Lei de startups traz avanços, mas deixa de resolver entraves
Marco acerta ao criar regime especial de contratação; proposta para área tributária, no entanto, fica de fora
Foi aprovado na terça (11), na Câmara, o projeto de lei complementar nº 146/19, o chamado Marco Legal das Startups. Foi um passo importante para quem empreende e investe no setor, mas não um salto gigantesco para o ecossistema brasileiro de startups.
Entre seus acertos, estão as disposições destinadas a simplificar a vida dos empreendedores e aquelas que procuram aumentar o fluxo de investimentos em inovação.
Além disso, para evitar que regulações desatualizadas impeçam o surgimento de produtos e serviços inovadores, destaca-se a previsão de que os órgãos competentes possam autorizar temporariamente as empresas a desenvolver modelos de negócios e testar tecnologias experimentais em um ambiente com condições especiais simplificadas conhecido como “sandbox regulatório”.
Porém, a medida do Marco Legal que talvez venha a representar um impulso mais relevante às startups é a criação de um regime especial de contratação de soluções inovadoras pela administração pública. Este facilita o acesso das startups a licitações e, com isso, possibilita que passem a vender para o Estado, ganhando escala e competitividade.
Já o poder público passa a contar com a capacidade dessas empresas de desenvolver tecnologias escaláveis que possam contribuir, por exemplo, para vencer nossos desafios socioambientais.
O Marco Legal deixou, no entanto, de enfrentar importantes entraves para o desenvolvimento das startups, e esse foi seu maior erro.
No âmbito trabalhista, o projeto de lei inicial procurava flexibilizar as normas aplicáveis às startups e regular os planos de opção de compra de ações (“stock options”), e todas essas disposições foram retiradas do texto aprovado. No caso das “stock options”, importante fonte de atração e retenção de talentos, a regulação permitiria conferir maior segurança jurídica a uma prática que é usual no mercado, mas cuja natureza ainda precisa ser mais bem definida para que sua tributação seja realista e justa.
Na área tributária, a proposta de que as startups pudessem optar pelo regime do Simples Nacional sem estarem sujeitas a algumas das vedações aplicadas às empresas comuns —como a de se organizarem sob a forma de sociedades anônimas— também caiu. Sem isso, as startups seguem sujeitas à difícil escolha entre aderir a esse regime fiscal mais favorável e adotar um tipo societário que atrairia mais investidores.
Outra medida que permitiria aumentar o interesse por investir em startups que ficou de fora do Marco Legal é a eliminação de uma distorção hoje existente, que é a tributação do investimento em startups ter o mesmo tratamento fiscal daquele em fundos de renda fixa.
A carga tributária e as obrigações trabalhistas excessivas não afetam apenas as startups. O Brasil, como um todo, sofre com esses problemas, e a tarefa de atacálos está faz tempo sobre a mesa. Dadas as dificuldades históricas em promover mudanças nessas áreas, a limitação do alcance das medidas a um universo menor de empresas deveria permitir que se avançasse com essa agenda. E o Marco Legal procura definir condições —algumas delas objetivas, inclusive— para que uma empresa seja considerada startup, limitando seu enquadramento.
Entretanto, mesmo essa limitação não foi capaz de assegurar que, ao menos em relação às startups, o ambiente de negócios fosse beneficiado com incentivos fiscais e regras trabalhistas mais adequadas à realidade dessas empresas.
Agora, é preciso canalizar esforços para a criação de novos projetos de lei voltados a solucionar essas questões, contribuindo para que tenhamos, a exemplo do que ocorre em outros países, um Marco Legal abrangente e capaz de impulsionar as startups.