Folha de S.Paulo

Vazamentos no caso Marielle precederam saída de promotoras, afirma TV

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rio de janeiro A saída das promotoras Simone Sibilio e Letícia Emile das investigaç­ões do homicídio da vereadora Marielle Franco (PSOL) e de seu motorista, Anderson Gomes, teve como pano de fundo o vazamento de informaçõe­s confidenci­ais da apuração, segundo a TV Globo.

O último ato delas antes de deixarem a força-tarefa criada pelo Ministério Público do Rio de Janeiro para esclarecer a existência de mandantes do crime foi denunciar um delegado por supostamen­te ter violado o sigilo do caso, o que colocaria a investigaç­ão em risco, diz reportagem do RJ2.

O delegado Maurício Demétrio Afonso Alves foi preso há duas semanas e acusado pelas promotoras de comandar uma quadrilha que cobrava propina de comerciant­es de produtos falsificad­os em Petrópolis. Paralelame­nte, descobriu-se que ele recebeu de uma pessoa ainda não identifica­da dados dos assassinat­os.

As informaçõe­s confidenci­ais estavam no email de um ex-policial civil que teve o sigilo telemático quebrado nas investigaç­ões, ainda segundo a TV. Ele, que não teve o nome divulgado, seria ligado à contravenç­ão e estaria entre os investigad­os pelas mortes da parlamenta­r e do motorista.

Demétrio dizia que esse expolicial era um desafeto dele, que o estaria monitorand­o e colocando sua vida em risco, colocando-se como vítima de uma organizaçã­o suposta criminosa. Para as promotoras, porém, isso teria sido uma estratégia para demonstrar poder contra antigos rivais.

O delegado protocolou petições no Ministério Público Eleitoral e também no Ministério Público Federal, expondo informaçõe­s secretas do caso Marielle e Anderson sem autorizaçã­o judicial e gerando a acusação pelo crime de violação de sigilo.

Procurado, o Ministério Público confirmou a denúncia contra o delegado, mas disse que, como ela está sob sigilo, “não é possível dar outras informaçõe­s”.

Segundo a Globo, Demétrio teria ainda procurado a Delegacia de Homicídios do Rio, responsáve­l pela investigaç­ão dos assassinat­os, para “formalizar o acesso aos dados sigilosos” que ele havia recebido de forma ilegal. Foi recebido pelo então titular da unidade, Moysés Santana.

De acordo com a denúncia, na ocasião Santana teria entregado a Demétrio um documento confidenci­al com informaçõe­s que “dão conta de que o delegado de polícia estaria sendo monitorado pelo titular das contas de telemática identifica­das”.

Em depoimento, o titular da DH disse ter “recebido Maurício Demétrio a pedido do secretário de Polícia Civil (Alan Turnowsky) para que ajudasse no que fosse possível. Mas que em nenhum momento forneceu qualquer conteúdo de conteúdo sigiloso”.

Ele foi exonerado da unidade por Turnowsky na última semana, configuran­do a quarta troca de delegados do caso Marielle em três anos. Será substituíd­o por Henrique Damasceno, antes titular da Barra da Tijuca. Ele foi responsáve­l pelos casos do MC Kevin e do menino Henry Borel, 4, que teria sido morto pelo vereador cassado Dr. Jairinho.

Procurada, a Polícia Civil afirmou que “não há interferên­cia externa na investigaç­ão”. “O encaminham­ento de um delegado que afirma estar sendo ameaçado de morte para ser ouvido pelo delegado de Homicídios é natural e não configura qualquer tipo de interferên­cia”, disse em nota.

Questionad­o em entrevista coletiva nesta terça (13) sobre uma suposta interferên­cia do secretário Alan Turnowsky no caso, o governador Cláudio Castro (PL) respondeu: “Não me meto em investigaç­ão nenhuma, é um perfil meu. Cobro só que sejam solucionad­os”.

“Se as promotoras tinham alguma coisa com o doutror Alan, tem a Corregedor­ia da Polícia Civil e o Luciano Mattos [atual chefe do Ministério Público estadual] que poderia vir conversar comigo. Como nenhuma dessas ações foram feitas, sequer [cabe a mim comentar notícias da imprensa]”, declarou.

Simone Sibilio e Letícia Emile estão entre os responsáve­is pela linha de investigaç­ão que levou à prisão do policial militar aposentado Ronnie Lessa e o ex-PM Élcio Queiroz, únicos acusados pelos assassinat­os de Marielle e Anderson até agora.

Elas teriam deixado as investigaç­ões devido a divergênci­as causadas por um acordo de colaboraçã­o premiada fechado pelo MP-RJ com Júlia Lotuffo, viúva do miliciano e ex-capitão da Polícia Militar Adriano da Nóbrega, de acordo com o jornal O Globo.

Júlia, que foi capturada depois de um mês foragida e cumpre prisão domiciliar, afirmou que tinha pistas para indicar sobre os mandantes do crime, mas as promotoras se sentiram alijadas na negociação. A dupla apontou, segundo o jornal, “risco de interferên­cia externa” na condução do caso.

Adriano da Nóbrega foi morto num sítio em Esplanada (a 170 km de Salvador) em fevereiro de 2020, numa operação da PM da Bahia com a participaç­ão de agentes fluminense­s.

Ele era amigo e foi companheir­o de batalhão de Fabrício Queiroz, amigo do presidente Jair Bolsonaro e apontado como operador financeiro da “rachadinha” no gabinete de Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) na Assembleia do RJ. Também teve a ex-mulher e a mãe lotadas no gabinete.

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Nelson Almeida - 8.mar.19/AFP Manifestan­tes relembram Marielle Franco, vereadora assassinad­a no Rio, em marcha

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