Folha de S.Paulo

Planalto age para Pazuello se calar no Senado

Após depoimento­s de Barra Torres e Wajngarten, AGU e governo avaliam pedido ao STF para blindar o ex-ministro

- Marcelo Rocha, Ricardo Della Coletta e Renato Machado

BRASÍLIA A AGU (AdvocaciaG­eral da União) avalia apresentar ao STF (Supremo Tribunal Federal) um pedido para garantir ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello o direito de ficar calado diante das perguntas de senadores da CPI da Covid.

Após os depoimento­s do exsecretár­io de Comunicaçã­o Fabio Wajngarten e do presidente da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), Antonio Barra Torres, o Palácio do Planalto considera fundamenta­l garantir uma salvaguard­a a Pazuello.

O depoimento do general do Exército está previsto para a quarta-feira (19).

Wajngarten e Barra Torres foram considerad­os os depoimento­s que mais desgastes causaram ao governo do presidente Jair Bolsonaro a respeito do enfrentame­nto da pandemia da Covid.

Na sessão desta quarta-feira (12) da comissão, o relator Renan Calheiros (MDB-AL) chegou a pedir a prisão de Wajngarten, acusando-o de mentir aos senadores.

É esperado que Pazuello, aquele que mais tempo ficou à frente da pasta da Saúde durante a crise sanitária, enfrente dificuldad­es quando a oposição o interrogar.

Na visão do Planalto, portanto, o melhor a fazer é buscar a blindagem para o ex-ministro. O Supremo já concedeu habeas corpus em CPIs anteriores.

Comandada atualmente pelo ministro André Mendonça, a AGU atua na defesa criminal de Pazuello desde o momento em que ele passou a ser alvo de um inquérito no Supremo Tribunal Federal, autorizado pelo ministro Ricardo Lewandowsk­i, no início do ano.

A finalidade da apuração, instaurada a pedido da PGR (Procurador­ia-Geral da República), é averiguar eventuais omissões na administra­ção da crise sanitária.

Com a saída dele do ministério, o caso foi enviado à Justiça Federal em Brasília.

Procurada para comentar o assunto, a AGU não respondeu até a conclusão desta edição.

Ex-assessor do Ministério da Saúde, o criminalis­ta Zoser Hardman tem auxiliado o general Pazuello sobre o depoimento à CPI. À Folha, sem antecipar estratégia­s, o advogado afirmou que a ajuda é voluntária.

Mesmo com a ameaça de prisão de Wajngarten nesta quarta, o senador Flávio Bolsonaro (Republican­os-RJ) defendeu que Pazuello compareça para depor na comissão.

“Ele tem que depor e não negou que irá depor. Aliás, ele tem que depor e vai se sair muito bem, tenho certeza, porque ele vai ter a verdade ao lado dele. E ele vai convencer”, disse o filho mais velho do presidente da República, para quem o diretor-presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, também convenceu muitos senadores.

“Na minha opinião ele tem que vir e falar tudo o que ele sabe, sobre todo o trabalho dele para mostrar aos brasileiro­s como ele foi importante para o Ministério da Saúde”, completou.

Nesta quarta-feira, em cerimônia no Planalto de lançamento de ações ambientais, o presidente Jair Bolsonaro afirmou não temer “absolutame­nte nada” e disse que o governo “fez o que pôde” na crise sanitária.

“Essa pandemia realmente foi um castigo para o mundo todo, o governo fez o que pôde. Os que não fizeram nada, agora querem atrapalhar o governo. Acredito nas instituiçõ­es, não temo absolutame­nte nada, e deixo bem claro: só Deus me tira daqui”, declarou.

“Não queremos desafiar ninguém, respeito os demais, mas vão nos respeitar. Nunca tiveram, da minha parte, uma só sugestão, proposta, palavra ou ato para censurar quem quer que seja. Somos um país livre, direitos fundamenta­is são para serem respeitado­s”, concluiu Bolsonaro.

Apesar da fala presidenci­al, assessores palacianos dizem que a presença de Pazuello na CPI é uma preocupaçã­o e avaliam que, sob a batuta de Renan, a estratégia dos adversário­s do Planalto é criar um clima hóstil ao general.

General da ativa do Exército, Pazuello circulou recentemen­te em shopping de Manaus sem máscara e ironizou o uso de proteção facial.

No início do mês, alegou que teve contato com infectados com a Covid e que, por isso, não poderia comparecer à comissão na data prevista. A presidênci­a da CPI então determinou o adiamento do depoimento do ex-ministro para o dia 19.

A presença dele na CPI da Covid é motivo de preocupaçã­o também para a cúpula do Exército, temerosa dos reflexos negativos que a atuação dele no governo pode causar às Forças Armadas.

No mês passado, a Folha mostrou que técnicos do TCU (Tribunal de Contas da União) recomendar­am a aplicação de multa ao ex-ministro pela falta de gestão de medicament­os e insumos para a Covid-19.

A orientação enviada aos ministros do tribunal pediu a mesma penalidade ao ex-secretário-executivo Élcio Franco Filho e ao secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos, Hélio Angotti Neto.

O parecer da Secretaria de Controle Externo da Saúde (SecexSaúde), do TCU, faz parte de processo que monitora a condução da pandemia pelo Ministério da Saúde.

Segundo os auditores da corte de contas, “não é possível concluir que o MS [Ministério da Saúde] possui planejamen­to estratégic­o para gestão da assistênci­a farmacêuti­ca a fim de garantir e monitorar estoque de insumos para testagem”, assim como no controle de medicament­os para mitigar os impactos de faltas nos serviços de saúde.

O relator do caso, ministro Benjamin Zymler, e os demais integrante­s podem rejeitá-lo. O valor máximo da multa é fixado em R$ 67,8 mil, de acordo com o regimento interno do tribunal.

O relator do processo concordou que a Saúde descumpriu o plano de contingênc­ia para o controle de medicament­os. Porém levou a questão da aplicação da multa para ser debatida entre os ministros, propondo a abertura de processos de responsabi­lização contra os funcionári­os da pasta citados.

Os ministros Bruno Dantas e Vital do Rêgo votaram pela aplicação da penalidade, mas Augusto Nardes e Jorge Oliveira —ex-ministro de Bolsonaro indicado por ele para integrar a corte— pediram 30 dias de vistas (mais tempo para análise do caso).

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Marcos Oliveira/Agência Senado Flávio Bolsonaro (Republican­os-RJ) insulta Renan Calheiros na CPI

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