SP pode repor 22% de mata recuperando seus rios e morros
Recomposição de áreas de proteção é obrigatória, mas só 16% das cidades têm 30% ou mais de vegetação nativa
Só a restauração de APPs (Áreas de Proteção Permanente), como nascentes, margens de rios e topos de morros, pode elevar em até 22% a vegetação do estado de São Paulo, em cerca de 1,2 milhão de hectares de mata atlântica e cerrado.
Mesmo com essa recuperação, parcela expressiva dos municípios do estado permanecerá com menos de 20% de matas em seu território.
O dado resulta de análise feita pelo Geolab, laboratório de planejamento de uso do solo e conservação da USP, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica.
“Vimos que a restauração das APPs faz grande diferença para a vegetação nativa de São Paulo, mas, para algumas regiões, especialmente do noroeste e oeste do estado, ainda é insuficiente”, diz Luís Fernando Guedes Pinto, um dos autores da pesquisa, diretor de conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica e membro da Rede Folha de Empreendedores Sociais.
Cidades na região de Ribeirão
Preto, Piracicaba e Paranapanema, no oeste paulista, têm menos de 10% de vegetação nativa, sendo consideradas como totalmente desflorestadas.
Dependendo da cidade, porém, a recomposição completa das APPs leva a um salto de vegetação, como em Santa Branca, Arapeí, Lorena, Tremembé e Cachoeira Paulista. Outros exemplos são Potim e Canas, que sairiam de 6% e 11% de vegetação nativa para 21% e 24%, respectivamente, com recuperação das APPs.
“Podemos enxergar o estudo como um copo meio cheio ou meio vazio”, afirma Kaline de Mello, uma das autoras da pesquisa, pesquisadora da USP e professora da UnespRio Claro.
“Ao mesmo tempo que o estudo mostra o potencial de restauração florestal no estado com o simples cumprimento da lei, mostra também a situação preocupante de que há cerca de 768 mil hectares de áreas de preservação permanente que deveriam estar conservadas, e não estão.”
O ganho de vegetação, porém, pode ser menor —em torno de 14%, mais de 760 mil hectares, para todo o estado— caso os proprietários optem pela chamada regra da escadinha. Nela, como consta no Código Florestal de 2012, a recuperação de APPs pode ser proporcional ao tamanho da propriedade. As menores podem restaurar menos.
Considerando áreas rurais consolidadas (com ocupação comprovada) até 22 de julho de 2008, é permitida nas APPs a continuidade de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural.
O Código Florestal determina que os proprietários são obrigados a restaurar áreas de APPs em suas terras.
Essas áreas são de extrema relevância pelo potencial impacto que têm no abastecimento hídrico e na qualidade da água que chega às cidades. Já no caso de morros, a vegetação é importante para evitar deslizamentos e assoreamento de rios.
As estimativas da USP e da SOS Mata Atlântica levaram em conta as determinações do Programa Agro Legal, que regulamenta, no estado de São Paulo, o Código Florestal. O Agro Legal entrou em vigência em setembro passado.
Segundo a análise, só 104 (16%) municípios paulistas têm 30% ou mais de vegetação nativa. As restaurações em escadinha e total elevariam esse número para 134 e 160, respectivamente. Essas áreas estão concentradas no sul e na região litorânea do estado.
O índice de 30% é o recomendado para manter o equilíbrio ecossistêmico na região, aponta o estudo. Levando em conta só municípios com mata atlântica, 18% têm vegetação igual ou maior que 30%. O total saltaria para 28% com restauração total das APPs.
A mata atlântica é o bioma mais devastado do Brasil, restando pouco mais de 12% de vegetação nativa. É nesse bioma que se concentra a maior parte da população no país, mais um fator que pode gerar pressão sobre a mata —que viu o desmatamento crescer 27% de 2018 a 2019, em relação ao período anterior.
O estudo mostra que a situação do cerrado —que também sofre com perdas elevadas de vegetação nativa— é mais crítica em São Paulo. Só 5% dos municípios com o bioma têm vegetação nativa maior ou igual a 30%. Isso iria a 15% com restauração total.
“Depois de quase dez anos, o Código Florestal vai chegar lá na ponta”, diz o especialista da Fundação SOS Mata Atlântica. “O programa Agro Legal é a implementação do Código Florestal em São Paulo, finalmente. Desde 2012 continuamos nas etapas de regulamentação.”
Ou seja, é possível agora a recuperação de APPs e a recomposição de Reservas Legais, que são áreas de floresta nativa que devem ser mantidas nas propriedades privadas.
“A restauração total só vai acontecer se tivermos incentivos, pagamentos por serviços ambientais”, diz Guedes Pinto.”
Ele diz que a recuperação total de APPs tem dois impactos esperados: aumento na biodiversidade, com impacto econômico, e a questão da água.
Sobre as bacias do oeste do estado, o estudo mostra dados preocupantes, com taxas de vegetação nativa que estão próximas a 10%.