Não se enfrenta Covid parando universidades por falta de verba
A possível paralisação das atividades da UFRJ por falta de recursos até para pagar conta de energia já seria uma tragédia suficiente se não estivéssemos enfrentando uma pandemia. No contexto da Covid-19, o anúncio da insustentabilidade financeira de uma das melhores universidades brasileiras ganha tom de surrealidade.
A universidade tem um orçamento projetado de R$ 383 milhões para arcar com serviços de limpeza, segurança e com despesas ligadas às suas atividades mínimas de ensino, pesquisa e extensão.
O problema é que o orçamento federal previsto para a universidade é de R$ 299,1 milhões em 2021 —e menos da metade dos recursos está, de fato, disponível para execução (R$ 146,9 milhões). O restante demanda suplementação via Congresso.
Com a quantia em caixa, a UFRJ consegue operar até o meio do ano. Depois disso, não tem mais como pagar suas contas básicas —e pode fechar as portas; muitas portas.
Parar a UFRJ significa interromper leitos de UTI para Covid-19 e inviabilizar pesquisas para o desenvolvimento de novas formas de diagnóstico e de uma possível vacina nacional contra o coronavírus.
Isso sem contar as pesquisas em andamento em outros temas. Antes da Covid-19, a UFRJ já se destacava por trabalhos de excelência mundial em áreas como petróleo. Também foram pesquisadores dela que fizeram o genoma do zika vírus, por exemplo.
Qual seria a reação mundial se a Universidade de Oxford, no Reino Unido, anunciasse que vai fechar as portas por falta de dinheiro? Pois é.
Nenhum país enfrenta a Covid-19 (ou qualquer outro problema complexo) inviabilizando suas melhores instituições de pesquisa por falta de verba. Ao contrário: na pandemia, países desenvolvidos aumentam os esforços em ciência e incentivam parcerias para viabilizar soluções.
Enquanto universidades de excelência reúnem cientistas em entrevistas coletivas globais para divulgar inovações no enfrentamento da pandemia, no Brasil, gestores da UFRJ precisam se juntar para apresentar gráficos financeiros assustadoramente em declínio —e para pedir ajuda.
Estamos diante do desmonte de uma das melhores universidades brasileiras em avaliações internacionais e nacionais. No RUF, a UFRJ chegou a liderar o país nas edições de 2017 e 2018 —posição ocupada pela USP na última edição.
A universidade também está no “top 5” do último RUF na avaliação de empregadores.
Simbólica, a UFRJ foi uma das primeiras instituições que chamamos de “universidade” no país no início do século 20. Nasceu como Universidade do Rio de Janeiro; depois, foi rebatizada de Universidade do Brasil até atender por Federal do Rio de Janeiro.
Um século depois, universidades públicas como ela conduzem mais de 90% das pesquisas científicas —que colocam o país entre os 15 maiores produtores de ciência.
Está na hora de entendermos que instituições de pesquisa são centrais no desenvolvimento do país e no enfrentamento de desafios como a pandemia de Covid-19.
Reduzir recursos em universidades públicas implica importação de soluções, de conhecimento e de tecnologia. A conta vai sair bem mais cara.