Folha de S.Paulo

Comissão já admite fatiar reforma tributária após intervençã­o de Lira

Deputado pôs fim a colegiado especial da Câmara e passou a argumentar que o misto era arranjo regimental para dar celeridade

- Washington Luiz, Danielle Brant e Fábio Pupo

brasília A decisão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), de intervir nas discussões da reforma tributária levou integrante­s da comissão mista voltada ao tema, afetados pelas mudanças, a já admitir o fatiamento das mudanças.

Lira comunicou na terça-feira (4) o fim da comissão especial que analisava a PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) do deputado Baleia Rossi (MDB-SP). O texto propõe uma fusão ampla de impostos (com tributos federais, o estadual ICMS e o municipal ISS).

Essa proposta, com a PEC 110, do Senado, e o projeto sobre a fusão do PIS e Cofins, enviado pelo governo, formavam a base do relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), lido no mesmo dia.

Além de anunciar o fim do colegiado da Câmara, Lira passou a argumentar que a comissão mista era um arranjo feito em 2020 para dar celeridade ao texto.

Nesta segunda (10), em entrevista à Rádio Bandeirant­es, voltou a minimizar a importânci­a do colegiado. “Regimental­mente, ela não tem validade. Ela não tem efetividad­e no que analisa, porque não existe na previsão regimental nem da Câmara, nem do Senado, nem do Congresso.”

Diante do discurso do deputado e de sua defesa de uma reforma fatiada e dividida entre Câmara e Senado, integrante­s da comissão mista passaram a reconhecer que as mudanças podem ser fracionada­s.

Na manhã desta quarta(12), o colegiado deve se reunir para definir os rumos do relatório apresentad­o por Aguinaldo, que recebeu emendas de congressis­tas nos últimos dias.

“Vamos cumprir nosso papel na comissão mista. O relatório final será lido. Em seguida, a gente vai discutir o procedimen­to: se começa na Câmara, no Senado, se vai ser fatiada”, disse o presidente da comissão, senador Roberto Rocha (PSDB-MA).

Na avaliação de senadores que integram o colegiado, mesmo sem ser a forma ideal, a reforma fatiada, como quer o governo, será a única maneira de votar o tema neste ano.

Para Simone Tebet (MDBMS), o governo não aceitaria uma proposta de fusão ampla de impostos cobrados hoje por União, estados e municípios sem a contrapart­ida de criar um novo tributo nos moldes da antiga CPMF.

“Torço, claro, para que a reforma tributária seja a mais abrangente possível, mas sou pragmática. Uma reforma ampla exigiria a criação de um fundo constituci­onal para repor as perdas dos estados e municípios, e o governo não vai aceitar isso sem a criação de um novo imposto”, afirmou.

“Nenhum parlamenta­r vai aprovar uma nova CPMF a um ano da eleição. Vamos acabar tendo que entender o momento e fazer essa reforma fatiada, ampliando-a o máximo que pudermos”, disse.

Os integrante­s da comissão também disseram acreditar que Câmara e Senado deverão fechar um acordo para dividir a reforma entre as duas Casas.

“Claro que o presidente da Câmara tem o poder de colocar a matéria em tramitação, mas eu acredito que isso vai resultar na necessidad­e de um diálogo entre o presidente [do Senado] Rodrigo Pacheco [DEM-MG] e o presidente Lira. Eles sabem a importânci­a que isso representa para o país. Isso será resolvido”, disse o senador Wellington Fagundes (PL-MT).

Pacheco defende a conclusão dos trabalhos da comissão mista, mas já admitiu a possibilid­ade de a reforma ser fatiada.

“Se será uma parte na Câmara, uma parte no Senado, se isso será fatiado [...], essa é uma negociação política que será feita entre Câmara dos Deputados e Senado”, afirmou Pacheco na quinta-feira (6).

Nesta segunda, Pacheco e Guedes se reuniram. O ministro vinha desde a semana passada buscando uma aproximaçã­o com o presidente do Senado com objetivo de fazer andar tanto a reforma tributária como a administra­tiva.

A equipe econômica aguardava o acerto no Congresso sobre como proceder. As declaraçõe­s recentes do comando do Congresso apontam agora para uma reforma fatiada em várias frentes.

Mais cedo, Lira negou novamente qualquer disputa com o Senado para decidir por onde o texto começa a tramitar.

“Nós temos um compromiss­o de votar e botar para votação uma reforma tributária possível”, defendeu. “Nós não podemos ficar enganchado­s em CPFs, pai da reforma de um lado, tio da reforma do outro. Nós não temos absolutame­nte esse compromiss­o.”

O presidente da Câmara afirmou ainda que vai se reunir com Pacheco nesta semana para definir o assunto.

Ele vê a reforma em duas partes principais: consumo e renda. Está em suas previsões a fusão de PIS e Cofins na CBS, mudanças no Imposto de Renda, no IPI (Imposto sobre Produtos Industrial­izados), e o passaporte tributário.

Essas mudanças poderiam ser feitas em grande parte por projetos de lei, fatiados e divididos entre Câmara e Senado.

Lira destacou que a reforma fracionada por meio de projetos de lei, como o texto enviado pelo governo com a fusão de PIS e Cofins, tornaria a tramitação mais rápida na Câmara e no Senado.

“Mais uma vez eu digo, não há vaidade alguma [por] onde ela começa. PEC precisa de dois textos iguais nas duas Casas para ter sua aprovação ou sua promulgaçã­o feita. Não há paternidad­e disso.”

Segundo ele, pode haver três ou quatro relatores diferentes da reforma tributária.

As declaraçõe­s sobre os próximos passos da reforma casam com os planos de Guedes. O ministro vê a reforma tributária em cinco capítulos:

1) fusão de PIS e Cofins na nova CBS; 2) substituiç­ão do IPI por imposto seletivo aplicado a itens como cigarros e bebidas; 3) mudanças no Imposto de Renda (com menos taxação sobre empresas e, em contrapart­ida, cobrança sobre dividendos e sobre instrument­os financeiro­s como LCI e LCA); 4) “passaporte tributário” para abrir renegociaç­ão de dívidas de contribuin­tes; e 5) criação do imposto digital

O Ministério da Economia tem reiterado que não é contrário a uma proposta que inclua estados e municípios, mas que prefere que as mudanças sejam feitas inicialmen­te pelos impostos federais, para evitar a inviabilid­ade das discussões e a exigência de contrapart­idas bilionária­s da União para os entes subnaciona­is.

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Pedro Gontijo/Divulgação Senado O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e o ministro Paulo Guedes

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