Mesmo com apoio de eleitores, nomes da 3ª via evitam falar de impeachment
Políticos adotam cautela sobre deposição de Bolsonaro, defendida por maioria, segundo Datafolha
são paulo Apesar de o impeachment de Jair Bolsonaro (sem partido) ser, segundo pesquisa Datafolha, defendido pela maioria da população e pela maioria dos eleitores da terceira via, partidos à direita que compõem o chamado centro político evitam advogar abertamente pela remoção do presidente.
É o caso de PSDB, DEM, PSD, MDB e PSL —que muitas vezes adotam posicionamento de oposição e fazem duras críticas a Bolsonaro, mas se mantêm na defensiva quando o tema é declarar apoio à destituição neste momento.
Luiz Henrique Mandetta (DEM), João Doria (PSDB) e Eduardo Leite (PSDB) não demonstram empenho em favor do impeachment, mas tampouco o descartam. As opiniões envolvem cálculo eleitoral, amarras institucionais, falta de provas e bancadas parcialmente governistas, segundo políticos ouvidos pela Folha.
A maior parte dos eleitores dos três presidenciáveis, porém, defende a deposição, de acordo com a pesquisa divulgada na semana passada.
Na população como um todo, 54% querem o impeachment e 42% consideram que Bolsonaro deve terminar o mandato.
Até agora, a bandeira do impeachment vem sendo levantada por partidos de esquerda, como PT, PSOL, PDT, PSB e PC do B. Houve adesões à direita de parlamentares de PSL, PSDB e DEM, além dos partidos Novo e Cidadania.
Caciques de partidos de centro têm evitado se posicionar com base na avaliação de que o impeachment hoje é inviável —não conta com maioria na Câmara e não há disposição do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), em pautá-lo.
Para esses líderes, é preciso haver pressão das ruas para que a conjuntura se altere. Na esquerda, o caminho adotado é o inverso: a adesão dos partidos mobiliza a militância e pressiona os parlamentares.
De qualquer forma, com a sequência de protestos pelo país e a marca inédita de uma maioria populacional favorável, partidos e presidenciáveis entusiastas da terceira via se veem forçados a escolher um dos lados e já admitem que endossar o impeachment pode ser inevitável mais adiante.
Além da avaliação de que o impeachment está travado por Lira, há o fato de que parte dos deputados de PSDB, MDB, PSD, DEM e PSL forma a base do governo e conta com repasses de Bolsonaro para beneficiar suas bases eleitorais.
Existe ainda a visão de que falta surgir uma prova cabal que incrimine Bolsonaro e torne a abertura de processo incontornável. Além disso, o risco de o titular do Planalto se safar —e, com isso, sair fortalecido— é considerado.
Outra razão mais complexa para a cautela em relação ao impeachment é o cálculo eleitoral. Por um lado, eleitores da terceira via querem Bolsonaro fora, e sua ausência do pleito abre espaço para que o centro dispute o segundo turno contra Lula — que marcou 46% no Datafolha, ante 25% do presidente.
Articuladores envolvidos na fabricação da terceira via calculam que isso acontecerá de qualquer forma, com Bolsonaro derrotado no primeiro turno, mas até agora os nomes testados não o superam
—Ciro, o mais bem posicionado, alcançou 8% no Datafolha.
Por outro lado, para esses presidenciáveis “nem Lula nem Bolsonaro”, a defesa do impeachment pode custar o voto de bolsonaristas em um eventual embate com o petista no segundo turno.
No caso de Doria e Leite, há mais um agravante apontado por tucanos —o fato de serem governadores. A não defesa do impeachment por ambos, porém, contrasta com as críticas que eles disparam diariamente a Bolsonaro.
A Folha questionou por que os dois governadores não defendem o impeachment. Em notas à reportagem, Leite e Doria foram evasivos.
“Tenho um papel institucional como governador que requer cautela em relação a esse tipo de assunto. Governo tanto para os gaúchos que são favoráveis quanto para os contrários”, respondeu Leite.
“O ideal é tirar Bolsonaro pelo voto popular. Mas, se houver maior deterioração do apoio popular, ao lado do material probatório de sua responsabilidade —que já vai se constituindo—, o impedimento pode vir a ser inevitável”, completa.
O gaúcho diz que, se as denúncias contra Bolsonaro “forem suficientes para justificar um pedido de impeachment”, ele confia que “a Câmara dos Deputados cumprirá o seu papel”.
Doria afirmou que cabe ao Legislativo avaliar se há condições para o impeachment.
“Essa decisão cabe ao Congresso e ao clamor das ruas, algo que ainda não houve em virtude da pandemia e necessidade do distanciamento social. Agora, com a ampliação da vacinação, a população voltará às ruas. E o clamor do povo deverá pautar o Congresso. Se Bolsonaro resistir, será derrotado nas urnas em outubro de 2022.”
Parte dos tucanos defende cautela, enquanto outros criticam a omissão. O diretório da capital paulista defende abertamente o impeachment. O presidente da sigla, Bruno Araújo, pondera que “tirar um presidente em pleno período eleitoral” seria um trauma, mas diz que a base de apoio de Bolsonaro ainda pode ruir.
À Folha Mandetta afirmou que o quadro atual difere bastante do período que predeu a queda de Dilma Rousseff (PT) e que não vê consolidados os elementos para um processo cuja natureza, conforme lembrou, é essencialmente política.
A avaliação é semelhante a do presidente da sigla, ACM Neto. Pessoalmente, porém, Mandetta se declara favorável.
“Do ponto de vista da pasta que comandei, a da Saúde, ele [Bolsonaro] acumula vários crimes, sem dúvida”, ponderou o ex-ministro. Ele afirma também concordar com a discussão de que o “timing” para o processo talvez tenha ficado para trás.
Virtualmente beneficiado com a saída de Bolsonaro do páreo, Ciro é um dos que há tempos pregam o impeachment e tem seu partido majoritariamente coeso na pauta.
Ciro e seus aliados sustentam a tese de que, pela via do impeachment ou do enfraquecimento político, Bolsonaro desidratará até 2022, abrindo caminho para um segundo turno do ex-ministro contra Lula.
O PT tem rebatido a narrativa de que seu apoio ao impeachment seja algo simbólico e omita a intenção de “sangrar” o atual presidente até o pleito. Para detratores, interessa aos dois protagonistas manterem o antagonismo e inibirem o surgimento de alternativas.
Lula reforçou em público nos últimos dias que é favorável à destituição do adversário.
Presidente do PSL em São Paulo, o deputado federal Junior Bozzella diz respeitar os partidos que não aderiram ao mas diz que “o plano de poder não pode se sobrepor aos interesses da República”.
Também entusiasta da terceira via, o presidente do PSD, Gilberto Kassab, já admite que a crise pode levar ao impeachment, embora não veja condições agora.
O MDB, que tem sido crítico a Bolsonaro nas redes, tampouco definiu apoio ao impeachment. O presidente do partido, Baleia Rossi (SP), afirmou que cabe a Lira deliberar. “Após esse passo, o MDB se reunirá, discutirá e deverá defender a vontade da maioria da população”, afirmou.