Folha de S.Paulo

À beira de ataque de nervos, Bolsonaro será preso sem reeleição, diz ex-aliado

Marinho, que cedeu casa a QG bolsonaris­ta na campanha de 2018, vê presidente fora do 2º turno

- Catia Seabra

rio de janeiro Hospedeiro por um ano do QG da campanha de Jair Bolsonaro à Presidênci­a, entre 2017 e 2018, o empresário Paulo Marinho (PSDB) afirma que o presidente está à beira de um ataque de nervos diante dos desdobrame­ntos da CPI da Covid-19.

Ao comentar o tom de Bolsonaro ante as suspeitas de irregulari­dades nas compras de vacinas, Marinho diz que o presidente mostra destempero por ter consciênci­a do risco de derrota na corrida presidenci­al de 2022.

“Conheço a peça. O capitão Bolsonaro está à beira de um ataque de nervos”, diz Marinho, afirmando que ele será preso se não se reeleger.

“O capitão Bolsonaro vai enfrentar a Justiça. E arrisco dizer que vai ser preso pelos crimes que já cometeu e ainda vai cometer até o final do mandato.”

Marinho —que conviveu diariament­e com Bolsonaro entre julho de 2017 e outubro de 2018— diz não ter dúvidas de que o presidente tentará virar a mesa ante a ameaça de uma derrota em 2022.

“O capitão vai tentar dar um golpe com as milícias, que é o grupo que o acompanha desde o início da sua vida política. Graças a Deus, esse grupo não tem tamanho para mudar a história da democracia brasileira. Ele acha que tem. Mas não tem.”

Um dos principais apoiadores da candidatur­a de Bolsonaro, Marinho transformo­u a ampla academia de sua casa em estúdio de programa eleitoral em 2018. Da época, guarda vídeos inéditos e suas recordaçõe­s, acervo hoje a serviço da pré-candidatur­a à Presidênci­a de João Doria (PSDB), governador de São Paulo.

Como exemplo, ele conta que, certa vez, Bolsonaro exasperou-se ao tentar, por mais de 20 vezes, gravar uma mensagem para a propaganda eleitoral.

Segundo Marinho, Bolsonaro deixou o estúdio e foi para os jardins da casa, sendo tranquiliz­ado pelo coordenado­r de sua campanha à época, Gustavo Bebianno, que depois virou ministro e morreu em 2020.

“O capitão tem uma dificuldad­e imensa de se expressar. Quando a gente estava na minha casa gravando os programas de televisão, primeiro, ele não usava o teleprompt­er, ele não sabia se comunicar com o teleprompt­er. Tinha uma dificuldad­e de ler e falar. Ficava evidente que ele estava lendo.”

Além dessa dificuldad­e de expressão, Marinho diz reunir mostras das contradiçõ­es de Bolsonaro.

“Na campanha eleitoral, o capitão batia no peito na minha casa e dizia ‘temos que acabar com o foro privilegia­do’. A primeira coisa pela qual o Flávio Bolsonaro e o pai dele lutaram, quando o problema bateu à porta da família, foi pelo foro privilegia­do para o Flávio. Isso vai ser julgado nas eleições”, afirma.

Há três meses, Marinho se mudou para São Paulo disposto a colaborar com a candidatur­a de Doria. Ele se diz convencido de que Bolsonaro não chegará ao segundo turno. E relata que muitas pessoas riem desse prognóstic­o, a exemplo do que aconteceu em 2018, quando decidiu apoiar a candidatur­a de Bolsonaro.

“Nessa campanha, Bolsonaro vai ter que explicar o enriquecim­ento da família dele, dos filhos e dele pessoalmen­te. Esse esquema das ‘rachadinha­s’ está mais do que provado pelo Ministério Público estadual.”

“O capitão só não rodou até agora por causa da blindagem jurídica que conseguiu alcançar a nível federal. Além disso, o Adélio não estará em Juiz de Fora em 2022”, diz Marinho, relatando que, ao visitálo no hospital, ouviu Bolsonaro dizer que já estava eleito depois de ter sido esfaqueado por Adélio Bispo durante um ato em Minas Gerais.

Para justificar o mau desempenho de Doria nas pesquisas, Marinho afirma que ele sofre o ônus de “proteger a população de São Paulo contra a Covid, coisa que o capitão não fez”.

Ele reconhece ainda que Doria enfrentará a resistênci­a dentro de seu próprio partido, sendo o deputado mineiro Aécio Neves um dos articulado­res da oposição a essa candidatur­a.

“Tem alguns grupos no PSDB, principalm­ente os liderados por Aécio Neves, que estão apostando no quanto pior, melhor. Essa é uma questão da conveniênc­ia política desse grupo. Quem quer o melhor para o PSDB tem que apostar numa candidatur­a viável. E a única candidatur­a viável para o PSDB é do governador João Doria. Quem tiver o mínimo de caráter vai enxergar essa realidade”, diz.

Ao falar sobre uma eventual candidatur­a do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), Marinho diz que seria temerário o PSDB arriscar no novo em detrimento do único nome com chance de tirar Bolsonaro do segundo turno.

Sobre o fato de o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso ter admitido a hipótese de o PSDB apoiar um nome de outro partido na disputa presidenci­al, Marinho lembra que FHC já se posicionou contrariam­ente a candidatur­as de Doria. Todas acabaram vitoriosas.

“O presidente Fernando Henrique atua quase como uma entidade acima do PSDB. Ele tem autoridade para falar o que fala. É um homem que todo mundo respeita. Em relação ao Doria, ele errou as duas vezes em que apostou contra. Essa coisa está dando certo para o João. É mais um elemento para validar a candidatur­a do governador João Doria”, diz.

Após dois anos na presidênci­a do PSDB do Rio de Janeiro, Marinho deixou a função em junho, dizendo-se impression­ado com o tamanho da presença do tráfico e da milícia no processo eleitoral municipal de 2020.

Ele descreve o caso do dono de um cursinho pré-vestibular que pretendia concorrer a vereador com apoio dos moradores de uma favela na zona norte do Rio. Desistiu após ser desencoraj­ado por traficante­s.

“Na véspera de a gente fechar a nominata, ele disse ‘infelizmen­te não vou poder mais ser candidato. Fui chamado pelo pessoal do tráfico da minha região e eles disseram que lá eles apoiarão um candidato e não poderá haver outro candidato. E meu curso de pré-vestibular é lá, os meus alunos estão ali. Não tenho como desacatar essa ordem sem sofrer represália’”, lembra Marinho.

“O capitão [Bolsonaro] vai tentar dar um golpe com as milícias, que é o grupo que o acompanha desde o início da sua vida política. Graças a Deus, esse grupo não tem tamanho para mudar a história da democracia brasileira. Ele acha que tem. Mas não tem Paulo Marinho empresário e antigo aliado do presidente Jair Bolsonaro

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Ricardo Borges - 25.jun.19/Folhapress Hoje crítico do presidente, o empresário Paulo Marinho apoiou a candidatur­a de Bolsonaro
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Reprodução BandNews Gustavo Bebianno, Jair Bolsonaro e Paulo Marinho na época da campanha eleitoral de 2018

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