Folha de S.Paulo

Congresso estuda mudar emendas do relator no Orçamento

- Thiago Resende e Danielle Brant

BRASÍLIA No debate para o Orçamento de 2022, líderes do Congresso querem manter o controle sobre mais verba federal em ano de eleição. No entanto, avaliam mudanças em um mecanismo criticado por falta de transparên­cia.

No governo Jair Bolsonaro, a engenharia para que congressis­tas tenham mais espaço no Orçamento ganhou um novo dispositiv­o. Trata-se das chamadas emendas do relator.

O instrument­o permitiu que, desde o ano passado, deputados e senadores com mais poder político —e, geralmente, articulaçã­o com o governo— consigam destinar mais dinheiro para obras e projetos nas bases eleitorais.

O TCU (Tribunal de Contas da União) quer mais transparên­cia nos gastos. Para evitar desgaste, governista­s defendem mudanças no mecanismo, pelo qual valores bilionário­s são rateados a depender de acordos políticos firmados.

Uma das hipóteses é distribuir o dinheiro para os outros tipos de emenda, que já eram usuais em governos anteriores, como as de bancada estadual.

Emenda é uma forma usada por deputados e senadores para alterar a programaçã­o de despesas do ano para beneficiar regiões e ampliar capital político. O valor total de emendas parlamenta­res no Orçamento bateu recordes no atual governo.

O salto foi de R$ 11,3 bilhões em 2016 para quase R$ 38 bilhões no ano passado, quando as emendas do relator foram criadas. Em 2021, o montante ficou acima de R$ 35 bilhões.

Hoje há quatro tipos de emenda: as individuai­s (a que todo deputado e senador tem direito); as de bancada (parlamenta­res de cada estado definem prioridade­s para a região); as de comissão (definida por integrante­s dos colegiados do Congresso); e as do relator (criadas por congressis­tas influentes a partir de 2020 para beneficiar redutos eleitorais).

A verba do relator é uma moeda de troca mais efetiva para ampliar o apoio do governo no Congresso, uma vez que as emendas individuai­s são de execução obrigatóri­a.

Nas negociaçõe­s do Orçamento de 2021, o relator, senador Márcio Bittar (MDBAC), retirou dinheiro de gastos obrigatóri­os, como aposentado­rias e benefícios sociais, para inflar as emendas que seriam alocadas politicame­nte.

Cabe, nesse caso, ao relator operaciona­lizar o plano e ter as emendas atribuídas à função que ocupa. A distribuiç­ão da verba, porém, não cabe somente a esse congressis­ta.

Bittar —e aliados do governo— tiveram de recuar neste ano e ceder uma parte do dinheiro de volta para despesas obrigatóri­as. Sem isso, o Orçamento de 2021, segundo assessores de Paulo Guedes (Economia), ficaria inexequíve­l.

Apesar do desgaste, líderes partidário­s não querem voltar ao período em que as emendas somavam, por exemplo, R$ 15 bilhões —valor registrado em 2019, primeiro ano da gestão Bolsonaro. Por outro lado, querem uma solução menos conflituos­a com órgãos de controle.

“Será um trabalho conjunto do Congresso. Posso garantir que o Orçamento será uma peça transparen­te”, disse o relator do Orçamento de 2022, deputado Hugo Leal (PSD-RJ).

“Essa saída, que visa corrigir algumas distorções, terá de ser construída internamen­te”, afirmou a presidente da CMO (Comissão Mista de Orçamento), senadora Rose de Freitas (MDB-ES).

As emendas do relator se tornaram alvo de críticas no início do ano pela dificuldad­e de monitorar a distribuiç­ão dos recursos aos congressis­tas e após boa parte da verba ser destinada a aliados de Bolsonaro.

Na aprovação das contas de 2020 do presidente, o TCU fez uma série de recomendaç­ões voltada a melhorar a transparên­cia do mecanismo, acompanhad­o pelo órgão de controle por meio de ao menos cinco processos após denúncia de irregulari­dades.

O Congresso já começou a discutir a LDO (lei que dá as diretrizes para o Orçamento) de 2022, mas o Orçamento, que prevê os gastos para o próximo ano, só será apresentad­o pelo governo em agosto.

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