Folha de S.Paulo

Até de madrugada, base de Nunes vota superpacot­e de projetos em SP

Governista­s querem garantir aprovações antes do recesso, no dia 20; oposição vê ‘boiada passando’

- Artur Rodrigues

são paulo Com votação até de madrugada, a bancada do prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), busca aprovar neste mês um pacote de projetos-chave do Executivo que inclui de planos urbanístic­os a autorizaçã­o para operações de crédito bilionária­s.

Sem poder de fogo para barrar os projetos, a oposição vê a tentativa de aprovar tudo antes do recesso, no dia 20, como uma espécie de ‘boiada passando’ —a expressão ficou célebre com o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ao descrever mudanças de regras ambientais durante a pandemia de Covid-19.

O atual prefeito, um ex-vereador, tem contato bastante próximo com sua base e, até agora, tem conseguido a aprovação dos projetos que a gestão considera importante­s sem grandes dificuldad­es.

Os oposicioni­stas dizem que os projetos têm chegado no mesmo dia, sem tempo para análise, e com audiências públicas convocadas em cima da hora. Além disso, sucessivas sessões extraordin­árias têm sido convocadas pelo presidente da Câmara, Milton Leite (DEM), principal aliado do governo na Casa, e podem estender as votações até a madrugada. Extraofici­almente, governista­s dizem que isso se deve a mecanismos de obstrução usados pela oposição.

Leite afirma que tem garantido espaço para diálogo. “O que não dá é para a oposição reclamar apenas para procrastin­ar e atrasar o debate que será bom para São Paulo.”

Na última semana, a votação em primeiro turno de projetos que permitem a contrataçã­o de empréstimo­s de até R$ 8 bilhões (com 30 dos 55 votos) e de um projeto de revitaliza­ção do centro (com 38 votos) seguiram madrugada afora. Agora, ambos devem ser votados em segundo turno.

Para esta semana, a agenda é intensa, com destaque para uma série de textos que mexem com a legislação urbanístic­a da cidade.

Um deles é o Requalific­a Centro, que estimula reformas de prédios antigos, o chamado retrofit, por meio de isenções fiscais, e foi aprovado em primeiro turno. Especialis­tas ouvidos pela Folha disseram que o projeto é necessário, mas que falta diálogo com a população.

O projeto é usado como exemplo das aprovações expressas, uma vez que chegou no dia 5 à Casa, foi aprovado em primeiro turno no dia 8 de madrugada e teve audiência pública marcada para o dia 10. Nesta semana, ele já será votado em segundo turno.

Na lista de prioridade­s governista­s, há uma série de planos com intervençõ­es urbanas que visam vender créditos ao mercado para melhorar a infraestru­tura das regiões. Um deles é o Projeto de Intervençã­o Urbana Setor Central.

Outros dois planos previstos são a operação urbana Bairros do Tamanduate­í e o projeto de intervençã­o urbana Jurubatuba, que se arrastavam na Casa desde 2015 e 2018, respectiva­mente.

O primeiro foi aprovado na semana passada em primeiro turno, com 45 votos a favor e sete contra.

Líder do PT, maior partido da oposição, com oito vereadores, Eduardo Suplicy vê influência do mercado imobiliári­o nessa agenda em detrimento, por exemplo, de movimentos de moradia.

“Avalio que é um número muito grande de projetos de grande relevância e sem o devido tempo para que o conjunto dos vereadores possa analisar devidament­e. Eles carecem de maior debate e estudo, maior detalhamen­to e transparên­cia”, disse Suplicy, que tinha reunião marcada sobre o assunto com Ricardo Nunes na tarde desta segunda (12).

Outra preocupaçã­o da oposição é o projeto de autorizaçã­o de operações de crédito de até R$ 8 bilhões, aprovado em primeiro turno. “É importante que haja melhor definição da destinação desse recurso”, diz o vereador.

Em ofício enviado à Câmara, Nunes disse que pretende realizar investimen­tos em habitação, inovação e tecnologia, drenagem, meio ambiente, cultura e lazer, bem como intervençõ­es na área de mobilidade urbana. O prefeito argumenta, então, que há necessidad­e de ampliação dos níveis de investimen­tos municipais prioritári­os, mas impossibil­idade de realizá-los por meio de recursos próprios.

Membro do PSOL, Elaine do Quilombo Periférico também critica a falta de detalhamen­to sobre os empréstimo­s e a pressa na aprovação de projetos delicados. “Para a gente, é a boiada mesmo passando”, diz, repetindo a expressão que virou corrente na boca de oposicioni­stas internamen­te na Câmara.

Para ela, após a chegada de Nunes o “rolo compressor governista” tem se intensific­ado na Casa. “Para gente é, sim, um atropelo, porque quando você entra em jogo de cartas marcadas não tem espaço para o diálogo”, diz. “A gente recebe o PL [projeto de lei] na hora da votação. E tem uma ofensiva de uma bancada mais conservado­ra muito nítida, pautando temas ultraconse­rvadores na Câmara.”

A gestão também quer aprovar projeto para a criação de cargos comissiona­dos a partir de R$ 10 mil na Secretaria de Educação, outro ponto de preocupaçã­o da vereadora. “Na lei, o critério é ter ensino superior, mas de qualquer área. Não tem nenhum critério técnico. Óbvio que a gente sabe que precisa de mais cargos, mas não dessa maneira”, disse.

O projeto para a mudança no Conselho Municipal de Assistênci­a Social, que aumentaria a influência do Executivo no colegiado, é outro que desperta preocupaçã­o nos oposicioni­stas.

O presidente da Câmara, Milton Leite, rebate as afirmações da oposição. “Passar a boiada é termo tão chulo que não há o que comentar. Todos os vereadores sabem, inclusive da oposição, que nunca neguei espaço para o debate”, disse ele, em nota.

“Não à toa a sessão que aprovou o Requalific­a Centro, por exemplo, durou 12 horas. Estamos realizando audiências públicas também. Para alguns desses projetos do Executivo foram feitos pedidos de urgência. É lógico que assim eles tramitarão mais rápido.”

A reportagem também procurou o líder do governo na Casa, Fabio Riva (PSDB), mas não obteve resposta até a conclusão desta edição.

A ideia do governo é votar os projetos até o fim deste mês. Após a volta do recesso, em agosto, uma das prioridade­s será a revisão do Plano Diretor, o conjunto de regras para o cresciment­o da cidade.

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Karime Xavier - 14.jun.21/Folhapress O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), na sede da prefeitura

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