Palestinos criticam cobertura midiática ‘desumanizada’
washington Na rede americana CNN, uma repórter pergunta ao vivo para o palestino Muhammad al-Kurd se ele apoia “os protestos violentos” em Jerusalém. Sem titubear, ele rebate: “Você apoia a desapropriação violenta da minha família?”. Quando ela pergunta o que ele sente em relação a um possível despejo, Kurd discorda da palavra: “Não é despejo, é expulsão étnica”.
Nos últimos dias, com a crescente tensão em Jerusalém, palestinos como Kurd têm usado entrevistas e redes sociais para protestar contra a forma como a imprensa tem retratado a crise. Kurd também reclamou no Twitter, por exemplo, de que a sua fala ao jornal americano The Washington Post foi editada, deixando de fora palavras que para ele são fundamentais: colonialismo e ocupação.
Não é de hoje que palestinos acusam jornalistas de não entender a situação. Mas essa questão veio à tona com força nesta semana. A família de Kurd está em vias de ser expulsa do bairro palestino de Sheikh Jarrah, em Jerusalém, pelo governo israelense, caso a Suprema Corte confirme decisão de primeira instância.
Quando o jornal The New York Times noticiou esses eventos, escreveu em sua manchete que “militantes de Gaza dispararam foguetes, e a polícia israelense lutou contra manifestantes palestinos em Jerusalém”. No Twitter, palestinos protestaram dizendo que o título dava a entender que os foguetes precederam a violência policial, invertendo assim a ordem dos fatos.
“Isso está acontecendo há anos”, diz a franco-palestina Inès Abdel Razek, diretora da organização Rabet. “A imprensa retrata a situação como se esse fosse um conflito entre duas partes que não conseguem entrar em acordo, mas essa abordagem é problemática. Palestinos vivem hoje sob a soberania de Israel como cidadãos de segunda classe, com menos direitos.”
Não se trata de ignorar que o Hamas é uma milícia radical, tampouco de deixar de noticiar seus ataques, como o que atingiu uma escola israelense nesta semana. A questão, para os palestinos descontentes com a imprensa, é ter empatia também pela situação que eles vivem. Esse tipo de discurso ecoa o que tem sido dito no Brasil, no caso do massacre policial do Jacarezinho, em que ao menos 27 pessoas foram mortas pela polícia.
“Os palestinos foram desumanizados durante décadas, e agora nós estamos tentando mudar isso. Principalmente os jovens, que estão retrucando. A imprensa apenas se interessa pela gente quando há rompantes de violência. Mas nós vivemos a violência todos os dias”, afirma Abdel Razek.