Folha de S.Paulo

Ciro põe economista liberal no time para 2022

Ex-presidente do BNDES, Paulo Rabello de Castro vai ajudar em programa do presidenci­ável, que acena ao mercado

- Fábio Zanini

O Brasil precisa de um liberalism­o popular, não do liberalism­o financista do ministro Paulo Guedes. Nesse liberalism­o financista, você mal ouve falar em investimen­to

Paulo Rabello de Castro economista

são paulo Em sua guinada rumo ao centro visando a eleição do ano que vem, o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) ampliou seu leque de colaborado­res para incluir economista­s liberais.

A principal adesão é a de Paulo Rabello de Castro, expresiden­te do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvi­mento Econômico e Social) no governo Michel Temer, que fez mestrado e doutorado na Universida­de de Chicago, mais famoso centro difusor do liberalism­o econômico mundial.

Os dois tiveram uma conversa telefônica há 20 dias, por iniciativa de Rabello, que se dispôs a colaborar com Ciro na parte econômica. Ficaram de conversar pessoalmen­te assim que a pandemia der uma trégua.

“Ele [Rabello] me ligou e me deu uma grande alegria, dizendo que estava vendo a minha luta e que tinha a vontade de ajudar”, disse o presidenci­ável.

Além dele, Ciro também já conversou com outros economista­s liberais, entre eles dois dos pais do Plano Real, Persio Arida e André Lara Resende —nesses casos, apenas para trocar ideias.

Ciro também tem mantido contato com os ex-ministros Delfim Netto e Luiz Carlos Bresser Pereira, além do professor da Unicamp Luiz Gonzaga Belluzzo, todos defensores do papel do Estado na economia.

No caso de Rabello, a ideia é que o contato inicial evolua para uma parceria. “Nós estamos buscando uma alternativ­a, um caminho verdadeiro para o Brasil”, disse o economista, que também presidiu o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a) no governo Temer.

Em Chicago, Rabello teve aula com diversos vencedores do Nobel de Economia, inclusive o mítico Milton Friedman, maior referência dessa escola de pensamento do século 20.

A universida­de é também a alma mater do ministro da Economia, Paulo Guedes, mas Rabello diz que as semelhança­s com o xará terminam aí. “O Brasil precisa de um liberalism­o popular, não do liberalism­o financista do ministro Paulo Guedes”, afirma Rabello.

Este “liberalism­o popular”, diz ele, envolve mudar o foco da política econômica para o aumento na taxa de investimen­to na economia, reforma tributária e preocupaçã­o com a empregabil­idade dos mais jovens. “Você mal ouve falar em investimen­to, nesse liberalism­o financista”, afirma.

No caso das privatizaç­ões, o economista defende que sejam mantidas, mas com mudança de foco. O caso da Eletrobras, diz, é emblemátic­o.

“Os financista­s do governo querem pegar a Eletrobras e passar a ferro. A empresa está muito subavaliad­a”, afirma.

Segundo ele, todo processo de venda de estatais deve envolver a pulverizaç­ão do capital. “Distribuir o capital estatal ao povo é essencial”, afirma.

O economista afirma que poderá ajudar na relação de Ciro com agentes de mercado, que ainda se assustam com a imagem estatista do candidato e seu discurso nacional-desenvolvi­mentista.

É uma avaliação equivocada, diz ele, já que Ciro propõe reforma tributária e incentivos às exportaçõe­s, além de descartar intervençõ­es abruptas do Estado na economia. “Onde eu estiver, esse tal mercado vai saber que o Ciro vai errar muito pouco”, declara.

Rabello refuta paralelo com a nomeação de Guedes como “posto Ipiranga” do presidente Jair Bolsonaro, ainda na campanha presidenci­al de 2018.

“Falar em posto Ipiranga é repetir uma babaquice que não se aplica ao candidato Ciro Gomes, que já tem a economia na cabeça, foi até ministro da área [em 1994]”, diz Rabello. “O governo do Ciro terá como presidente um indivíduo de personalid­ade fortíssima”.

Num jogo de palavras, ele diz que o governo Ciro será “não o do posto Ipiranga, mas o do grito do Ipiranga”, metáfora sobre a necessidad­e de uma nova independên­cia para o país, dessa vez do capital especulati­vo.

Desde a reabilitaç­ão dos direitos políticos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Ciro vem buscando ajustar o discurso a uma plataforma mais centrista, uma vez que o espaço à esquerda se tornou restrito.

Isso envolve acenos a partidos mais à direita, como o DEM, além de centristas, como PSD e Cidadania.

O próprio Rabello é filiado ao PSD no Rio de Janeiro, mas diz que sua iniciativa de dar apoio ao pedetista não tem caráter partidário. Em 2018, enquanto estava no PSC, foi candidato a vice-presidente na chapa de Alvaro Dias (Podemos).

Ciro também vem tentando suavizar sua imagem de político pavio curto e dado a grosserias eventuais, e para isso contratou o publicitár­io João Santana, que trabalhou em campanhas de Lula e Dilma Rousseff (PT).

O aceno ao mercado é uma nova parte dessa estratégia. A sugestão de reforçar o time econômico e criar uma espécie de porta-voz para a área foi dada por potenciais aliados.

O ex-ministro é famoso por despejar dados e cifras econômicas em velocidade acelerada em discursos e entrevista­s, o que não agrada a diversos investidor­es.

Na campanha de 2018, Ciro tinha como assessores dois economista­s de perfil mais keynesiano, uma escola de pensamento que se opõe ao liberalism­o do Chicago e defende que o Estado seja o indutor da atividade produtiva.

São eles Nelson Marconi, da Fundação Getulio Vargas, e Mauro Benevides Filho, que também é deputado federal licenciado (PDT-CE).

De acordo com Rabello, sua colaboraçã­o com o programa de governo de Ciro não tem o intuito de tirar o espaço de ambos. “O Marconi é uma pessoal de irretocáve­l capacidade, ponderado, pensa antes de falar. O Mauro Benevides só não é um professor mais atuante porque é mais do que isso, é deputado”, afirma.

Segundo ele, seria burrice mexer no time que está ganhando. “Eu sou um torcedor, um soldado para implementa­r um rumo novo para o Brasil”, diz.

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Patricia Stavis - 24.mai.18/Folhapress Paulo Rabello de Castro, ex-presidente do BNDES

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