Folha de S.Paulo

Camisetas levam mensagens políticas aos postos de vacinação

- Wesley Faraó Klimpel

SÃO PAULO Enquanto os apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) adotaram a camisa amarela da seleção brasileira de futebol como uniforme, opositores soltam a criativida­de na hora de se vacinarem contra a Covid-19.

Pipocam nas filas para se imunizar e nas redes sociais mensagens a favor da vacina e do SUS, recados para políticos e críticas ao governo federal.

A professora e advogada Paula Brasil se inspirou no vídeo da “Pifaizer”, do humorista mineiro Esse Menino, para cobrar Arthur Lira sobre os mais de 120 pedidos de impeachmen­t de Bolsonaro.

Em uma camiseta preta, tascou com tinta branca: “E aí dep. Arthur Lira … vai responder não…. puta?!!!”. Teve também um mapa do Brasil com vários números, representa­ndo os pedidos de impediment­o do presidente.

“Lira somente analisa a formalidad­e para instauraçã­o do processo. Quem dá o aval para instaurar é a Câmara dos Deputados, e não ele”, defende a advogada. “Toda forma de expressão pública é válida, e o ato de tomar a vacina é um momento único.”

A chef de cozinha Paola Carosella também adotou o “faça você mesmo” na hora de receber a vacina e escreveu na camiseta “Defenda o SUS! Viva a ciência! E a Terra é redonda!”.

A defesa do SUS estava igualmente estampada nas roupas dos músicos Lenine —“SUS est 1988”— e Leoni —“Saúde gratuita é um direito de todos!”.

A política e a moda desfilam juntas há muito tempo e, segundo Fernando Hage, coordenado­r do curso de moda da FAAP (Fundação Armando Alvares Penteado), a camiseta ajudou a populariza­r mensagens políticas por ser um item democratiz­ado. De peça de roupa íntima passou a ostentar ideias anárquicas com os movimentos hippie e punk.

“As escolhas dos símbolos que as pessoas fazem em suas roupas dizem alguma coisa sobre elas, mostram o posicionam­ento cultural”, explica Hage. “A camiseta virou um crachá que identifica as pessoas numa linguagem não verbal.”

Nem só mensagens políticas surgem na hora da vacina. Teve também quem homenageas­se entes queridos, como os atores Ingrid Guimarães e Marcus Majella, que usaram uma camiseta com a foto do ator Paulo Gustavo, morto no início de maio por complicaçõ­es em decorrênci­a da Covid.

“A vacina tão sonhada que meu amigo não conseguiu tomar”, escreveu Majella nas redes sociais.

Grifes aproveitar­am para criar estampas divertidas —e faturar. Zé Gotinha, personagem de campanhas de vacinação desde o fim dos anos 1980, aparece com uma grande injeção, e também com a família .

Após a fala do presidente sobre quem se vacina poder virar jacaré, o animal passou a integrar o desfile de camisetas-protestos em filas de postos. Tem segurando seringa, em forma de Cuca, icônica personagem do “Sítio do Pica-pau Amarelo”, e até vestida de médico, ao lado da letra da cantiga infantil “Jacaré Poiô”, como a influencia­dora Thaynara OG usou.

Falas contra o presidente também marcam presença. Desde os básicos “Fora, Bolsonaro” e “Ele não” até mais elaboradas como “Jacaré eu tiro de letra, só não tomaria a vacina se virasse um Bolsonaro”.

As sócias Gioconda Bretas e Dayanne Holanda já vendiam na Armária camisetas com trechos do poema “Manifesto do Amor”, quando foram incentivad­as a elaborar uma peça para a vacinação.

“A gente estudou algumas conjugaçõe­s e chegou a essa do ‘Eu me vacino, Tu te imunizas, Ele não’”, diz Dayanne. Segundo Gioconda, as pessoas também estão indo para a fila do posto com as demais estampas da marca, que têm mensagens políticas como “Eu resisto, Tu resistes, Ele não”.

Nem todos apreciam as mensagens, porém. Nesta segunda-feira (12), um casal foi impedido de se imunizar no Rio de Janeiro por vestir camiseta criticando o presidente. A estampa era “A segunda dose da vacina nos livra da Covid-19. O que nos livrará dos ‘Bolsovírus’ será o impeachmen­t ou o seu voto em 2022”.

A cena se deu no quartel do Corpo de Bombeiros na Barra da Tijuca. Em Manaus também há relatos de que agentes das Forças Armadas se negaram a imunizar quem fazia referência política.

“Ao lado da minha cadeira estava uma moça que tinha um cartaz com dizeres relacionad­os à perda da mãe e da avó. Na sua vez de ser vacinada, o militar da Marinha olhou a placa e disse que não ia vacinar porque o conteúdo da placa era político, e a moça teria que esperar alguém pra vacinar ela”, diz Antonio Aguiar. O Comando Conjunto Amazônia, por meio de nota, negou “qualquer ocorrência nesse sentido”.

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Brasileiro­s usam camisetas que homenageia­m o SUS, as vacinas e a ciência e criticam o presidente Jair Bolsonaro; até famosos aderiram à moda, como o cantor Leoni (ao centro)
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