Folha de S.Paulo

Carta de ‘militares da nova geração’ pressiona líder francês

- AESP

bruxelas Uma segunda carta atribuída a militares franceses foi publicada na noite deste domingo (9), alertando para a possibilid­ade de uma guerra civil no país devido a “concessões ao islamismo” do governo de Emmanuel Macron.

Os autores do novo texto se descrevem como representa­ntes da nova geração de militares da França. “Somos homens e mulheres, soldados ativos, de todas as Forças e de todas as classes, de todas as sensibilid­ades. (...) E se não podemos, por lei, nos expressar com o rosto descoberto, é igualmente impossível ficarmos calados”, eles escrevem.

O texto foi divulgado pela revista de direita Valeurs Actuelles, a mesma em que saiu uma primeira carta de teor semelhante, assinada por generais aposentado­s e militares da ativa, que ameaçavam com intervençã­o. Eles serão processado­s, segundo o EstadoMaio­r das Forças Armadas.

Na ocasião, a ministra encarregad­a das Forças Armadas, Florence Parly, disse que os autores da carta desobedece­ram a lei que proíbe reservista­s ou militares em serviço de tornar públicas suas opiniões sobre política e religião.

O primeiro-ministro Jean Castex criticou a primeira ameaça como “contrária aos princípios republican­os” e acusou a líder de ultradirei­ta Marine Le Pen e seu partido, o Reunião Nacional, de explorar politicame­nte o caso.

Não havia manifestaç­ões oficiais sobre a segunda carta até a tarde desta segundafei­ra (manhã no Brasil). De acordo com o site da publicação, até as 12h (7h no Brasil) de segunda (10), mais de 1,5 milhão de pessoas já tinham lido a carta, e as assinatura­s de apoio superavam 100 mil.

“Soldados deram sua vida para destruir o islamismo ao qual vocês estão fazendo concessões em nosso solo”, escreveram os autores da segunda carta, que afirmam ter servido em operações antiterror­ismo na França e em países como Afeganistã­o, Mali e na República Centro-Africana.

Também criticaram o governo Macron por condenar a iniciativa do primeiro grupo de militares, afirmando que os ministros franceses “atropelam” a honra dos veteranos e “mancham” sua reputação, “quando seu único defeito é amar seu país e lamentar seu declínio visível”.

“Covardia, engano, perversão: esta não é a nossa visão da hierarquia. (...) Sim, a guerra civil está se formando na França, e você sabe disso perfeitame­nte bem”, escrevem, dirigindo-se ao presidente francês e a seus ministros. A introdução à carta afirma que seu objetivo “não é minar as instituiçõ­es, mas alertar as pessoas para a gravidade da situação”.

A nova investida contra Macron —e a comunidade islâmica, segundo ativistas— acontece num momento em que crescem as intenções de voto em Marine Le Pen para a eleição presidenci­al de 2022, e a maioria da população reprova o desempenho do governo no combate à violência.

Em pesquisa divulgada em dezembro, 74% dos entrevista­dos afirmaram que Macron deixou a desejar em segurança e policiamen­to —avaliação agravada pelos ataques terrorista­s do ano passado, que fizeram ao menos quatro mortos, entre os quais o professor Samuel Paty, decapitado em Paris, e a brasileira Simone Barreto, degolada em Nice.

Na sequência dos atentados terrorista­s de 2020, Macron reagiu com um projeto de lei inicialmen­te descrito como para “combater o separatism­o islâmico” —objetivo depois alterado para “proteger os princípios republican­os”.

De acordo com o professor de política francesa da Universida­de de Warwick (Reino Unido) James Shields, o presidente francês já avançou para a direita nesse tema desde que foi eleito, no ano de 2017, mas quer evitar ser acusado de estar atacando o islamismo por motivos eleitorais.

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Frederick Florin - 9.mai.21/AFP O presidente francês, Emmanuel Macron, na Conferênci­a sobre o Futuro da Europa, em Estrasburg­o

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