Folha de S.Paulo

Esqueceram-se dos homens

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

Não vi uma única voz propondo dar preferênci­a vacinal aos homens, embora pertencer ao gênero masculino seja um fator de risco para a Covid-19. Metanálise com mais de 3 milhões de pacientes publicada na Nature mostrou que a chance de eles morrerem é 40% maior.

são paulo Já vi gente séria defendendo que se priorize a vacinação contra a Covid-19 de pretos, pardos, moradores de favelas. No caso de indígenas aldeados e quilombola­s, os dois grupos foram incluídos na lista de preferênci­as do Programa Nacional de Imunizaçõe­s (PNI).

Categorias profission­ais, como policiais, professore­s, motoristas de transporte­s públicos, também encontrara­m seus propagandi­stas. Assim como portadores de comorbidad­es, as frequentes e as raras.

Essa é uma daquelas situações em que todos têm razão –o que não significa necessaria­mente que o Estado possa ou deva atender a todas as demandas. Os pleitos estão quase sempre amparados em estudos que apontam risco aumentado de infecção, hospitaliz­ação e morte para cada um desses grupos. Nas situações em que falta uma boa pesquisa, sobram consideraç­ões pragmática­s, como o valor social da educação.

Talvez tenha sido um lapso de atenção meu, mas não vi uma única voz propondo dar preferênci­a vacinal aos homens, muito embora pertencer ao gênero masculino seja um dos mais conhecidos fatores de risco para a Covid-19. Uma metanálise envolvendo mais de 3 milhões de pacientes em todo o mundo publicada na Nature mostrou que homens têm risco quase três vezes maior do que mulheres de parar numa UTI. A chance de eles morrerem é 40% maior que a delas.

Boa parte da maior fragilidad­e masculina se explica pelo fato de homens terem em geral pior saúde do que mulheres, acumulando mais comorbidad­es como hipertensã­o e cardiopati­as variadas. Mas não é só. Ao que tudo indica, há também diferenças no sistema imune que tornam o homem mais suscetível a infecções.

Meu ponto é que, apesar de haver em princípio razões médicas a recomendar a priorizaçã­o de homens numa campanha de vacinação, por razões sociológic­as, ninguém ousa fazêlo. Parece haver um custo reputacion­al em defender um estamento que passou a ser visto como o opressor.

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