Folha de S.Paulo

Wes Anderson reafirma sua graça em Cannes

‘A Crônica Francesa’ celebra o jornalismo com narrativas de revista fictícia baseadas em casos célebres da vida real

- Ana Estela de Sousa Pinto

cannes (frança) “A Crônica Francesa” é o nome de uma revista fictícia do século passado que “levou o mundo para Kansas” e vai morrer junto com seu dono. Mas é também 107 minutos encantador­es, no décimo longa de Wes Anderson, que estreou nesta segunda no Festival de Cannes.

A história começa com a criação da revista pelo jornalista Arthur Howitzer Jr., vivido por Bill Murray. A inspiração veio de Harold Ross, cofundador da americana The New Yorker.

Howitzer é um publisher excêntrico que morre logo no começo e deixa instruções sobre seu funeral. Entre elas está a de que o próximo número da publicação, com seu obituário, será também o último.

Três capítulos então se seguem, representa­ndo cada seção da revista —artes e artistas, política e sociedade e “tortas e aromas”, no que é descrito oficialmen­te como “uma declaração de amor aos jornalista­s”.

A reportagem cultural mostra o psicopata Moses Rosenthale­r, vivido por Benicio del Toro, que faz telas tendo como modelo Simone, papel de Léa Seydoux, guarda da prisão.

Rosenthale­r é transforma­do em expoente da arte por um personagem baseado no barão Duveen, morto em 1939, um dos maiores negociante­s de arte de todos os tempos. Foi a série “Os Dias de Duveen”, publicada pela New Yorker, que inspirou esse capítulo.

Outro artigo da revista sobre o movimento estudantil em maio de 1968 inspirou o capítulo político, em que Timothée Chalamet interpreta um líder estudantil e se envolve com uma jornalista que tem idade para ser sua mãe, vivida por Frances McDormand.

Na seção de gastronomi­a, Jeffrey Wright vive um jornalista inspirado no escritor James Baldwin e no repórter AJ Liebling. Na trama, o tenente e chef de cozinha Nescaffier se torna a chave para resgatar o filho de um comissário de polícia sequestrad­o.

É do comediante Stephen Park, que vive o cozinheiro, uma das melhores tiradas no filme. Obrigado a provar os pratos antes de os servir à quadrilha, ele se intoxica. Antes de ser socorrido, filosofa “o veneno me fez descobrir um novo sabor, um pouco amargo, acre, terroso, até então desconheci­do”. “Na minha idade, isso é muito raro.”

“A Crônica Francesa” é mais um bom exemplo de por que o diretor americano já virou nome de uma categoria de cinema. É original, divertido, fácil de ver e bem enquadrado.

Também alterna sem solavancos trechos em branco e preto com outros em cores suaves, que são sua marca.

As imagens do chamado tapete vermelho também revela parte do seu sucesso —ao lado de Anderson estavam Tilda Swinton, Bill Murray, Benicio del Toro, Adrien Brody e Timothée Chalamet. Faltou Léa Seydoux, que precisou cancelar a viagem após um teste positivo para coronavíru­s.

Wes Anderson volta ao Festival de Cannes quase dez anos depois de competir pela Palma de Ouro com “Moonrise Kingdom”, em 2012. A obra estava pronta para a edição do ano passado, cancelada por causa da pandemia.

Anderson, assim como Nanni Moretti, preferiu segurar o lançamento para ganhar as telas do evento presencial retomado neste ano.

O americano já concorreu várias vezes ao Oscar, por “Moonrise Kingdom”, “Os Excêntrico­s Tenenbaums” e “O Grande Hotel Budapeste”. Em 2018, a animação, “Ilha dos Cachorros” deu a Anderson o Urso de Prata de melhor diretor no Festival de Berlim.

Depois de filmar na França, Anderson começa em setembro a rodar seu novo projeto nos arredores de Madri, e deve mais uma vez ter a atriz Tilda Swinton no elenco.

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Divulgação Elisabeth Moss, Owen Wilson, Tilda Swinton, Fisher Stevens e Griffin Dunne em cena de ‘A Crônica Francesa’

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