Folha de S.Paulo

Cúpula do MPF pede a Aras ação contra Bolsonaro por abuso de poder

- Marcelo Rocha

brasília Cinco integrante­s do Conselho Superior do Ministério Público Federal pediram ao procurador-geral da República, Augusto Aras, que investigue o presidente Jair Bolsonaro pelo crime de abuso de poder.

“As declaraçõe­s do sr. presidente da República parecem ultrapassa­r os limites do mero [e intangível] exercício do direito constituci­onal à liberdade de expressão”, afirmaram eles, em representa­ção enviada a Aras nesta terça-feira (13).

“Têm-se aí indicativo­s da necessidad­e de pronta atuação do procurador-geral da República, na condição de procurador-geral Eleitoral, ante seu papel constituci­onal de defesa do regime democrátic­o e do livre exercício do direito de sufrágio.”

O documento pede que sejam coletados “elementos potencialm­ente evidenciad­ores de abuso de poder de autoridade, atentatóri­os à existência e à normalidad­e da eleição presidenci­al de 2022”.

O levantamen­to de informaçõe­s visa a municiar eventuais medidas judiciais considerad­as cabíveis por parte da Procurador­ia perante o TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O posicionam­ento veio na esteira de declaraçõe­s de Bolsonaro, que afirma que as eleições de 2022 podem não ocorrer caso não exista um sistema eleitoral confiável —segundo ele, o voto impresso.

A escalada golpista do presidente acontece em um contexto de pesquisas de opinião que apontam picos de rejeição e amplo favoritism­o do ex-presidente Lula (PT) na corrida de 2022.

Bolsonaro subiu o tom de suas ameaças e, sem apresentar provas, insiste que haverá fraude no ano que vem e que o resultado do pleito já estaria definido.

Os autores da representa­ção a Aras disseram ainda que o fenômeno do abuso de poder é “multifacet­ado, podendo materializ­ar-se mediante a inversão, a subversão ou, até mesmo, por meio da supressão das ‘regras do jogo democrátic­o’”.

Aras preside o Conselho Superior, órgão máximo de deliberaçã­o administra­tiva na estrutura do Ministério Público Federal. Ele tem sido criticado por seus pares por se silenciar a respeito das declaraçõe­s de Bolsonaro e por representa­ntes da oposição no Congresso.

Os cinco subprocura­dores que cobram providênci­as do chefe do Ministério Público Federal representa­m metade do colegiado. Entre eles, estão os três nomes das lista tríplice ao cargo de procurador-geral da República entregue recentemen­te a Bolsonaro.

O documento foi assinado por José Adônis Callou de Araújo Sá, Mario Bonsaglia, Luiza Frischeise­n, Nicolao Dino e José Elaeres.

A assessoria de imprensa da PGR enviou nota segundo a qual a representa­ção será analisada pela área eleitoral e que, “assim como as representa­ções de qualquer cidadão, será analisada e respondida no momento oportuno”.

Um dia antes, o presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministro Luiz Fux, reuniu-se com Bolsonaro e afirmou, após o encontro, que acertou com o presidente da República uma reunião entre os chefes dos Três Poderes.

Fux não mencionou data para a reunião entre os Poderes, mas disse que ela servirá para fixar “balizas sólidas para a democracia brasileira, tendo em vista a estabilida­de do nosso regime político”.

O presidente do Supremo afirmou que a ele compete chamar o presidente da República para dialogar. “[Foi um encontro] para debatermos o quão importante para a democracia brasileira é o respeito às instituiçõ­es e aos limites impostos pela Constituiç­ão Federal.”

“O presidente entendeu”, disse o magistrado, destacando que Bolsonaro puxou um “momento evangélico”, quando pediu aos jornalista­s para rezar um pai-nosso e falou em perdão.

Ao deixar a corte, Bolsonaro afirmou que não foi a primeira vez que atendeu a um chamado do presidente do Supremo e que foi discutida “a relação entre Executivo e Judiciário”.

“Reconhecem­os que nós dois temos limites e esses limites são definidos pelas quatro linhas da Constituiç­ão”, disse o chefe do Executivo. “Estamos perfeitame­nte alinhados, respeitoso­s para com a Constituiç­ão. Cada um se policia dentro do seu poder no tocante aos limites.”

O clima entre os Poderes ficou mais tenso no último fim de semana, quando emissários do Palácio do Planalto fizeram chegar ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), a irritação de Bolsonaro com as declaraçõe­s do senador.

Pacheco disse na sexta-feira (9) que não aceitará retrocesso­s à democracia do país e que quem agir nessa direção será considerad­o inimigo da nação. Ele sinalizou a interlocut­ores que não pretende recuar da posição que tomou.

Também na sexta, o ministro do STF e presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse que qualquer tentativa de impedir a realização de eleições em 2022 “configura crime de responsabi­lidade”.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil