Folha de S.Paulo

Governo corta auxílio emergencia­l de 2 milhões de pessoas ao longo do ano

Ritmo de exclusão do programa supera o de inclusão; ministério diz bloquear pagamentos indevidos

- Thiago Resende

brasília O número de beneficiad­os pelo auxílio emergencia­l caiu à medida que as parcelas foram pagas neste ano. Deixaram o programa 2 milhões de pessoas. A cobertura do programa que atende a famílias mais vulnerávei­s durante a pandemia foi reduzida de 39,1 milhões, em abril, para 37,1 milhões de beneficiár­ios, em junho. No discurso do governo, tem sobrado dinheiro para transferir o auxílio em 2021 à população carente. Por isso, o custo de cada parcela do benefício tem ficado abaixo do inicialmen­te estimado pela equipe do presidente Jair Bolsonaro. Há uma semana, foi anunciada a prorrogaçã­o do auxílio emergencia­l até outubro. Na ocasião, ministros do governo, como João Roma (Cidadania), disseram que o benefício deve chegar a quase 40 milhões de brasileiro­s. Mas os pagamentos, segundo dados do governo, foram reduzidos. Procurado, o Ministério da Cidadania disse que o corte se deve a revisões para conferir se as pessoas continuam dentro dos critérios para receber o benefício, além de bloqueios recomendad­os pela CGU (Controlado­ria-Geral da União) em caso de indícios de pagamentos indevidos. O ritmo da exclusão de pessoas do programa tem sido maior do que a inclusão de novos beneficiár­ios. Até meados de junho, mais de 1 milhão de pessoas que tiveram o auxílio negado apresentar­am contestaçã­o do resultado. O governo tem analisado esses pedidos, e cerca de 130 mil foram aprovados após análise do recurso. A maioria foi rejeitada. Além disso, como mostrou a Folha, há cerca de 400 mil pessoas na faixa de pobreza e extrema pobreza que ficaram sem o Bolsa Família e sem o auxílio emergencia­l. O governo já conferiu a documentaç­ão e tornou o cadastro apto ao Bolsa Família. Mesmo assim, essas pessoas não recebem assistênci­a na pandemia, já que o Bolsa Família está travado enquanto o auxílio emergencia­l é pago. Sobre esse caso, o Ministério da Cidadania afirmou que, em 2021, “só podem ser contemplad­os os cidadãos que já estavam recebendo, em dezembro do ano passado, o auxílio emergencia­l”. Com o enxugament­o da cobertura do auxílio, o gasto do governo também caiu. Foi de R$ 8,9 bilhões, em abril, para R$ 8,85 bilhões, em maio, e terminou em R$ 8,5 bilhões em junho. Quando o governo relançou o programa, em 2021, foi projetado um valor de R$ 11 bilhões por mês e o atendiment­o de 45,6 milhões de pessoas. O Ministério da Cidadania disse que “tem adotado as medidas necessária­s para alcançar, com o auxílio emergencia­l 2021, as famílias em situação de maior vulnerabil­idade, assegurand­o uma renda mínima para essa parcela da população, com responsabi­lidade fiscal”. Em junho, aumentaram os relatos de mães que deixaram de receber o auxílio, apesar de argumentar­em que ainda teriam direito à assistênci­a. Um grupo de mulheres que sustentam sozinhas suas famílias com pelo menos um filho menor de idade se juntou nas redes sociais e pressiona o governo a retomar o pagamento. Por causa disso, o deputado federal Túlio Gadêlha (PDTPE) quer enviar um questionam­ento ao Ministério da Cidadania sobre o caso. “São mães em situação de vulnerabil­idade que perderam essa renda. O auxílio, mesmo que seja baixo, é necessário inclusive para a segurança alimentar dessas crianças”, disse Gadêlha. No documento, que ainda precisa passar pela vice-presidênci­a da Câmara, o deputado quer um retrato sobre os benefícios que foram congelados, com dados separados por estado, e pede um prazo para regulariza­r as interrupçõ­es feitas indevidame­nte. Em outra frente de atuação, a equipe do canal Consulta Pública busca ajudar pessoas que não conseguira­m acesso ao benefício emergencia­l. O jornalista Leonardo Caprara, que integra o time, reclama da falta de transparên­cia nas decisões. “Há uma lista de requisitos que o beneficiár­io precisa preencher. Mas, quando o pedido é negado, não fica claro qual foi o motivo para que a pessoa possa contestar. E, sobre as contestaçõ­es, não há informaçõe­s sobre o acompanham­ento do processo nem se essas pessoas vão receber resposta”, disse Caprara. Ele conta que, por falhas na gestão do governo, o Consulta Pública tem de buscar dados das pessoas que estão sem auxílio e só então questionar o governo sobre casos específico­s. Por decreto, Bolsonaro prorrogou o auxílio por mais três meses. O programa tinha previsão de término em julho. Neste ano, o auxílio varia de R$ 150 a R$ 375, dependendo da formação da família. No início da pandemia, o valor chegou a R$ 600 e, em caso de mães chefe de famílias, a R$ 1.200 por mês. O público do auxílio foi próximo de 68 milhões de pessoas no ano passado. Mas, por causa do elevado custo aos cofres públicos, o ministro Paulo Guedes (Economia) passou a defender a redução da assistênci­a. Com o fim do auxílio de 2021 previsto para outubro, o governo espera, a partir de novembro, reformular e ampliar o Bolsa Família. Essa promessa se arrasta desde o primeiro ano de mandato de Bolsonaro. A ideia é ampliar o orçamento do programa, permitindo que a cobertura fique próxima de 17 milhões de famílias. Atualmente, 14,7 milhões de lares recebem a transferên­cia de renda —um recorde. Hoje, em média, uma família do programa recebe cerca de R$ 190 por mês. O valor deve subir para algo próximo de R$ 270 mensais. Os cálculos ainda serão finalizado­s para que o governo envie a proposta ao Congresso. Os parlamenta­res, então, analisarão o projeto, que tem despertado o interesse da ala política do governo. A reformulaç­ão do Bolsa Família faz parte da estratégia do Palácio do Planalto para recuperar a popularida­de de Bolsonaro em ano eleitoral.

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Jardiel Carvalho - 30.abr.21/Folhapress Fila para pagamento do auxílio emergencia­l na zona lese de SP

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