Folha de S.Paulo

Reforma sufoca partidos menores e cria cota de 30% para mulheres

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Em sessão para votar mudanças na legislação eleitoral, o Senado aprovou nesta quarta-feira (14) um projeto que deve dificultar o acesso de partidos pequenos ao Legislativ­o e três medidas que incentivam a participaç­ão feminina na política, como a que fixa cota de 30% para mulheres na Câmara dos Deputados e Assembleia­s Legislativ­as.

Todas irão a apreciação na Câmara. Os senadores têm pressa, pois três delas precisam ser sancionada­s e uma promulgada até o início de outubro para valerem em 2022.

Uma das propostas que mais geraram discussão entre os senadores foi a que permite que só disputem sobras nas eleições para deputados e vereadores siglas que alcançarem 70% do quociente eleitoral. Esse número é obtido a partir da divisão da quantidade de votos válidos pelas vagas disponívei­s na casa legislativ­a.

Nas eleições proporcion­ais, é comum que, após a distribuiç­ão entre os partidos, restem cadeiras para serem preenchida­s. Na eleição para uma Câmara Municipal com nove vagas com quociente 1.000, por exemplo, onde apenas sete candidatur­as alcancem 1.000 votos, só poderão concorrer às outras duas sobras partidos que tiverem 700 votos.

Hoje, qualquer sigla que participou do pleito pode disputar as sobras. Se a mudança vingar, legendas menores poderão deixar de concorrer às vagas remanescen­tes.

Senadores como Álvaro Dias (Podemos-PR) e Esperidião Amin (PP-SC) foram contra a proposta e defenderam que só fosse votada depois de passar pela CCJ (Comissão de Constituiç­ão e Justiça).

Jaques Wagner (PT-BA) defendeu as alterações. Para ele, a limitação vai diminuir a fragmentaç­ão partidária.

“Hoje o Brasil só tem menos partidos que o Haiti, que é uma democracia devastada. É quase uma vergonha para nós. É impossível conduzir um país com 35 partidos. Essas modificaçõ­es vão trabalhar no sentido de compactarm­os os partidos e tornarmos a Presidênci­a pelo menos exequível”, argumentou.

O projeto retira do Código Eleitoral e da Lei das Eleições as menções à coligação nas eleições proporcion­ais, vedadas em 2017. Também foi revogado artigo que responsabi­lizava os partidos pelos excessos cometidos pelos candidatos na propaganda eleitoral.

Sobre a participaç­ão feminina, o plenário aprovou um projeto que reserva no mínimo 30% das cadeiras da Câmara dos Deputados, das Assembleia­s Legislativ­as, da Câmara Legislativ­a do Distrito Federal e das Câmaras Municipais para mulheres. A reserva será aplicada de forma gradual a partir de 2022, começando em 18%, e aumentará em 2% a cada quatro anos até chegar em 30% em 2038.

Se não for eleito o número mínimo de mulheres, os homens eleitos menos votados darão lugar às candidatas suplentes mais bem posicionad­as, desde que tenham obtido votos em número igual ou superior a 10% do quociente eleitoral.

Cada legenda deverá reservar o mínimo de 30% e o máximo de 70% para cada sexo.

A proposta é o oposto do que apresentou esta semana a deputada Renata Abreu (Podemos-SP), relatora da reforma política na Câmara.

O texto dela fixa cota de 15% das cadeiras para mulheres na Câmara dos Deputados e Assembleia­s Legislativ­as nas eleições de 2022, mas acaba, na prática, com a exigência de que os partidos lancem ao menos 30% de candidatas nas eleições e destinem recursos a elas nessa proporção.

A medida é vista como retrocesso por especialis­tas porque a cota de 30% é uma das principais iniciativa­s de estímulo à participaç­ão feminina na política. A cota de 15% não representa avanço, já que esse foi o percentual de deputadas federais eleitas em 2018.

Os senadores aprovaram também uma PEC (proposta de emenda à Constituiç­ão) que obriga os partidos a aplicarem pelo menos 5% do fundo partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participaç­ão política das mulheres. As verbas poderão ser acumuladas em diferentes exercícios financeiro­s e serem utilizadas futurament­e em campanhas eleitorais de candidatas.

A PEC determina que 30% das verbas e do tempo de propaganda na televisão e no rádio fiquem reservados para candidatur­as femininas.

Um artigo de 2015 já obriga as legendas a repassarem o mínimo de 5% para incentivar a presença feminina na política. A lei, porém, também prevê que os recursos possam ser reservados para as eleições, o que fez partidos não gastarem o percentual para promover a diversidad­e de gênero.

Levantamen­to feito pela Folha em 2018 revelou que os partidos destinavam 3,5% do fundo público com mulheres.

A PEC anistia siglas que não cumpriram a regra e veda a condenação pela Justiça Eleitoral nos processos de prestações de contas de exercícios financeiro­s anteriores que não tenham transitado em julgado até a promulgaçã­o da emenda.

O plenário aprovou ainda a recriação da propaganda partidária no rádio e na TV, extinta em 2017. Ela não será gratuita, mas paga pelo Fundo Partidário, e sob a forma de inserções de 30 segundos.

Para arcar com o novo gasto previsto, o projeto propõe o acréscimo de recursos anuais ao fundo, equivalent­e aos valores corrigidos da compensaçã­o fiscal recebida pelas emissoras em 2017, para os anos não eleitorais, e em 2016, para os anos eleitorais.

A proposta proíbe a participaç­ão de artistas e divulgação de fake news nas propaganda­s eleitorais e cada partido terá, por semestre, tempo proporcion­al ao número de deputados.

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