Folha de S.Paulo

Doria avalia troca no 1º escalão para ampliar espaço do MDB

- José Marques e Carolina Linhares

Para acalmar insatisfaç­ões na base aliada e angariar apoio para as eleições de 2022, o governador João Doria (PSDB) avalia ceder espaço no primeiro escalão do Governo de São Paulo ao MDB e trocar o atual secretário de Agricultur­a e Abastecime­nto, Gustavo Junqueira, que é da cota pessoal do governador.

A indicação atenderia à bancada do MDB na Assembleia Legislativ­a, e a tendência é que o líder Itamar Borges seja o escolhido. A situação, embora aproxime os emedebista­s ao projeto de Doria, é vista com ressalvas porque o deputado é condenado criminalme­nte em segunda instância por desvios de verbas da educação.

Em nota, o Governo de SP afirmou que “Gustavo Junqueira segue como secretário de Agricultur­a e qualquer insinuação sobre sua saída não passa de mera especulaçã­o”.

Itamar é ex-prefeito de Santa Fé do Sul, cidade próxima às divisas com MG e MS, e influente na região. No ano passado, o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) aplicou a ele pena de cinco anos e três meses por crime de responsabi­lidade em licitação fraudulent­a.

A acusação diz que ele participou de esquema que desviou em 1996, em valores atualizado­s, R$ 2 milhões de verbas federais da educação. Ele nega ter cometido irregulari­dades e recorre da decisão.

Membros de MDB, PSDB e Palácio dos Bandeirant­es ouvidos pela Folha admitem, nos bastidores, que a negociação para a troca de Junqueira está em curso. Há a possibilid­ade de o movimento envolver outra secretaria ou outros nomes do MDB, e o atual secretário pode ficar no governo em outra função. Junqueira é produtor rural, presidiu a Sociedade Rural Brasileira e foi escolha pessoal do governador.

Parte do governo paulista tem considerad­o, porém, que a interlocuç­ão de Junqueira com o agronegóci­o é insatisfat­ória, inclusive por ele ser membro do setor. A avaliação é que ele teve reação tímida a manifestaç­ões e “tratoraços” de agricultor­es contra o fim de isenções de ICMS na gestão Doria, além de não cobrar o cumpriment­o de acordos feitos entre o governo e o segmento.

A aproximaçã­o do MDB ajuda a sepultar a possibilid­ade de o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disputar pelo partido a eleição ao governo em 2022.

A acomodação do partido é também uma costura para fortalecer a candidatur­a do vicegovern­ador, Rodrigo Garcia, que está de saída do DEM e deve se filiar ao PSDB nesta sexta (14). Garcia é o nome apoiado por Doria para sucedê-lo.

Por enquanto, não há negociaçõe­s de cargos além da secretaria ao MDB. Ainda de acordo com políticos ouvidos pela reportagem, a troca no primeiro escalão só deve ocorrer após a filiação do vice. A migração partidária de Garcia vem sendo objeto de pressão de Doria e abriu atritos com o DEM.

Emedebista­s afirmam, porém, que o acordo envolve o MDB de São Paulo e, embora indique aproximaçã­o no nível nacional com Doria, não significa que o partido tenha acertado apoio ao tucano na corrida pela Presidênci­a.

Procurado, o presidente do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP), não comentou.

Embora o MDB não tenha participad­o da coligação que elegeu Doria, o argumento do partido para ampliar espaço em São Paulo é o de que a legenda forma a base de sustentaçã­o na Assembleia e é a única não contemplad­a por uma pasta. O DEM tem a vice e a Secretaria de Governo, com Garcia, e a Secretaria de Logística e Transporte­s. O Republican­os ocupa a pasta dos Esportes.

Além dos nomes do PSDB em cinco pastas, Alexandre Baldy (PP) e Henrique Meirelles (PSD) terminam de compor o secretaria­do político —embora sejam vistos como escolhas pessoais, não partidária­s.

Doria estruturou seu secretaria­do com base em escolhas pessoais e técnicas, abrindo pouco espaço a partidos aliados —o que agora cobra seu preço na tentativa de alianças para 2022. Para driblar o entrave, o governador tem cedido em movimentos recentes.

Também passou por Doria, Garcia e Baleia Rossi, um aliado do tucano, a indicação de Ricardo Nunes (MDB) para a vaga de vice na chapa do prefeito Bruno Covas (PSDB) em 2020.

Na época, aliados de Covas apontaram que a aliança visava aproximar o MDB do projeto eleitoral de Doria e Garcia e compensá-los pela falta de composição no governo estadual. Mas não foi suficiente.

No mês passado, houve nova tentativa de atrair o MDB com a indicação de Itamar como líder de governo na Assembleia, algo que não vingou.

Procurado, o gabinete de Itamar Borges diz que ele não recebeu convite formal. E, sobre a condenação, sua assessoria diz que a licitação “seguiu todos os trâmites legais, tanto que a prestação de contas do convênio foi aprovada” pelos Tribunais de Contas do Estado e da União. Ele recorre aos tribunais superiores.

Gustavo Junqueira não se manifestou.

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