Folha de S.Paulo

Cármen Lúcia, do STF, anula decisão judicial de censura à Folha

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SÃO PAULO A ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), anulou uma decisão da Justiça do Espírito Santo que havia determinad­o que um texto de checagem de fatos fosse retirado do site da Folha e que uma retratação fosse publicada pelo jornal.

A decisão da ministra ocorreu no âmbito de uma reclamação ingressada pelo jornal. A Folha foi ao Supremo contra sentença do juiz Rodrigo Cardoso Freitas, da 5ª Vara Cível de Vitória, expedida em ação movida pelo senador Marcos do Val (Podemos-ES).

Anteriorme­nte, em março deste ano, Cármen Lúcia já havia ordenado a suspensão dos efeitos da decisão.

O texto questionad­o pelo congressis­ta tinha como título “Senador engana ao usar falas antigas de Drauzio Varella sobre pandemia” e foi publicado em agosto de 2020.

No despacho em que anulou a sentença do juiz de Vitória, a ministra do STF escreveu que o juízo “impôs censura a órgão de imprensa”, algo incompatív­el com a Constituiç­ão.

“Essas condutas frustram o direito à liberdade de imprensa, inibindo-se atividade essencial à democracia como é a liberdade jornalísti­ca, essencial à informação, expondo a risco a garantia constituci­onal da liberdade de informar e de ser informado e de não se submeter a imprensa à censura.”

A ordem do STF foi expedida no dia 22 de junho. Nela, a ministra também afirmou que a condição de agente político de Marcos do Val o deixa “mais exposto à crítica e sujeito a ter suas ações ou omissões submetidas ao olhar da imprensa e da sociedade”.

O texto publicado foi uma checagem feita dentro do projeto Comprova, que teve como objeto um vídeo publicado pelo senador nas redes sociais.

O projeto Comprova, do qual a Folha faz parte, é uma coalizão de 28 veículos liderada pela Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigat­ivo). O texto em questão foi produzido pelo Jornal do Commercio em conjunto com o Nexo, tendo sido verificado e publicado pelos veículos Folha, UOL, SBT, O Estado de S. Paulo e BandNews.

A conclusão da checagem foi que o vídeo era enganoso, pois sugeria que Drauzio minimizou a gravidade da pandemia da Covid-19, sem informar que o vídeo era de janeiro de 2020 e omitindo que o médico já afirmara publicamen­te ter subestimad­o a doença. Tanto a assessoria do senador como do médico foram contatadas pelos checadores.

A defesa do senador entrou com pedido de retratação e sustentou que a Folha o difamou, vinculando sua imagem a alguém que teria intenção de enganar os cidadãos por meio do compartilh­amento de um vídeo.

O juiz de Vitória disse, ao prestar informaçõe­s ao STF, que na “ponderação entre liberdade de imprensa e outros direitos da personalid­ade”, no caso em questão, “este último deve prevalecer”.

Para a advogada do jornal Taís Gasparian, obrigar a Folha a afirmar que a checagem estava errada é o equivalent­e a obrigar o jornal a publicar desinforma­ção. “Não se pode obrigar um outro a se retratar. A retratação é um ato íntimo, próprio de cada indivíduo, de sorte que ninguém pode ser obrigado a ‘se arrepender’ do que escreveu.”

Com a decisão de Cármen Lúcia, o caso volta a tramitar na primeira instância para que uma nova decisão do juízo seja proferida.

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