Folha de S.Paulo

Leitos saltam 150% em 1 ano, e UTIs seguem lotadas

Nos últimos 12 meses, número de leitos de terapia intensiva para Covid cresceu de 11,3 mil para 28,1 mil

- João Pedro Pitombo, João Valadares, Katna Baran, Fernanda Canofre, Monica Prestes, Marcelo Toledo e Júlia Barbon

Em um ano, os estados ampliaram em 150% a oferta de leitos de UTI para Covid. Mesmo assim, o nível de ocupação dos hospitais que atuam no tratamento da doença é maior do que há 12 meses, de acordo com levantamen­to realizado pela Folha desde maio de 2020.

Em um ano, os estados brasileiro­s ampliaram em 150% a oferta de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) para Covid-19. Mesmo assim, o nível de ocupação dos hospitais que atuam no tratamento da doença é maior do que há um ano.

Os dados vêm dos levantamen­tos de ocupação de leitos para Covid-19 realizados pela Folha a partir de maio de 2020. Desde então, foram 24 levantamen­tos, que mapearam a oscilação da oferta e nível de ocupação dos leitos em 24 unidades da federação.

Em 11 de maio de 2020, eram 11,3 mil leitos de UTI para Covid. Na época, apenas dois estados tinham ocupação acima de 90%, patamar considerad­o crítico: Ceará e Pernambuco.

Em 10 de maio de 2021, havia 28,1 mil leitos disponívei­s. Mas o quadro nos estados é bem mais grave: seis têm uma ocupação acima de 90% dos leitos. São eles Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Ceará, Paraná e Santa Catarina.

Os dados não incluem Rio de Janeiro, Minas Gerais e Rio Grande do Sul, que mudaram a metodologi­a da contagem de leitos ao longo dos últimos 12 meses, inviabiliz­ando a comparação.

Nesse período, houve oscilações no nível de ocupação dos leitos de acordo com a região, mas todas as 27 unidades da federação enfrentara­m em algum momento um nível crítico.

Depois do arrefecime­nto da primeira onda, alguns estados chegaram a desativar hospitais de campanha e destinaram leitos de Covid para o tratamento de outras enfermidad­es a fim de não os manter ociosos. Porém, em geral, houve uma retomada na abertura de leitos durante a segunda onda da pandemia.

Primeira unidade federativa a ver seu sistema de saúde colapsar —por duas vezes—, o Amazonas é um dos poucos estados onde o número de leitos de UTI para Covid-19 é menor agora do que há um ano.

A oferta de vagas caiu 13% entre maio de 2020 —quando o sistema de saúde entrou em colapso pela primeira vez, com enterros em valas coletivas— e maio de 2021.

Em janeiro de 2021, quando o sistema de saúde colapsou pela segunda vez, com pacientes morrendo sufocados por falta de oxigênio, o Amazonas tinha menos leitos do que na primeira onda, apesar de a gravidade da pandemia ser maior.

Eram 326 vagas em 11 de janeiro, três dias antes do colapso, sendo que 93% delas estavam ocupadas. O estado ainda tinha uma fila de 60 pessoas aguardando por um dos leitos de UTI, que estão todos em Manaus.

No vizinho Pará, por outro lado, as vagas de UTI aumentaram 130% entre maio de 2020, quando ocorreu o pico da pandemia no estado, e maio deste ano, passando de 277 para 638 leitos. O nível de ocupação, contudo, permanece num patamar semelhante.

Em janeiro de 2021, quando a escassez de oxigênio provocou a morte de pacientes na cidade de Faro, o estado tinha 228 vagas e 70% delas estavam ocupadas.

O Paraná triplicou em um ano o número de vagas de UTI e atualmente tem cerca de 1.900 leitos. A ocupação, no entanto, não parou de subir, e os hospitais estaduais atingiram lotação máxima entre fevereiro e março de 2021, pior momento da pandemia no estado.

Na ocasião, o secretário estadual de Saúde, Beto Preto, pediu que empresas e indústrias doassem cilindros de oxigênio. Hoje, a taxa é de 92%.

Até o início de abril, Curitiba permaneceu por 23 dias em isolamento rígido. Em maio, após a flexibiliz­ação das medidas, a capital registrou aumento no número de casos ativos de Covid-19.

Santa Catarina duplicou o número de vagas em UTIs, mas vem desativand­o leitos nas últimas semanas diante da queda na demanda.

O governo catarinens­e chegou a transferir pacientes para o Espírito Santo em março, devido à superlotaç­ão de hospitais. As medidas restritiva­s, no entanto, não seguiram, de modo geral, a mesma proporção da gravidade do cenário.

