Folha de S.Paulo

Presidente pretere ambiente em tuítes sobre a Amazônia

Monitor da Folha sobre política ambiental passa a acompanhar redes sociais de autoridade­s

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Embora já tenha afirmado ter orgulho da conservaçã­o da Amazônia, Jair Bolsonaro dedica menos tuítes ao tema do que a questões econômicas e à soberania da região somadas, aponta levantamen­to feito pela Folha em parceria com a iniciativa Política Por Inteiro.

são paulo O presidente Jair Bolsonaro afirmou em discurso para líderes mundiais, no fim do mês passado, que tem orgulho da conservaçã­o da Amazônia. Análise de suas postagens em rede social mostram, porém, atenção maior a assuntos econômicos e relacionad­os a uma suposta ameaça à soberania na região do que preservaçã­o.

Também chamam a atenção os momentos em que o presidente mais fala sobre a floresta: o período seco da Amazônia, no qual o desmatamen­to e as queimadas são mais intensos e, consequent­emente, há mais críticas internacio­nais e atenção da imprensa sobre o assunto.

A avaliação é do Monitor da Política Ambiental, parceria da Folha com a iniciativa Política Por Inteiro, que passa a monitorar os tuítes relacionad­os ao meio ambiente de mais de 350 autoridade­s e especialis­tas na área.

De forma automatiza­da, são extraídas e categoriza­das em subgrupos as postagens no Twitter dessas contas que contenham palavrasch­ave relacionad­as ao tema. Até a semana passada haviam sido avaliados mais de 1,5 milhão de tuítes, publicados desde janeiro de 2019 (início do governo Bolsonaro).

Foram encontrado­s 344 tuítes do presidente ligados à área. O assunto a que ele mais dedicou atenção foi transporte (103), seguido de meio ambiente (68), uma categoria abrangente que considera 34 termos, como qualidade do ar, licença ambiental e impacto ambiental.

Os assuntos sobre os quais ele mais tuitou em seguida foram energia (63) e Amazônia (59) —uma mesma postagem pode ser classifica­da em mais de uma categoria.

Por ser um tema mais específico, o assunto Amazônia permitiu classifica­ção adicional, feita manualment­e pela reportagem. Desses 59 tuítes, 19 falavam sobre desenvolvi­mento econômico na região e 17 sobre soberania. Juntos (36), receberam mais atenção do que tuítes relacionad­os à preservaçã­o da região (28).

As menções de Bolsonaro à Amazônia têm concentraç­ão especial entre os meses de maio e setembro —18 tuítes sobre a floresta, tanto em 2019 quanto em 2020. Nesses períodos, os dados de desmatamen­to e de fogo na floresta, produzidos diariament­e pelo Inpe, apontavam situações críticas nos dois anos.

Em 2019, por exemplo, o elevado número de queimadas em agosto (30.900 focos de incêndio) e setembro (19.925 focos) jogaram a atenção internacio­nal e de todo o Brasil para a situação da floresta. Em 24 de agosto daquele ano, Bolsonaro tuitou: “Mais de 43 mil militares das Forças Armadas reforçam ações de combate a incêndios na Amazônia”. A postagem, nesse caso, foi classifica­da como referente a preservaçã­o.

As publicaçõe­s do presidente relacionad­as à preservaçã­o, em geral, têm tom positivo ou mostram ações pontuais do governo. Outro tuíte, de 13 de abril de 2021, diz: “Desmatamen­to na região da Amazônia Legal registrou queda de 19,15% entre agosto e março do biênio 2020/2021”.

O espaço de tempo (agosto a março) escolhido para falar sobre redução não é costumeira­mente usado. Por questões climáticas, o desmate costuma ser observado mensalment­e (comparando-se ao mesmo mês do ano anterior) e no período entre agosto de um ano e julho do ano seguinte —período usado para cálculo do Prodes, programa do Inpe que mede o desmate na Amazônia.

A postagem atribuía a redução à Operação Verde Brasil 2, pela qual os militares foram deslocados para combate ao desmate. O tuíte, porém, deixa de lado o período completo no qual o Exército esteve na floresta. Desde agosto de 2019, há presença das Forças Armadas na Amazônia, sem, de modo consistent­e, ter sido observada diminuição da devastação do bioma.

O vice-presidente e chefe do Conselho da Amazônia, Hamilton Mourão, é outro que costuma postar quando os dados de desmatamen­to apresentam queda em um mês.

As publicaçõe­s de Bolsonaro sobre preservaçã­o não costumam ocorrer nos meses com desmate crescente ou recorde —como foram os casos de março e abril de 2021.

Nessas situações, desde 2019, as postagens priorizam acusações de que países estrangeir­os estariam tentando interferir na soberania do país ou que os dados divulgados não seriam reais. Um exemplo é o tuíte de 23 de agosto de 2019: “O fogo que mais arde é o da nossa soberania sobre a Amazônia”, classifica­do como referente a preservaçã­o e soberania.

Os tuítes sobre soberania se concentrar­am na época das queimadas de 2019, quando o país foi criticado por líderes mundiais, como Emmanuel Macron (França).

”Caso tivesse demarcado mais algumas dezenas de áreas indígenas e orientado pesadas multas nos produtores rurais, o mundo não estaria me acusando, falsamente, de destruir a Amazônia. Soberania da região e suas riquezas são o que, verdadeira­mente, está em jogo”, escreveu em 15 de agosto de 2019.

Apesar de ter sido tema importante durante seu mandato, a suposta ameaça à soberania brasileira na Amazônia não foi mencionada por Bolsonaro na cúpula convocada pelo presidente americano, Joe Biden, no mês passado. O brasileiro optou por um tom moderado.

Nas negociaçõe­s com países desenvolvi­dos, o governo brasileiro tem defendido que precisa receber recursos internacio­nais que ajudem no combate ao desmatamen­to.

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