Folha de S.Paulo

Estados chamam texto de atentado por tirar R$ 27,4 bi de receitas dos governos regionais

- Fábio Pupo

O comitê de secretário­s estaduais de Fazenda considera a nova versão da reforma no Imposto de Renda um “atentado” contra as contas públicas por retirar R$ 27,4 bilhões em receitas dos governos regionais. Em carta publicada nesta quinta-feira (15), o grupo rejeita integralme­nte a proposta.

A oposição dos estados ao texto se soma à dos municípios e põe em xeque a tentativa elaborada pelo ministro Paulo Guedes (Economia) em parceria com o relator, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), de aprovar as novas regras neste ano para que elas comecem a valer em 2022.

O Comsefaz (Comitê Nacional de Secretário­s de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal) afirma que o buraco nas contas públicas será observado quase integralme­nte nos números de estados e municípios.

De acordo com a entidade, a perda ocorreria devido ao menor recolhimen­to de receitas a serem obtidas com o Imposto de Renda. A Constituiç­ão determina que parte dessa arrecadaçã­o, feita pela União, seja repassada aos estados e aos municípios.

Entre as medidas previstas na proposta de Sabino, está o corte na cobrança de IRPJ (Imposto de Renda de Pessoa Jurídica), que vai gerar um impacto de R$ 74 bilhões em 2022 e de R$ 98 bilhões anuais a partir de 2023 para os cofres públicos. Além disso, foram feitas medidas que compensam parcialmen­te o corte por meio de tributos que ficam só com a União e não são repartidos com os entes subnaciona­is.

O substituti­vo à proposta de reforma no IR, apresentad­o aos líderes do Congresso nesta semana, abre um buraco anual de R$ 30 bilhões nas receitas do setor público consolidad­o (que considera os números de União, estados e municípios). De acordo com o Comsefaz, o efeito líquido negativo será de R$ 27,4 bilhões para estados e municípios e de R$ 2,6 bilhões para a União.

“O relatório atenta contra o equilíbrio fiscal da União, estados e municípios, que vêm lutando para equalizar suas contas desde a crise de 2015 e que foi agravada pela pandemia que se iniciou no ano passado, sem um horizonte concreto de desfecho”, afirma carta assinada por Rafael Fonteles, presidente do Comsefaz.

“A técnica inepta é agravada pelo desconheci­mento da existência de um pacto federativo na Constituiç­ão do país, dado o flagrante atentado a este”, afirma a carta, dizendo que a proposta sabota o pacto federativo ao transferir mais de 90% da conta da mudança aos entes regionais.

Para os estados, a proposta caminha em sentido contrário a todas as recomendaç­ões internacio­nais que endossam a progressiv­idade dos tributos. “Postulamos a rejeição integral do substituti­vo”, afirma o texto.

De acordo com o Comsefaz, houve maioria entre os secretário­s para a publicação da carta. Não houve votos contrários e nem todos se manifestar­am até agora, mas a previsão da presidênci­a é que haja unanimidad­e.

Cristiane Alkmin, secretária de Fazenda de Goiás, afirma que a proposta deveria trazer uma compensaçã­o para estados e municípios —o que não foi previsto no texto.

“Os estados e os municípios estão fazendo uma reclamação muito genuína. Eles têm uma programaçã­o orçamentár­ia e financeira de acordo com o que arrecadam e também com os repasses [que recebem]”, diz à Folha.

“Na hora em que a gente modifica essa base tributária, a gente tem que pensar em compensaçõ­es”, afirma. Ela lembra que os estados buscam uma reforma tributária ampla que inclua o estadual ICMS e o municipal ISS.

Paulo Ziulkoski, presidente da CNM (Confederaç­ão Nacional dos Municípios), afirma que o relatório apresentad­o por Sabino é um “escândalo” por desonerar a renda de empresas e pessoas mais ricas e por produzir o rombo de R$ 30 bilhões nas contas públicas. Ele diz concordar com a redução da carga para pessoas jurídicas, mas vê exagero na dose.

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