O estado continua registrand­o festas clandestin­as, principalm­ente em cidades litorâneas, mesmo com a ocupação de leitos em torno de 90%.

Na região Centro-Oeste, que também enfrentou um recrudesci­mento dos casos de Covid-19, o cenário é parecido.

Goiás ampliou a oferta de leitos de UTI em dez vezes ao longo de um ano. Mas isso não impediu que a ocupação de vagas crescesse de 41% em maio do ano passado para os atuais 81%.

Primeiro estado a confirmar morte por coronavíru­s na região, Goiás também registrou o óbito do prefeito de Goiânia, em decorrênci­a da Covid-19. Maguito Vilela (MDB), 71, morreu em janeiro após dois meses e meio de internação. É a cidade mais populosa até aqui a perder seu governante para o vírus.

Mato Grosso tinha 9% de ocupação de leitos em maio do ano passado. Hoje, mesmo tendo triplicand­o a oferta de leitos, o estado tem uma ocupação de 77%.

Mato Grosso do Sul conseguiu quadruplic­ar a rede de atendiment­o, mas enfrenta uma ocupação de 86% dos leitos para pacientes graves.

Dentre os estados do Sudeste, o Rio de Janeiro tem agora o mesmo nível de ocupação de UTIs públicas de um ano atrás, acima de 80%.

O estado passou por três picos da doença, com colapsos do sistema de saúde: em maio e dezembro de 2020 e em abril deste ano. Muitos hospitais de campanha prometidos nunca foram abertos, e o então governador Wilson Witzel (PSC) sofreu impeachmen­t após ser afastado por suspeitas em contratos da Saúde.

Um dos primeiros a colapsar no Nordeste, o Ceará chegou a um cenário de relativa tranquilid­ade no final do ano passado, com a retomada de cirurgias eletivas e desativaçã­o de leitos para Covid.

À medida que a demanda voltou a crescer, neste ano, o estado foi reabrindo as UTIs. Nesta semana, a taxa de ocupação é de 92%.

Pernambuco aumentou em 220% o número de UTIs. A taxa de ocupação, mesmo com 1.168 vagas a mais, cresceu e atualmente é de 97%.

O estado enfrenta colapso no sistema de saúde desde o final de fevereiro, com filas de mais de cem pacientes para acessar cuidados intensivos, relatos de desabastec­imento de medicament­os e profission­ais esgotados. A média de espera para acessar uma vaga de UTI é de 12 horas.

Sergipe, que mais que quadruplic­ou a rede de atendiment­o a pacientes graves, tem 97% dos leitos ocupados.

O Rio Grande do Norte triplicou o número de leitos de UTI, mas mesmo assim tem ocupação de 94%.

Em fevereiro, a governador­a Fátima Bezerra (PT) disse que abrir leitos não bastava. “É preciso aumentar o isolamento social rigorosame­nte.”

O infectolog­ista Bruno Ishigami também diz que não é suficiente criar vagas sem medidas efetivas de restrição.

Ele ressalta que a ausência de quarentena rígida, atrelada a novas variantes do vírus, contribuiu de maneira determinan­te para a força da segunda onda, que também atingiu com mais gravidade os pacientes mais jovens, que representa­m parte significat­iva da população economicam­ente ativa. “É uma população que se expõe a mais riscos.”

 ??  ?? *Dados de AM e RR são de 18 de maio de 2020 e o do AP é de 26 de maio de 2020 **BA, CE, RJ, RN, AL e SE incluem leitos estaduais, municipais e federais. RJ divulgava o número de leitos só estaduais em 2020,agora divulga de toda a rede pública
***MG divulgava o total de leitos no SUS, não apenas Covid em 2020; apenas 6% dos internados eram casos relacionad­os ao novo coronavíru­s. Agora divulga apenas leitos Covid
**** PI inclui leitos públicos e privados
***** RS divulgava total de leitos SUS e privados em 2020, agora divulga dados separados de leitos SUS
Fontes: Governos estaduais
*Dados de AM e RR são de 18 de maio de 2020 e o do AP é de 26 de maio de 2020 **BA, CE, RJ, RN, AL e SE incluem leitos estaduais, municipais e federais. RJ divulgava o número de leitos só estaduais em 2020,agora divulga de toda a rede pública ***MG divulgava o total de leitos no SUS, não apenas Covid em 2020; apenas 6% dos internados eram casos relacionad­os ao novo coronavíru­s. Agora divulga apenas leitos Covid **** PI inclui leitos públicos e privados ***** RS divulgava total de leitos SUS e privados em 2020, agora divulga dados separados de leitos SUS Fontes: Governos estaduais

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