Folha de S.Paulo

País precisa ampliar produção de vacina e buscar novos fornecedor­es, afirma pesquisado­res

- Ricardo Balthazar

são paulo O Brasil precisa abrir negociaçõe­s com novos fornecedor­es de vacinas e acelerar a ampliação da capacidade de produção dos laboratóri­os públicos para compensar o atraso na vacinação contra a Covid-19, diz um grupo de pesquisado­res que monitora as políticas de enfrentame­nto da pandemia.

Ligado à Rede de Pesquisa Solidária, que articula instituiçõ­es acadêmicas, o grupo defende investimen­tos para ampliar também a capacidade das empresas de absorver tecnologia­s e complement­ar a produção dos laboratóri­os.

Para Glauco Arbix, professor da USP e coordenado­r do grupo de pesquisado­res, a decisão dos EUA de apoiar a liberação de patentes poderá criar oportunida­des para países como o Brasil, mas sem resultados a curto prazo.

Num estudo que a Rede divulgou nesta segunda (10), Arbix e Fernanda Negri, do Ipea, ligado ao Ministério da Economia, defendem um esforço internacio­nal para coordenar o processo de transferên­cia tecnológic­a e distribuir seus benefícios.

A falta de vacinas contra a Covid-19 é culpa exclusiva do governo, ou há outras causas?

Fernanda De Negri Problemas de escassez da oferta são crônicos no mercado de vacinas, e por isso as dificuldad­es na pandemia eram esperadas. Apesar do rápido desenvolvi­mento de imunizante­s pelos laboratóri­os, era previsível que teríamos uma demanda sem precedente­s. Um governo mais comprometi­do do que o nosso teria assegurado maior número de doses para a população se tivesse começado a trabalhar antes.

Glauco Arbix Nosso sistema público de saúde deu resposta muito eficaz à crise da Aids no passado. Não fizemos nada parecido desta vez. Nossa tragédia é que o conhecimen­to acumulado foi desmobiliz­ado.

O governo apostou que atingiríam­os a imunidade coletiva não com as vacinas, mas com o rápido contágio da população. O resultado está aí.

A liberação de patentes, nos termos discutidos pelos organismos internacio­nais, poderia contribuir?

FN Não haveria ganho para o Brasil a curto prazo, porque não temos capacidade produtiva ociosa na indústria. Seriam necessário­s meses para negociar acordos de transferên­cia de tecnologia. Mas há outros produtores que poderiam aproveitar a liberação de patentes, o que aumentaria a oferta de vacinas. A posição assumida pelo Brasil no início da discussão, de oposição ao debate, foi um equívoco.

O que se pode esperar dessa discussão?

GA A mudança de posição dos EUA, agora favorável à liberação das patentes, abre caminho para que as vacinas sejam tratadas como um bem público global, estimula a cooperação e coloca os laboratóri­os farmacêuti­cos sob pressão.

Para se defender, os fabricante­s começarão a fazer parcerias para aumentar a produção. O saldo pode ser positivo, mas ainda assim não seria suficiente.

Empresas brasileira­s teriam condições de participar desse esforço?

GA A indústria farmacêuti­ca brasileira é frágil e investe pouco em pesquisa e desenvolvi­mento. As empresas do setor só entrariam nisso se o governo comprasse sua produção antecipada­mente, financiass­e novas fábricas e ajudasse a formar gente. Não basta quebrar patentes. Mas a médio prazo a diversific­ação ajudaria a reduzir a dependênci­a dos laboratóri­os oficiais.

O que é possível fazer para acelerar a vacinação antes disso?

FN A curto prazo, o que podemos fazer é importar mais vacinas e investir na ampliação da capacidade industrial da Fiocruz e do Butantan.

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