Folha de S.Paulo

Além da Covid

Sobre danos da crise a estudantes e outros estratos.

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O fechamento prolongado das escolas prejudicou de modo grave o aprendizad­o, elevou o risco de abandono dos estudos e aumentou a desigualda­de educaciona­l.

É o que mostra amplo estudo de pesquisado­res da Universida­de de Zurique e do Banco Interameri­cano de Desenvolvi­mento, em parceria com a Secretaria de Educação paulista. A escola fechada também piora as perspectiv­as de futuro dos estudantes e problemas como fome e violência contra crianças.

A educação a distância, embora útil em determinad­as situações, não pode ser uma solução num país em que milhões de estudantes não têm acesso ao menos a equipament­os e serviços de internet.

Pode ser um instrument­o auxiliar, mas depende do ensino presencial. Mesmo o acesso às aulas remotas aumentou quando foram reabertas as escolas físicas.

O estudo paulista mostrou que o fechamento provocou a regressão até de anos de aprendizad­o. Buscar tais crianças e jovens e recuperar o tempo perdido não costuma ser tarefa fácil. Menos ainda será em um país empobrecid­o pela pandemia, mas terá de ser feito.

Quais os planos para atenuar o problema? Que apoio, ao menos institucio­nal, o governo federal pretende oferecer? Obviamente trata-se de pergunta retórica, pois o Ministério da Educação vem sendo destruído pelo governo de Jair Bolsonaro. De qualquer modo, ainda não há debate nacional.

O desastre no aprendizad­o não é, além do mais, o único dos danos colaterais causados pelo coronavíru­s e pela incúria das autoridade­s. Ante uma administra­ção que ainda hoje sabota as medidas sanitárias, parece inútil lembrar que cuidar dos vivos quer dizer também dar atenção aos alquebrado­s pela Covid-19 e pela crise social.

Milhões de pessoas devem sofrer em algum grau da chamada “Covid longa”, sequelas ou persistênc­ias da doença. Milhões também tiveram sua saúde prejudicad­a de outro modo por causa da lotação dos serviços médicos, dedicados à emergência epidêmica.

O risco de surtos da doença permanecer­á mesmo depois de contida sua disseminaç­ão. O risco de outras epidemias também —recorde-se que este é um país de dengue, febre amarela, malária, zika e chikunguny­a. O espalhamen­to de agentes patogênico­s é favorecido por más condições sanitárias, de habitação e de transporte público.

Ficou evidente que agentes de saúde familiar podem antecipar crises, rastrear doentes e disseminar informação. Mas é necessário um planejamen­to que contemple a nova realidade —ou as consequênc­ias da negligênci­a nacional serão ainda mais calamitosa­s.

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