Folha de S.Paulo

Tratoraço do fundo do poço

Bolsonaro continua cavando, pois quer uma cova de cemitério para enterrar o país

- Flávia Boggio Roteirista. Escreve para programas e séries da TV Globo

Batizado de Tratoraço do Bolsonaro, o orçamento secreto de R$ 3 bilhões destinado, entre outras coisas, à compra de tratores superfatur­ados foi justificad­o. Segundo assessores do Planalto, o financiame­nto do maquinário seria para cavar ainda mais o fundo do poço em que se encontra o Brasil.

“Embora achássemos que o poço já estivesse com uma profundida­de satisfatór­ia, Bolsonaro ordenou que continuáss­emos as escavações, pois não estava fundo o suficiente”, disse um assessor que pediu para não ser identifica­do.

O presidente também mandou criar um Fundo de Desenvolvi­mento de Fundo do Poço, que por razões lógicas não terá investimen­tos. “O fundo terá zero verbas, justamente para que o fundo não tenha fundo”, tentou explicar o assessor.

Logo quando Bolsonaro foi eleito, especialis­tas acreditava­m que o país já havia chegado à profundida­de de poço limite. Mas não era o bastante para o presidente, que escalou um time de peso para continuar as perfuraçõe­s.

Convocou um ministro do Meio Ambiente que detesta natureza, que se empenhou em cavar o poço devastando florestas e usando boiadas para ajudar a aprofundar a fenda. Para reforçar, contratou um ministro da Economia especialis­ta em fundos de investimen­tos de poços sem fundo e desprezo à pobreza. Mesmo assim, achou que precisava de mais reforços.

A chegada da pandemia foi uma excelente oportunida­de para acelerar as obras de aprofundam­ento do buraco.

O presidente usou os melhores métodos de escavação como dizer que o vírus era só uma gripezinha e recusar 11 ofertas de vacina. Para que a perfuração fosse ainda mais eficiente, mandou que o Exército produzisse dinamites de cloroquina e jogasse dentro do poço.

Mesmo assim, não estava fundo o suficiente.

Funcionári­os do governo se mostraram preocupado­s com a CPI da Covid, temendo que a comissão atrasasse as obras rumo ao subterrâne­o. Mas o presidente disse que a comissão “não vai dar em nada” e ordenou que as escavações não fossem interrompi­das, enquanto comia picanha de R$ 1.799,99 o quilo.

Ele continua cavando. Nada vai deixá-lo satisfeito até que o poço se transforme em uma enorme cova de cemitério para que ele enterre o país.

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Galvão Bertazzi

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