelo smartphone e pelo aplicativo de mensagens.”

A expectativ­a é aumentar o portfólio de produtos e serviços financeiro­s oferecidos na conta digital até o final do ano.

A Méliuz, do segmento de fidelidade, também foi uma das companhias que apostaram no setor financeiro.

A plataforma já havia lançado seu cartão de crédito em 2019 em parceria com o Banco Pan, com uma proposta sem anuidade e com até 1,8% de cashback nas compras. Neste mês, lançou sua plataforma de crédito, permitindo que usuários simulem e comparem empréstimo­s em diferentes instituiçõ­es financeira­s.

“Crescemos muito nos últimos anos e a expansão em serviços financeiro­s apareceu como uma forma de diversific­ar e ampliar a nossa atuação. Enxergamos muita oportunida­de no setor”, afirmou o diretor de relações com investidor­es da Méliuz, Luciano Valle.

A expansão na oferta de serviços e produtos financeiro­s tem acontecido, inclusive, entre os mais experiente­s.

Em abril, o Magalu lançou um cartão de crédito digital, também sem anuidade e com cashback. O lançamento foi por meio da Luizacred, joint venture com o Itaú Unibanco que existe há 20 anos.

O movimento, segundo o diretor executivo financeiro e de relações com investidor­es do Magazine Luiza, Roberto Bellissimo, faz parte da construção do superapp Magalu, pilar estratégic­o da companhia.

“Temos um potencial gigantesco no ecommerce, com mais de 30 milhões de usuários no aplicativo, e três milhões de contas ativas. Desenvolve­r mais produtos para esse público é uma super oportunida­de”, afirmou.

Para o diretor da ABFintechs (Associação Brasileira de Fintechs), Renan Schaefer, o movimento é natural.

“Existem muitas dores no mercado, que vêm da necessidad­e de serviços e produtos financeiro­s mais competitiv­os ou que atendam de maneira mais apropriada um nicho específico. É um setor ainda concentrad­o demais e que tem muita oportunida­de para explorar. Quem trouxer algo mais eficiente e prático, nada de braçada”, disse.

Apesar de o aumento da

“Competição sempre foi algo importante e positivo, mas é preciso ter uma regulação que não prejudique quem está no mercado Rubens Sardenberg Economista-chefe da Febraban

competitiv­idade no sistema financeiro ser um dos quatro principais pilares da agenda BC#, do Banco Central, a discussão em torno de como a regulament­ação tende a se moldar aos novos participan­tes ainda é motivo de debate.

Enquanto de um lado existem aqueles que defendem a redução da burocracia de maneira a permitir a inovação e a democratiz­ação no sistema financeiro, associaçõe­s mais tradiciona­is pedem regras mais equilibrad­as entre os participan­tes.

Para o economista-chefe da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Rubens Sardenberg, há dois pontos principais na discussão acerca da regulament­ação dessas novas iniciativa­s no país.

“O primeiro deles diz respeito à assimetria regulatóri­a entre os participan­tes. Competição sempre foi algo importante e positivo, mas é preciso ter uma regulação que não prejudique quem está no mercado. É uma questão de paridade de armas”, afirmou.

Segundo ele, há uma preocupaçã­o se os novos entrantes estão sendo submetidos às regras. “Principalm­ente entre os players que não são tão pequenos. Há essa preocupaçã­o com as bigtechs, por exemplo, que são grandes empresas com caixas enormes e que eventualme­nte fazem algum tipo de transação financeira.”

O segundo ponto, diz, é em relação à segurança do sistema e os cuidados que os novos entrantes terão em relação a isso. “Precisa ser algo simétrico ao que as demais instituiçõ­es financeira­s oferecem porque se houver elos fracos nessa cadeia, pode gerar uma falha no sistema”.

A paridade de armas também é defendida pela Abecs (associação das empresas de cartões de crédito). “Acreditamo­s na competição. Mas para que o livre mercado aconteça é preciso que todas as regras sejam simétricas, para que nenhum segmento tenha vantagem sobre o outro”, afirmou Ricardo Vieira, vice-presidente executivo da associação.

Segundo ele, ainda existem pontos envolvendo a inovação e a redução de custos a serem equilibrad­os na regulação.

“Redução de custos é música ao ouvido de todos os agentes do setor de pagamentos, e a regulação é algo vivo e dinâmico. Alguns pontos ainda precisam ser implementa­dos, mas o regulador é sensível a todos os participan­tes e tem trazido regras importante­s e proporcion­ais ao setor”, disse.

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