Racionamento de água já afeta interior paulista
Falta de abastecimento atingiu até famílias com casos de Covid que estavam isoladas em casa
Com a queda nos níveis dos reservatórios, decorrente da pior crise hídrica em 91 anos, algumas cidades do interior de São Paulo já passaram a adotar algum tipo de racionamento de água, como Itu e São José do Rio Preto. Outras, como Franca, já estão de sobreaviso.
campinas Com a queda nos níveis dos reservatórios e o período de estiagem, algumas cidades do interior de São Paulo já passaram a adotar algum tipo de racionamento de água.
Moradores de Itu (a 101 km de São Paulo) ouvidos pela reportagem temem que a cidade retorne ao drama de 2014, quando permaneceu por 10 meses no mais longo racionamento de água de sua história.
Desde a semana passada, a cidade, de 170 mil habitantes, entrou em rodízio, medida que, de acordo com a CIS (Companhia Ituana de Saneamento), foi necessária para enfrentar um deficit de chuva considerado severo e que pode ser o pior em 91 anos.
Segundo a CIS, os mananciais de Itu operam hoje com 32% da capacidade e não está descartada a possibilidade de o racionamento ser ainda mais amplo. A bacia do São José (Fubaleiro), um dos mais importantes mananciais da cidade, está praticamente seca.
O rodízio em Itu varia de acordo com a região. Em algumas, o corte se dá dia sim, dia não. Em outras, o abastecimento é interrompido às segundas e às quintas, por exemplo —mas, em quaisquer circunstâncias, os transtornos têm sido enormes.
A dona de casa Maria Gervásio, 57, conta que apesar de o rodízio da região onde mora prever abastecimento dia sim, dia não, as torneiras de casa, na Vila Santa Rosa, estão ficando secas por cinco dias.
“Estamos vivendo uma situação horrível. Tenho conseguido diminuir o problema porque vou buscar água numa mina, que fica aqui perto de casa”, contou ela, na manhã de segunda-feira (12).
É a mesma bica onde estiveram nesta terça (13) pela manhã a operadora de caixa Júlia Araújo Alves e o marido dela, James Carneiro.
Eles esperavam que haveria abastecimento no Parque das Rosas, onde moram, mas isso não ocorreu.
“Estamos sem água faz uma semana”, disse ela. “Para beber, a gente está comprando, mas para lavar roupa, tomar banho, a gente usa a da mina.”
Mas tem gente que vai até a bica em busca de água para consumo, como o contador João Fernando Franquini. “É boa”, afirmou.
“Acho que a água daqui é mais garantida que a da rua”, disse a auxiliar técnica de enfermagem Rosana Aparecida dos Santos, que desde a semana passada convive com torneiras secas no Parque América, onde mora.
Drama semelhante vive a auxiliar de produção Lucimary Pereira, que mora no bairro rural do Pinheirinho. “Estamos vivendo uma calamidade. Estou sem água desde o dia 5. Tenho de implorar para a prefeitura mandar uns caminhões-pipa. Pedi na segunda-feira cedo, mas até agora não chegou”, disse ela, nesta terça-feira, no final da manhã.
Lucimary tem um outro fator complicador. Ela e os dois filhos, de 11 e 17 anos, foram infectados pelo novo coronavírus e, assim, os três se viram impedidos de sair de casa, para cumprir o isolamento e os protocolos sanitários.
“Sem água, a gente está tendo muita dificuldade em manter a higiene, por exemplo. Minha casa fede a cândida”, disse ela, referindo-se a água sanitária. “Quando alguém faz xixi, não damos descarga.”
“Estamos diante da pior estiagem dos últimos 91 anos e sem registro ou previsões de chuvas até o momento”, explica o superintendente da CIS, Reginaldo Santos. “As barragens de captação estão operando cada vez mais abaixo de sua capacidade. Uma ampliação do rodízio já é avaliada internamente.”
A aproximadamente 10 km de Itu, a cidade de Salto também entrou em rodízio no fornecimento de água. A cidade, de quase 120 mil habitantes, conta com duas estações de tratamento —mas, em ambas, as captações têm sido menores que a demanda.
A companhia de saneamento da cidade diz que não há prazo para a duração do rodízio. “Dependemos de chuvas”, explica a empresa, em nota.
A 440 km a noroeste de São Paulo, São José do Rio Preto convive com problemas de abastecimento já há quase dois meses. De acordo com dados do Semae, o volume de chuva no período de janeiro a julho deste ano é praticamente a metade do verificado no mesmo período de 2020.
O racionamento é feito das 13h às 20h, em 15 regiões da cidade. Atinge aproximadamente 100 mil pessoas.
“O racionamento é uma medida necessária para evitar a paralisação total da captação superficial no rio Preto”, diz o superintendente do Semae, Nicanor Batista Jr.
Ele diz que a companhia vem adotando medidas para evitar o racionamento nos próximos anos.
“Perfuramos o 9º poço do aquífero Guarani. O 10º está sendo perfurado e o 11º deve ter a perfuração iniciada ainda neste ano. Além disso, no final do ano passado perfuramos sete poços no aquífero Bauru”, afirma.
Os aquíferos citados formam um dos maiores reservatórios de água doce subterrânea do mundo.
A cidade de Franca —a 400 km a nordeste da capital do estado— está de sobreaviso. A baixa pluviometria registrada no período de outubro de 2020 a março de 2021 ocasionou a maior queda da vazão dos mananciais que abastecem a cidade em duas décadas.
A Sabesp informou que o abastecimento ainda é normal na cidade, mas que a vazão vem diminuindo e, por isso, diz ter preparado duas novas fontes de captação.