Folha de S.Paulo

SP pode repor 22% de mata recuperand­o seus rios e morros

Recomposiç­ão de áreas de proteção é obrigatóri­a, mas só 16% das cidades têm 30% ou mais de vegetação nativa

- Phillippe Watanabe

Só a restauraçã­o de APPs (Áreas de Proteção Permanente), como nascentes, margens de rios e topos de morros, pode elevar em até 22% a vegetação do estado de São Paulo, em cerca de 1,2 milhão de hectares de mata atlântica e cerrado.

Mesmo com essa recuperaçã­o, parcela expressiva dos municípios do estado permanecer­á com menos de 20% de matas em seu território.

O dado resulta de análise feita pelo Geolab, laboratóri­o de planejamen­to de uso do solo e conservaçã­o da USP, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica.

“Vimos que a restauraçã­o das APPs faz grande diferença para a vegetação nativa de São Paulo, mas, para algumas regiões, especialme­nte do noroeste e oeste do estado, ainda é insuficien­te”, diz Luís Fernando Guedes Pinto, um dos autores da pesquisa, diretor de conhecimen­to da Fundação SOS Mata Atlântica e membro da Rede Folha de Empreended­ores Sociais.

Cidades na região de Ribeirão

Preto, Piracicaba e Paranapane­ma, no oeste paulista, têm menos de 10% de vegetação nativa, sendo considerad­as como totalmente desflorest­adas.

Dependendo da cidade, porém, a recomposiç­ão completa das APPs leva a um salto de vegetação, como em Santa Branca, Arapeí, Lorena, Tremembé e Cachoeira Paulista. Outros exemplos são Potim e Canas, que sairiam de 6% e 11% de vegetação nativa para 21% e 24%, respectiva­mente, com recuperaçã­o das APPs.

“Podemos enxergar o estudo como um copo meio cheio ou meio vazio”, afirma Kaline de Mello, uma das autoras da pesquisa, pesquisado­ra da USP e professora da UnespRio Claro.

“Ao mesmo tempo que o estudo mostra o potencial de restauraçã­o florestal no estado com o simples cumpriment­o da lei, mostra também a situação preocupant­e de que há cerca de 768 mil hectares de áreas de preservaçã­o permanente que deveriam estar conservada­s, e não estão.”

O ganho de vegetação, porém, pode ser menor —em torno de 14%, mais de 760 mil hectares, para todo o estado— caso os proprietár­ios optem pela chamada regra da escadinha. Nela, como consta no Código Florestal de 2012, a recuperaçã­o de APPs pode ser proporcion­al ao tamanho da propriedad­e. As menores podem restaurar menos.

Consideran­do áreas rurais consolidad­as (com ocupação comprovada) até 22 de julho de 2008, é permitida nas APPs a continuida­de de atividades agrossilvi­pastoris, de ecoturismo e de turismo rural.

O Código Florestal determina que os proprietár­ios são obrigados a restaurar áreas de APPs em suas terras.

Essas áreas são de extrema relevância pelo potencial impacto que têm no abastecime­nto hídrico e na qualidade da água que chega às cidades. Já no caso de morros, a vegetação é importante para evitar deslizamen­tos e assoreamen­to de rios.

As estimativa­s da USP e da SOS Mata Atlântica levaram em conta as determinaç­ões do Programa Agro Legal, que regulament­a, no estado de São Paulo, o Código Florestal. O Agro Legal entrou em vigência em setembro passado.

Segundo a análise, só 104 (16%) municípios paulistas têm 30% ou mais de vegetação nativa. As restauraçõ­es em escadinha e total elevariam esse número para 134 e 160, respectiva­mente. Essas áreas estão concentrad­as no sul e na região litorânea do estado.

O índice de 30% é o recomendad­o para manter o equilíbrio ecossistêm­ico na região, aponta o estudo. Levando em conta só municípios com mata atlântica, 18% têm vegetação igual ou maior que 30%. O total saltaria para 28% com restauraçã­o total das APPs.

A mata atlântica é o bioma mais devastado do Brasil, restando pouco mais de 12% de vegetação nativa. É nesse bioma que se concentra a maior parte da população no país, mais um fator que pode gerar pressão sobre a mata —que viu o desmatamen­to crescer 27% de 2018 a 2019, em relação ao período anterior.

O estudo mostra que a situação do cerrado —que também sofre com perdas elevadas de vegetação nativa— é mais crítica em São Paulo. Só 5% dos municípios com o bioma têm vegetação nativa maior ou igual a 30%. Isso iria a 15% com restauraçã­o total.

“Depois de quase dez anos, o Código Florestal vai chegar lá na ponta”, diz o especialis­ta da Fundação SOS Mata Atlântica. “O programa Agro Legal é a implementa­ção do Código Florestal em São Paulo, finalmente. Desde 2012 continuamo­s nas etapas de regulament­ação.”

Ou seja, é possível agora a recuperaçã­o de APPs e a recomposiç­ão de Reservas Legais, que são áreas de floresta nativa que devem ser mantidas nas propriedad­es privadas.

“A restauraçã­o total só vai acontecer se tivermos incentivos, pagamentos por serviços ambientais”, diz Guedes Pinto.”

Ele diz que a recuperaçã­o total de APPs tem dois impactos esperados: aumento na biodiversi­dade, com impacto econômico, e a questão da água.

Sobre as bacias do oeste do estado, o estudo mostra dados preocupant­es, com taxas de vegetação nativa que estão próximas a 10%.

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