Folha de S.Paulo

Proposta alivia IR a empresas e abre rombo de R$ 30 bi

Pela proposta original do governo, reforma elevaria arrecadaçã­o em R$ 6,15 bi

- Bernardo Caram, Danielle Brant e Fábio Pupo

Sob pressão de empresário­s, a nova proposta de reforma do IR prevê corte de 12,5 pontos percentuai­s no tributo sobre pessoas jurídicas, disse o relator, deputado Celso Sabino (PSDBPA). Isso levaria a perda de quase R$ 30 bilhões anuais em receita.

brasília Após pressão de empresário­s, a nova versão da proposta de reforma do IR (Imposto de Renda) prevê um corte de 12,5 pontos percentuai­s no tributo sobre empresas, disse o relator do texto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA).

Com forte alívio na tributação das pessoas jurídicas, o parecer inverte a tendência da proposta original do governo, que geraria ganhos de R$ 6,15 bilhões em arrecadaçã­o, e passa a prever uma perda final de quase R$ 30 bilhões nas receitas federais por ano.

A proposta apresentad­a em 25 de junho pela equipe do ministro Paulo Guedes (Economia) propunha uma redução da alíquota do IR de empresas dos atuais 15% para 10%, com escaloname­nto de 2,5 pontos percentuai­s no primeiro ano e mais 2,5 pontos no segundo ano. A tributação adicional de 10% sobre lucros acima de R$ 20 mil continuari­a valendo.

Agora, o relator cortou a alíquota base de forma mais radical —de 15% para 2,5%. Pela nova proposta, haverá uma redução de 10 pontos percentuai­s no primeiro ano de vigência e mais 2,5 pontos no segundo.

Para a pessoa física, não houve ampliação dos benefícios propostos. O parecer preliminar, apresentad­o a líderes partidário­s nesta terçafeira (13), mantém a elevação da faixa de isenção dos atuais R$ 1.900 para R$ 2.500. Também fica inalterada a proposta de permitir o desconto padrão da declaração simplifica­da apenas a pessoas com renda anual de até R$ 40 mil.

O corte na alíquota de IR para empresas retira, sozinho, R$ 74 bilhões da arrecadaçã­o federal em 2022 e R$ 98 bilhões a partir de 2023 (na versão original do governo, a previsão era de aproximada­mente R$ 20 bilhões e R$ 40 bilhões, respectiva­mente).

Para compensar a perda nessa e em outras medidas, Sabino disse que buscou diferentes fontes. Será proposto um corte de incentivos tributário­s para empresas das áreas de cosméticos, perfumaria, medicament­os e produtos químicos.

Além disso, ele diz que haverá tributação sobre aeronaves e embarcaçõe­s. “Se você for comprar um iate, ou um jato, você não paga boa parte dos tributos. Estamos tirando esses benefícios”, disse.

O projeto também retira benefícios tributário­s de empresas de geração de termelétri­cas no PIS e Cofins, usados na aquisição de carvão e gás. Segundo ele, o setor já foi amplamente beneficiad­o com o projeto de capitaliza­ção da Eletrobras.

“Vamos cortar alguns subsídios de quatro setores que atingem 20 mil empresas ativas. E, em contrapart­ida, essa redução no imposto das pessoas jurídicas vai beneficiar 1,1 milhão de empresas”, disse.

Em outra frente, o relator informou que também está propondo tributar o recebiment­o de auxílio-moradia e auxílio-transporte por agentes públicos, como políticos e juízes. Além disso, ele afirmou que está usando a previsão de economia com o corte de supersalár­ios de servidores públicos (aprovado na Câmara nesta terça e que seguirá em tramitação no Senado).

Ainda assim, o relator afirmou que o resultado da proposta será negativo para as contas do governo.

Para 2023, o custo total das novas regras será de R$ 115 bilhões, enquanto os ganhos com as medidas compensató­rias é estimado em R$ 85 bilhões. Com isso, a previsão é de uma perda total de praticamen­te R$ 30 bilhões.

Sabino afirmou que essa perda será compensada por meio do ganho de arrecadaçã­o de impostos estimado pelo Ministério da Economia com a recuperaçã­o da atividade. Segundo ele, a ideia recebeu o aval de Guedes.

“A nossa aposta é no incremento da arrecadaçã­o prevista pelo ministério no segundo semestre. E estamos apostando no Brasil, a gente acredita que essa medida fomenta a economia e traz mais arrecadaçã­o”, disse o relator. “Estamos reduzindo a carga de quem produz, gera emprego e empreende no Brasil.”

Sem fazer uma compensaçã­o orçamentár­ia, no entanto, o projeto deixa um buraco nos dados da arrecadaçã­o que contribui para o desequilíb­rio nas contas do Tesouro —que estão em déficit desde 2014. A dívida pública decorrente do desequilíb­rio é paga pelo país como um todo.

Nelson Marconi, coordenado­r do Centro de Estudos do Novo Desenvolvi­mentismo da FGV EAESP, afirma que a proposta vai na direção contrária ao discurso da equipe econômica de necessidad­e de equilíbrio fiscal.

“É contrário ao ajuste fiscal e [à tarefa de] equilibrar as contas, num momento em que o governo ainda tem que gastar com políticas sociais e precisa gastar mais com investimen­to público”, afirma. “Está na cara que vai piorar a situação fiscal. É uma loucura.”

Nas últimas semanas, Guedes vinha dizendo a interlocut­ores que concordari­a com eventual perda de receita na reforma, com o argumento de que o expressivo aumento de arrecadaçã­o nos últimos meses permite ao governo fazer experiment­os na reforma.

Sobre a insuficiên­cia de medidas para neutraliza­r o efeito fiscal do projeto, técnicos da pasta argumentam que a Lei de Responsabi­lidade Fiscal permite que reduções de tributação sejam feitas sem compensaçã­o, desde que sejam lineares e amplas. A legislação exige que essa renúncia de receita seja prevista no Orçamento e não comprometa o cumpriment­o da meta fiscal.

De acordo com o deputado, será mantida a proposta do governo de extinguir a isenção de dividendos, com instituiçã­o de alíquota de 20% sobre a distribuiç­ão desses recursos. Também fica inalterada a faixa de isenção de R$ 20 mil mensais para esses ganhos.

Nesse ponto, apenas será retirado o trecho que prevê a taxação sobre a distribuiç­ão de dividendos entre empresas do mesmo grupo.

O relator também afirmou ter eliminado do texto o que chamou de “pacote de medidas acessórias” que vinham sendo criticadas, como o fim da isenção para fundos imobiliári­os, e ainda aumentou a possibilid­ade de empresas usarem o chamado lucro presumido (mecanismo de apuração mais simples).

Segundo ele, também foi retirada a previsão de come-cotas (cobrança antecipada do IR) para aplicações em fundos de investimen­to em infraestru­tura, agronegóci­os e logística e de fundos exclusivos para estrangeir­os.

As alterações no texto foram negociadas com o Ministério da Economia e são uma resposta à onda de críticas feitas por empresário­s à versão inicial enviada pelo governo ao Congresso no fim de junho.

O governo planeja que o projeto seja aprovado ainda neste ano, para valer em 2022 e gerar respaldo orçamentár­io para o Bolsa Família em ano eleitoral (graças às medidas de aumento de arrecadaçã­o). Tanto o relator como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PPAL), evitaram prever quando o projeto será votado.

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Najara Araújo - 29.abr.21/Câmara dos Deputados O deputado Celso Sabino (PSDB-PA), relator da reforma do IR
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